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Tribunal da UE anula decisão do BCE que negou a Berlusconi participação qualificada na Banca Mediolanum
Acórdão diz que BCE não podia opor-se legalmente dado que resultava apenas da manutenção pelo ex-primeiro-ministro italiano de uma participação qualificada que adquiriu na sociedade antes da transposição para a legislação italiana das disposições de direito da União nas quais o regulador se baseou.
O Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) anulou, esta quinta-feira, a decisão do Banco Central Europeu (BCE), de 2016, que recusou a aquisição por parte do ex-primeiro-ministro italiano Silvio Berlusconi de uma participação qualificada, ou seja, igual ou superior a 10% do capital ou dos direitos de voto, na Banca Mediolanum.
Em comunicado, o órgão com sede em Luxemburgo assinala que "o BCE não podia opor-se legalmente à detenção por S. Berlusconi de uma participação qualificada na sociedade Banca Mediolanum, uma vez que esta situação resultava apenas da manutenção pelo interessado de uma participação qualificada que aquele adquiriu antes da transposição das disposições de direito da União nas quais o BCE se tinha baseado".
A Fininvest, holding italiana que era maioritariamente detida por Silvio Berlusconi, que morreu no ano passado, aos 86 anos, detinha participações sociais na Mediolanum, companhia financeira cotada na Bolsa, a qual, por sua vez, detinha 100% do capital da instituição de crédito Banca Mediolanum.
Em 2014, o Banco de Itália ordenou a cessão, no prazo de 30 meses, da participação da Fininvest na Mediolanum que fosse superior a 9,99 % e a suspensão imediata dos direitos de voto associados às correspondentes ações. Segundo explica o Tribunal de Justiça da UE, a adoção desta medida foi motivada pelo facto de Berlusconi ter sido declarado culpado de fraude fiscal e, por conseguinte, ter deixado de preencher o requisito de idoneidade a que está subordinada a detenção daquela participação qualificada, embora, mais tarde, em 2018 tenha vindo a ser reabilitado.
A decisão do Banco de Itália foi anulada pelo Conselho de Estado italiano em 3 de março de 2016. Entretanto, em 2015, a Mediolanum foi incorporada na sua filial Banca Mediolanum e, recorda o tribunal, na sequência desta incorporação e do veredito do Conselho de Estado italiano, o Banco de Itália e o BCE consideraram que Berlusconi e a Fininvest tinham adquirido uma participação qualificada no capital da Banca Mediolanum.
A legislação europeia estabelece que este tipo de aquisição seja antecedida de uma notificação e seja objeto de uma avaliação pela autoridade nacional competente que, em seguida, transmite ao BCE uma proposta de decisão, cabendo depois ao BCE opor-se ou não à aquisição da participação qualificada em causa. E chamado a pronunciar-se pelo Banco de Itália, o BCE opôs-se por Berlusconi não preencher o requisito de idoneidade.
Berlusconi e a sua "holding" familiar recorreram para o Tribunal Geral que manteve a decisão que o TJUE vem agora anular a par com a decisão do BCE, considerando que "o Tribunal Geral desvirtuou os factos do litígio e cometeu um erro de direito quando declarou que os recorrentes adquiriram uma participação qualificada na Banca Mediolanum em 2016. Este erro resulta do desconhecimento do alcance da decisão do Banco de Itália de 2014 que, ao contrário do que o Tribunal Geral decidiu, não teve por consequência reduzir a participação da Fininvest na Mediolanum, mas apenas suspender os direitos de voto inerentes às ações sujeitas a uma obrigação de cessão".
"Essa cessão só devia ocorrer posteriormente, no prazo de 30 meses, por intermédio de um fundo fiduciário responsável pela venda. À data da anulação decretada pelo Conselho de Estado italiano, a participação controvertida permanecia assim inalterada. A alteração da estrutura de detenção desta participação devido à incorporação da Mediolanum na Banca Mediolanum não alterou esta análise", pelo que "não se podia ter considerado que S. Berlusconi adquiriu uma participação qualificada em 2016, o que teria exigido uma notificação e uma avaliação por parte das autoridades competentes".
"Berlusconi só manteve uma participação qualificada que tinha sido adquirida muito antes, numa data na qual as disposições do direito da União aplicadas pelo BCE ainda não tinham sido transpostas para o direito italiano". E "uma vez que estas disposições são desprovidas de alcance retroativo, o BCE não podia legalmente ter-se oposto", conclui.