Notícia
Catarina e a dramática odisseia do GoGlico: “Suga e siga, sê livre!”
Diagnosticada com diabetes aos 29 anos, chegou a pesar 39 quilos. Podia ter morrido. Sobreviveu e inventou uma “solução SOS”, que foi patenteada, premiada e mundialmente reconhecida. Mas como não entra na moda da saúde digital, continua sem financiamento. Um testemunho pungente.
"O meu nome é Catarina Machado Pires. Nasci a 30 de Março de 1979, em Bragança. Com 1 ano fui viver para Lisboa e aos 7 anos para Bruxelas, experiência que muito enriqueceu a minha vida a vários níveis.
Aos 18 anos vim para o Porto estudar arquitectura na Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto (FAUP). Posteriormente, fiz Erasmus em Milão e o estágio curricular de seis meses em Florença. Regressei ao Porto durante uns meses para fazer a tese final de curso.
Após a apresentação da mesma, fui para Barcelona trabalhar como arquitecta, cidade na qual vivi durante três anos e meio e onde me foi diagnosticada a diabetes, em Julho de 2008.
Até então, e ao longo de uns meses, o meu corpo foi evidenciando os primeiros sinais, para mim desconhecidos, de um disgnóstico incontestável.
Os sintomas eram notórios, designadamente: sede excessiva e sensação constante de boca seca (bebia seis litros de água por dia), perda abismal de peso (perdi 10 quilos, cheguei a pesar 39 quilos do alto do meu 1,55 m) por mais que comesse exageradamente e de forma pouco saudável na tentativa frustrada de ganhar peso, vista turva (cheguei a não conseguir ler letras garrafais ou a reconhecer pessoas a um metro de distância) e cansaço excessivo.
Confesso que eu própria queria desvalorizar esses sinais, arrastando comigo o medo e a cobardia de um diagnóstico que, seguramente, de positivo nada traria.
Mas face ao meu estado físico, era imperativo enfrentar a realidade. Fiz análises, recebi os resultados com valores alarmantes (HbA1C a 18,9 %, quando os valores de referência rondam os 5%) e fui de imediato para as urgências do Hospital de Sant Pau.
A doença, nesse momento, ganhou nome: tinha diabetes tipo 1, passei a ser insulino-dependente.
No estado em que me encontrava podia ter morrido. Tinha 29 anos. Foi um choque e foi, acima de tudo, emocional e fisicamente muito violento.
No hospital, enquanto estava ligada a soro, com os olhos a escorrerem lágrimas, questionava-me continuamente: "Porquê eu?"
Simultaneamente, os enfermeiros picavam-me os dedos vezes sem conta, colocavam a gota de sangue numa tira que encaixavam num medidor de glicemia, espetavam-me agulhas na barriga com as canetas de insulina, ensinavam-me cuidadosamente a trocar as agulhas dessas canetas, a contar os hidratos de carbono dos alimentos que ingeria e, consequentemente, quantas doses de insulina tinha de injectar.
Explicaram-me ainda, sucintamente, o que era a diabetes: uma doença metabólica crónica na qual o organismo não produz uma quantidade suficiente de insulina (hormona vital libertada pelo pâncreas) ou não responde normalmente à insulina, fazendo com que o nível de glicose (açúcar) no sangue fique excessivamente elevado.
E que existem três tipos de diabetes: a diabetes tipo 1, a diabetes tipo 2 e a diabetes gestacional - que qualquer pessoa com diabetes vacila entre hiperglicemias (excesso de glicose no sangue) para as quais já existe a insulina artificial (em caneta ou bomba) e hipoglicemias (falta inesperada e repentina de glicose no sangue), que, ao contrário do que muitas vezes se pensa, não acontece apenas às pessoas com diabetes tipo 1, mas também às que têm diabetes tipo 2, e cujos sintomas são uma fraqueza extrema e súbita, incapacidade de raciocinar, tremores, taquicardia, tonturas, suores, vista turva, entre outros, podendo levar à perda de consciência e inclusivamente à morte.
"Sentia, literalmente, que tinha a minha vida nas minhas próprias mãos"
Foram vários dias assim, fisicamente dolorosos e emocionalmente frágeis, a absorver permanentemente toda aquela informação vital.
Até que saí do Hospital de Sant Pau e regressei a casa - abandonada não à minha sorte, mas sim forçada à minha auto-responsabilização. Sentia, literalmente, que tinha a minha vida nas minhas próprias mãos.
Passar a viver com diabetes tipo 1 foi, e é, ter de aprender a contar os hidratos de carbono que se ingere, bem como o seu grau de processamento e prever o comportamento da glicemia após a ingestão.
É saber a quantidade de doses de insulina que se tem de injectar, é picar os dedos, ler sensores, fazer contas, acertar valores de glicemia, saber interpretar os sinais do nosso corpo.
É uma tentativa constante de ter os valores de glicose no sangue estáveis, tentando assim evitar hiperglicemias e hipoglicemias.
É não perceber que nem sempre se consegue e por vezes nem se percebe o porquê.
É ter de carregar sempre consigo as canetas de insulina (lenta e rápida) para as hiperglicemias, as agulhas, as lancetas, o picador de dedos, as tiras de teste da glicemia, o leitor de glicemia, o sensor, ter aplicações no telemóvel, e, claro, paralelamente, os pacotes de açúcar, os rebuçados, os sumos ou os refrigerantes para corrigir as hipoglicemias.
É uma preocupação constante. É um processo não só exigente e contínuo de cuidar de si, mas, sobretudo, muito solitário.
Dado que passei a ser eu a gerir sozinha a insulina que injectava, nos primeiros tempos tinha imensas hipoglicemias, o que é extremamente assustador. Tornou-se, desde então, o meu maior medo no que respeita a esta doença. Cheguei a ter receio de ir dormir e não voltar a acordar.
Quando ocorre uma hipoglicemia, o nosso corpo dá-nos os sinais. Parece que algo nos suga as forças físicas e mentais, e a nossa preocupação instintiva e imediata é ingerir urgentemente açúcar de absorção rápida, imprescindível para não chegarmos a perder os sentidos.
Regressava com regularidade ao Hospital de Sant Pau (fazia parte do processo de apoio aos doentes que tinham sido recentemente diagnosticados com diabetes), cheia de dúvidas, que colocava aos médicos e enfermeiros.
Das situações mais marcantes foi quando perguntei se para as hiperglicemias já existia insulina artificial, o que devia fazer quando tinha uma hipoglicemia, para além dos meros pacotes de açúcar que já me tinham aconselhado? A resposta foi curta: comer uns rebuçados ou beber um sumo ou um refrigerante com alto teor de açúcar.
Nesse preciso instante, tomei ainda mais consciência das novas limitações que a diabetes tinha trazido à minha vida. Perante esta realidade, senti-me mais condicionada, com novos medos, frustrações e uma sensação de perda de auto-confiança e de liberdade.
Vi-me obrigada a declinar convites para ir fazer ‘rafting’, desistir do curso de surf, em suma: passei a ter receio de simplesmente entrar dentro de água. Questionava-me onde e como é que eu conseguiria levar os açúcares caso tivesse uma hipoglicemia, e como é que se superariam estas limitações. Não via solução à vista.
"Lidava cada vez pior com as limitações que esta doença tinha imposto à minha vida"
Em Julho de 2009 regressei a Portugal com os meus projectos de arquitectura, em seguida deu-se a crise financeira, fui trabalhar como guia-intérprete na Casa da Música e paralelamente fiz traduções, designadamente para a Capital Europeia da Cultura Guimarães 2012. Posteriormente, fui criadora de conteúdos e dei apoio à produção no âmbito do Porto Innovation Hub. Também fiz trabalhos de ‘voz-off’.
Ao longo do tempo, fui-me apercebendo que lidava cada vez pior com as limitações que esta doença tinha imposto à minha vida, sobretudo devido ao medo da ocorrência de hipoglicemias. Fico a olhar para as pessoas a fazer surf, remo, asa-delta, entre tantas outras actividades, e sei que não é para mim.
Mas, como é sabido, a necessidade aguça o engenho, e assim sendo, as minhas novas limitações transformaram-se em criatividade. Por que não seria eu a imaginar uma possível solução?
Comecei por analisar tudo aquilo que, na minha perspectiva, não funcionava nas soluções que me tinham desde sempre aconselhado para corrigir uma hipoglicemia: os pacotes de açúcar rasgam-se dentro dos bolsos ou carteiras, desfazem-se com a humidade; os rebuçados ficam colados ao papel ou plástico que os envolve, ficando igualmente impróprios para consumo, para além dos riscos de sequelas a nível dentário; os refrigerantes são sobredimensionados.
Do meu ponto de vista, trata-se somente de produtos já existentes no mercado que permitem corrigir uma hipoglicemia, mas que não foram especificamente pensados para trazer uma verdadeira solução para este perigo da diabetes.
Para além de muitas destas soluções nem sempre serem práticas no quotidiano, nenhuma das soluções se adapta de forma segura a actividades físicas ou desportivas, nomeadamente as já existentes bisnagas com xarope de glicose ou os géis energéticos, em especial em meio aquático ou mesmo aéreo.
É relevante realçar que, para além da alimentação, da dosagem correcta da insulina e da medicação no controlo da diabetes ser indispensável e vital, se, por um lado, uma pessoa com diabetes é incentivada a praticar actividades desportivas para ajudar a normalizar os níveis de glicose no sangue, por outro, ainda não existem soluções realmente viáveis que tenham em consideração as dificuldades que essa pessoa enfrenta quando se depara com uma hipoglicemia.
Esta tomada de consciência por parte da pessoa com diabetes leva-a a privar-se de determinadas actividades físicas pelo medo da ocorrência de uma hipoglicemia que possa colocar a sua vida em risco.
"O factor mais importante foi criar um dispositivo mãos-livres"
À luz destes factos, comecei a procurar algo específico para a diabetes. Algo mais digno do século XXI e mais digno para as pessoas. Procurei uma solução inovadora e pragmática que permitisse superar o medo da ocorrência de uma hipoglicemia, que colmatasse as actuais lacunas e a diferenciasse das escassas soluções existentes.
Então, enquanto arquitecta, comecei a desenhar, fiz inclusive algumas maquetes, comecei a transpor para o papel tudo aquilo que eram as minhas necessidades e exigências, e comecei aos poucos a conceber uma solução.
O fator mais importante foi criar um dispositivo mãos-livres, para poder ser permanentemente transportado junto ao corpo do utilizador (de preferência à volta do braço, ao alcance imediato da boca, para o respectivo conteúdo poder ser sugado), de modo a permitir que a glicose seja facilmente alcançada em tempo vital, transmitindo-lhe assim uma sensação de constante segurança caso ocorra uma hipoglicemia, independentemente do meio físico no qual se encontre.
Outro factor muito importante que tive em consideração foi o dispositivo ser impermeável e submergível de modo a poder ser transportado para dentro de água.
É de salientar que as actuais alternativas para a correcção de uma hipoglicemia não são sequer passíveis de serem transportadas em meio aquático: os tradicionais pacotes de açúcar diluir-se-ão na água tragicamente, os rebuçados ficarão impróprios para consumo e os refrigerantes não são sequer aptos a serem transportados para dentro de água, representando numerosas adversidades para a pessoa com diabetes, dado a glicose - imprescindível para a correcção de uma hipoglicemia - estar irremediavelmente em terra, dificultando o seu alcance em tempo vital.
Como que naturalmente, o dispositivo revelou ter a lógica da Nespresso: adquire-se o dispositivo que contém as cápsulas e em seguida bastará adquirir novas cápsulas.
Mas, contrariamente à lógica das máquinas de café, estas cápsulas também podem ser utilizadas independentemente do dispositivo em si, substituindo os métodos tradicionais existentes e trazendo uma resposta mais efectiva e eficaz ao quotidiano das pessoas com diabetes.
Outra exigência que tive na concepção do dispositivo, foi o facto de poder ser totalmente independente: não precisa sequer de ligação wi-fi, software, electricidade ou adaptadores.
Para mim, representa uma enorme vantagem, pois permite uma liberdade total, proporcionando a possibilidade de se poder ir para qualquer canto perdido neste mundo e, ainda para mais, com menos limitações e preocupações constantes - haverá internet? Electricidade? Que tipo e tomada electrica? E se ficar sem bateria? -, e menos peso na bagagem.
Simultaneamente, o dispositivo é não-invasivo, leve e de pequenas dimensões, contendo, todavia, a dosagem de glicose necessária para a correcção de uma hipoglicemia.
É igualmente prático, adaptável tanto ao diâmetro de qualquer pulso ou braço, bem como facilmente transportado à volta da alça de uma mochila.
É também resistente, especialmente devido ao material que compõe a cápsula de glicose, ao invés do papel ou plástico que envolve os pacotes de açúcar ou os rebuçados.
"Uma ‘solução SOS’ para uma panóplia de outras doenças ou exigências físicas"
Tendo também em conta os actuais estilos de vida e hábitos alimentares, bem como o facto de a obesidade infantil ter vindo a aumentar consideravelmente, podendo levar à diabetes, o dispositivo GoGlico pode também representar uma enorme ajuda para os pais de crianças ou jovens com diabetes, que sentem uma constante inquietação face aos perigos da hipoglicemia.
Bastará os pais, ou mesmo os educadores, colocarem, ou ensinarem a colocar, o dispositivo à volta do pulso ou do braço da criança e assim permitir, e inclusivamente motivar, a prática de qualquer actividade física ou desportiva, tão benéfica para a saúde.
Paralelamente, este dispositivo vai permitir que as crianças ou jovens com diabetes não se sintam frustrados nem excluídos relativamente à prática de qualquer actividade física, inclusivamente dentro de água, visto que estarão sempre em segurança.
Para além destas especificidades, à medida que ia desenvolvendo o dispositivo, apercebi-me que o mesmo podia não só destinar-se à correcção de hipoglicemias, mas também a uma panóplia de outras doenças ou exigências físicas que requerem a ingestão de uma "solução SOS".
Para tal, bastará alterar o conteúdo da cápsula consoante as necessidades. Assim sendo, o dispositivo ganhou uma dimensão mais ampla, reforçando ainda mais as suas características inovadoras.
Graças a este dispositivo, qualquer actividade física e desportiva passa a ser acessível, inclusivamente actividades consideradas alternativas, em meios físicos adversos, nas quais seria impensável corrigir uma hipoglicemia, como por exemplo na prática de alpinismo, para-quedismo, asa-delta, e igualmente em meio aquático, nomeadamente na prática de surf, windsurf, kitesurf, remo, paddle, rafting, mergulho, ou, simplesmente, banhar-se.
Há ainda que não deixar espaço para dúvidas: o dispositivo GoGlico não está a competir com as insulinas, nem com nenhum dos diferentes dispositivos actuais para monitorizar a glicose. O dispositivo GoGlico trata a outra faceta da doença, as hipoglicemias.
Ao longo de todo este processo, a minha doença começou finalmente a ganhar um sentido, uma ‘razão de ser’. Apaziguava-me a alma só o pensar que podia ter acabado de inventar uma solução para a correcção de hipoglicemias, mas não só. Ironicamente, a minha doença ganhara um propósito.
À medida que o dispositivo ia ganhado forma, pareceu-me importante inventar e registar uma marca que tinha de ter obrigatoriamente uma conotação positiva. Surgiu assim o nome GoGlico, no sentido de ‘Go! Vai! Leva a tua Glico(se) contigo!’. Suga e siga, sê livre!
Percebi, através do programa televisivo americano Shark Tank, a importância de uma patente para os investidores, e, assim sendo, dirigi-me a um gabinete de advogados especialistas em propriedade intelectual, a ClarkeModet.
Comecei por fazer com eles o pedido de internacionalização da marca GoGlico, mas sobretudo informei-me acerca dos trâmites para o pedido provisório de patente e dei início à sua redacção.
"Excluída porque a solução não incorpora uma tecnologia digital"
Foi imperativo também adquirir alguns conhecimentos sobre o mundo dos negócios, tão diferente da minha área de formação. Como é que se punha um produto destes no mercado? Quais teriam de ser os passos seguintes?
Comecei por frequentar o programa Escola de StartUps do Pólo de Ciência e Tecnologia da Universidade do Porto (UPTEC), que, após o Pitch Day, ocasionou a divulgação do dispositivo GoGlico em vários artigos de jornal e no programa de rádio Ciência ao Ouvido. Posteriormente, também frequentei o curso Porto Design Accelerator no Porto Design Factory.
Paralelamente, fui fazendo algumas impressões 3D do dispositivo, mas também se revelou fundamental desenvolvê-lo, na íntegra, a uma escala mais próxima da realidade e com maior rigor.
Desenvolvi o protótipo com o Pólo de Inovação em Engenharia de Polímeros (PIEP), em Guimarães. Foram também feitos alguns testes em laboratório na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto no que respeita ao conteúdo da cápsula. Confirmei que a minha solução era perfeitamente exequível.
Com o protótipo em mãos e acordos de confidencialidade assinados, reuni com diferentes empresas para obter o orçamento das diferentes partes que compõem o dispositivo.
Tive de constituir empresa, a GoGlico, Unipessoal Lda., dado ser uma condição ‘sine qua non’ para ter acesso à maioria dos concursos para financiamento.
Neste sentido, concorri e fui premiada no concurso MED.IDEAS, promovido pelo NORTEXCEL 2020, com o segundo prémio na categoria CARE. Este concurso deu origem a um vídeo que se pode encontrar em https://www.youtube.com/watch?v=TuAlXIDphOM
Ao longo de todo este processo, fui conquistando vitórias importantes: a patente está concedida nos Estados Unidos, em grande parte dos países da Europa, no Japão, e com um pedido de patente pendente no Canadá. A marca GoGlico está também concedida na União Europeia, Suíça, Noruega, México e Estados Unidos.
A GoGlico é uma startup cujo investimento até ao presente foi suportado por mim.
Assim sendo, é fundamental a GoGlico procurar financiamentos. Mas, cada vez mais se depara com a mesma adversidade: o dispositivo GoGlico parece não estar em concordância com as tendências actuais porque os financiamentos, quer seja através de concursos - de uma enorme complexidade - ou de capital de risco, são maioritariamente direccionados para a saúde digital, ou então para projectos de investigação científica, geralmente para universidades, laboratórios ou grandes empresas, o que não é o caso da GoGlico.
Embora tenha submetido algumas candidaturas, tem vindo a ser excluída, com a justificação de que, independentemente do grau de inovação, a solução não incorpora uma tecnologia digital.
O que para mim sempre foi uma enorme vantagem, e que se reflecte em menores custos de produção, não é devidamente valorizado nos dias que correm. Parece que actualmente tudo tem de conter um chip electrónico, depender da electricidade, de uma ligação wi-fi ou bluetooth ou ter ligação a uma aplicação para telemóvel.
Não pretendo de modo algum desvalorizar os avanços que as novas tecnologias digitais ligadas à saúde representam, mas não é delas que preciso quando tenho uma hipoglicemia. O corpo vai-me dando todos os sinais de que precisa de açúcar de forma urgente, para eu não chegar a perder os sentidos.
Ultimamente, e após uma pandemia em que a GoGlico não pôde avançar, tenho entrado em contacto com algumas associações, fundações e organizações ligadas à diabetes, sobretudo a nível internacional, de modo a saber se têm financiamentos para apoiar projectos desta natureza.
No entanto, as respostas não se revelaram positivas porque das duas, uma: ou as associações não têm qualquer verba para financiar projectos para dispositivos, ou, se têm, uma vez mais estão destinadas a projectos de grandes dimensões na área da investigação científica.
Ainda assim, através destes contactos, o projecto GoGlico tem sido valorizado tanto pela International Diabetes Federation (IDF), tendo eu sido nomeada membro da Blue Circle Voices (BCV) Network (aguardo o ‘upload’ do meu perfil na respectiva página web), bem como pela International Society for Pediatric and Adolescent Diabetes (ISPAD), que me deverá nomear para o ISPAD Hero Award 2023.
"Seria insultuoso desistir desta causa, pois a diabetes afecta 500 milhões de pessoas"
Tenho-me dedicado integralmente ao projecto GoGlico, que tem exigido de mim uma enorme resiliência.
É impensável desistir desta causa. Seria lamentável, quase insultuoso, quando se considera que: a diabetes afeta hoje em dia praticamente 500 milhões de pessoas, representando 8,5% da população mundial; já é considerada uma epidemia global pela Organização Mundial da Saúde; entre 2017 e a previsão para 2045, estima-se que haverá um crescimento de 48% de pessoas com diabetes no mundo, um assustador crescimento exponencial, e que, se essas estimativas se cumprirem, 1 em cada 10 adultos terá diabetes; a diabetes provoca 1 morte a cada 6 segundos.
Só em Portugal, existem actualmente mais de 1 milhão de pessoas com diabetes e 2 milhões com pré-diabetes, o que representa 40% da população portuguesa; em 2015 representou 12% dos gastos em saúde; em 2018 foi estimado que cada caso de hipoglicemia grave com admissão na urgência e encaminhamento para o internamento totalize, em média, 2.323,73 euros; só no último ano, foram registados no SNS mais de 79 mil novos casos de diabetes, entre tantos outros dados cada vez mais alarmantes.
Face a esta realidade, é imperativo e vital não desistir da solução encontrada, sobretudo tendo em conta que a diabetes pode ser prevenida com a prática desportiva que tem de ser não só praticada em total segurança, mas também incentivada.
O dispositivo GoGlico poderá transformar a vida de milhões de pessoas, trazendo-lhes uma substancial melhoria da qualidade de vida física e mental.
Este dispositivo permite a qualquer pessoa com diabetes corrigir, em total segurança, uma hipoglicemia (ou outro sintoma de uma patologia que também necessite uma ‘solução SOS’), bem como readquirir o sentido de segurança para vencer esse medo e recuperar a auto-confiança na prática de qualquer actividade física ou desportiva, independentemente do meio físico e do grau de dificuldade do desafio, mas, acima de tudo, reconquistar um novo sentido de liberdade, sem colocar em risco a sua vida.
Actualmente a GoGlico está à procura de parceiros que queiram contribuir para disponibilizar este produto à comunidade, e aberta a qualquer contribuição através de potenciais contactos de pessoas ou empresas que tenham interesse em apoiar este projecto.
Mantenho a esperança. Como dizia Vergílio Ferreira: ‘Quanto mais grave é uma doença, maior tem de ser a esperança. Porque a função da esperança é preencher o que nos falta.’"