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António Rios Amorim: Governo e empresas "têm de fazer mais" para travar "crítico" êxodo de talento
Presidente do conselho de administração da Corticeira Amorim defende que Orçamento do Estado para 2024 deve consagrar "medidas claras de suporte fiscal à retenção de talento sobretudo em sede de IRS".
O presidente do conselho de administração da Corticeira Amorim, António Rios Amorim, diz ser "absolutamente urgente" travar o êxodo de talento de Portugal, defendendo que o Governo e as empresas "têm de fazer mais" para reverter o cenário "preocupante" de saída do país de até 20 mil jovens licenciados por ano.
"As empresas portuguesas têm de fazer mais para que realmente este talento que tanto nos custou a formar fique em Portugal e, por elas próprias, criar mecanismos de atração e de retenção", enquanto "o Estado tem de dar um contributo absolutamente determinante com política fiscal competitiva que permita que estas pessoas, quando comparam a remuneração líquida com a de outros países, prefiram ficar em Portugal".
O comentário foi feito, esta terça-feira, à margem de uma conferência organizada pela agência Lusa em parceria com a Cotec Portugal, à qual preside, sob o tema "Atrair e reter os melhores talentos - receitas para criar valor na economia portuguesa", que reuniu no mesmo painel a CEO da Altice Portugal, Ana Figueiredo, e a diretora-geral da Nestlé Portugal, Anna Lenz.
"Todos os anos saem de Portugal 19 a 20 mil licenciados o que nos obriga não só a pensar, mas a agir. Este tema é absolutamente urgente", afirmou o empresário, apontando que formar um licenciado, desde a pré-primária, custa 96.500 euros ao Estado, sem contar com a receita que se perde por via das contribuições para a Segurança Social ou consumo.
Além disso, enfatizou, com base num estudo à luz do qual, entre 2011 e 2021, saíram do país 742 mil pessoas e regressaram apenas 133 mil, Portugal tem "um problema sério" quando "61% dos emigrantes não pensa voltar" e "24% do talento que reside em Portugal está propenso ou muito propenso a emigrar".
Para António Rios de Amorim, do ponto de vista das qualificações, verificou-se uma "evolução fantástica" nos últimos anos, mas é preciso agora "que o talento criado e desenvolvido em Portugal fique em Portugal e realmente consiga criar valor para a economia portuguesa".
Como? "Uma parte faz-se pelos salários fixos, mas do nosso ponto de vista faz-se também pelas contribuições que se pagam naquilo que são as remunerações variáveis que, muitas vezes, estão ligadas à própria meritocracia e ao valor que estas pessoas acrescentam às empresas para as quais trabalham".
Neste sentido, advogou, o Orçamento do Estado para 2024 "tem que encarar já medidas claras de suporte fiscal à retenção de talento sobretudo em sede de IRS para que Portugal consiga competir com outros países que olham para o nosso talento de forma ávida".
Já em "casa" Amorim adiantou que estão a ser postas em prática políticas nesse sentido: "Os 3.500 trabalhadores da Corticeira Amorim em Portugal vão poder ter acesso, a partir de 2023, a remuneração variável que é incremental face aos salários fixos, com uma definição de objetivos concreta que vão poder acompanhar e seguir, paga ao trimestre se assim optarem por o fazer".
"Se os salários são tão importantes na decisão de muitos dos nossos jovens para emigrar eu acho que temos de ir diretamente à raiz do problema", sublinhou.
"É fundamental termos salários competitivos", diz CEO da Altice
A CEO da Altice Portugal, Ana Figueiredo, partilha da mesma perspetiva. Num mundo cada vez mais globalizado, em que se "compete com todo o mundo", as empresas têm de trabalhar para atrair e reter talento particularmente "em termos de atribuição e disponibilização de políticas salariais". "É fundamental termos salários competitivos", frisou.
E, a este nível, argumentou, "as grandes empresas têm feito um papel fundamental": "Quando comparamos salário médio de uma grande empresa com as demais, nós pagamos cerca de duas vezes/duas vezes e meia acima da média e isso leva depois à contaminação positiva pelo resto do tecido empresarial".
Mas só a atuação das empresas não basta, entende Ana Figueiredo, para quem "é importante do ponto de vista de políticas públicas nomeadamente na componente fiscal, criar condições para que o salário que a empresa paga seja percetível como atrativo", ou seja, para que haja "maior competitividade fiscal para as empresas poderem pagar melhores salários e que esses melhores salarios também se traduzam numa melhoria da riqueza para os portugueses".
"Competimos com uma carga que penaliza a partir de determinado patamar quem tem residência fiscal em Portugal comparativamente a quem vive noutras geografias. Temos taxas de imposto que são críticas para a minha área em que a carga se aproxima de 50% e noutros é metade", lamentou.
"Os escalões de IRS não promovem a meritocracia", frisou a CEO da Altice, lembrando que, "além do êxodo de talento", Portugal sofre "um grave problema demográfico". "Se nada for feito a média etária em cinco anos vai de ser 53 anos", o que terá impacto não só "na escassez" de quadros, mas também na produtividade do país", alertou.
Já a diretora-geral da Nestlé Portugal, Anna Lenz, "não é só o salário" que funciona como íman para quadros qualificados. "Temos muitos alemães e suíços, entre as 52 nacionalidades, que querem trabalhar aqui por outras razões", apontou, sublinhando que hoje "as pessoas esperam mais da empresa" e também olham para outros aspetos como o potencial de carreira.
Disputar o mesmo talento como resto do mundo não é necessariamente mau, na perspetiva da mesma responsável: "O acesso ao talento é maior e posso trabalhar com o mundo inteiro, com o qual também concorremos, mas a concorrência faz com que melhoremos".