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Santana Lopes, o regresso do "menino guerreiro" que já morreu muitas vezes na política

"A vida já me ensinou que na política pode-se morrer muitas vezes" afirmou Santana Lopes numa entrevista, em Dezembro de 2016. Apostado nesta crença, tenta reocupar um lugar que já foi seu, o de líder do PSD. Santana não deixa ninguém indiferente.

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"Não me despeço, vou andar por aí". A afirmação foi feita por Pedro Santana Lopes em Abril de 2005, no congresso do Pombal, após o PSD ter perdido em Fevereiro as eleições legislativas para o PS e de o próprio ter abandonado a liderança do partido face aos maus resultados, tendo o seu lugar sido ocupado por Luís Marques Mendes.

Nessa campanha eleitoral de 2005, Santana Lopes ofereceu um outro exemplar que fica para a história da política portuguesa, o hino "Menino Guerreiro". "Um homem também chora/Menina morena/Também deseja colo/ Palavras amenas/Precisa de carinho/Precisa de ternura/Precisa de um abraço/Da própria candura/Guerreiros são pessoas/São fortes, são frágeis/Guerreiros são meninos/No fundo do peito" era as palavras sustentadas por uma canção adaptada do brasileiro Gonzaguinha.

Depois de Pedro Passos Coelho ter anunciado a sua saída da liderança do PSD, devido aos maus resultados nas autárquicas de Outubro, Santana Lopes fez um compasso de espera mas foi deixando alimentar os rumores de que iria entrar na corrida, uma forma de se manter presente na comunicação social. O "vou andar por aí", versão 2017. Mas acabou por jogar na antecipação.

A 10 de Outubro, depois do jogo de futebol Portugal-Suíça, que ditou o apuramento da selecção para o mundial a disputar em 2018 na Rússia, Santana Lopes aproveitou o espaço semanal de debate que partilha com António Vitorino na SIC Notícias para desfazer o tabu: "Hoje é um dia de boas notícias, Portugal ganhou e eu sou candidato à liderança do PPD/PSD. Candidato-me para levar o PPD/PSD a disputar as eleições de 2019 e para as ganhar, não para ser segundo, mas para ser primeiro". Um dia depois, Rui Rio haveria de apresentar a sua candidatura em Aveiro.  


O espaço escolhido para fazer o anúncio foi a mesma SIC que abandonou intempestivamente em Setembro de 2007, durante uma entrevista que foi interrompida para a estação de televisão fazer um directo da chegada de José Mourinho a Lisboa, depois do treinador ter sido despedido do Chelsea. "Acha que isto se justifica. É assim que o país anda para a frente" questionou. "Eu acho que o país está doido" comentou para a jornalista Ana Lourenço, antes de abandonar o estúdio.

Santana Lopes com António Costa em 2011 quando o actual primeiro-ministro era presidente da Câmara de Lisboa.
Santana Lopes com António Costa em 2011 quando o actual primeiro-ministro era presidente da Câmara de Lisboa.

 

Para Pedro Santana Lopes, nascido a 29 de Junho de 1956 (61 anos) em Lisboa, a vida sempre foi um desafio constante. Formado em Direito, em Lisboa, nos tempos em que esta era um palco de confrontos ideológicos tumultuosos, rapidamente se apaixonou pela política.

O seu ídolo era Francisco Sá Carneiro e foi rápido como um raio a entrar na política, tendo sido assessor de um primeiro-ministro, com 23 anos. Fez um projecto de revisão constitucional com 24 anos. Foi presidente da distrital de Lisboa do PSD com 25 anos. O seu caminho estava traçado, ou escrito nas estrelas, como se costuma dizer. E ele foi feito de crenças e de emoções fortes. Algo nem sempre compreendido nestes tempos de inconstância e mobilidade, como dizia Zygmunt Bauman, valores que se tornaram demasiado afinados e cinzentos. Na sua acção política talvez Pedro Santana Lopes tivesse um dia sublinhado um ensinamento de Bismarck: "A política não é uma ciência baseada na lógica. É a capacidade, a cada instante e em situações em constante alteração, de escolher sempre o menos prejudicial e o mais útil." 

Neste mundo de degradação da palavra política, Santana Lopes intui que quem não sabe falar não sabe decidir. E ele sempre teve o dom da palavra. Sem palavras não há diálogo e não há democracia. E ele continua a acreditar na social-democracia, tal como a sonhava Sá Carneiro. A sua vida política é a representação dessa via: quando terminou a licenciatura foi chamado para adjunto do ministro Álvaro Monjardino, no governo de Carlos Mota Pinto. Depois das eleições de 1979 torna-se assessor jurídico de Sá Carneiro, função que desempenha até ao acidente de Camarate. É eleito deputado, enquanto dá aulas e se torna advogado. 

Divorciado e pai de cinco filhos, Santana Lopes tem uma longa fama de "playboy". "Os falhanços das relações são a marca mais negra da minha vida. Procuro assumir as responsabilidades, mesmo dos erros, mas detesto falhar. Consome-me, e é uma grande frustração. Agora, não sou cínico, não sou hipócrita, não sou capaz de manter uma relação só por manter. E tenho um lema: se Deus nos deu esta vida – e acredito que sim e dou graças por ela constantemente – não podemos desistir de ser felizes, de tentar ser felizes. A acomodação, a resignação a uma situação em que não haja essa chama viva, não faz sentido. Tenho a obrigação de lutar por ser feliz. Mas sei as responsabilidades que tenho, as funções que exerço e entendo que a minha infelicidade – infelicidade entre aspas, infelizes são os que têm fome –, os meus problemas não devem gerar situações que choquem as pessoas, principalmente depois dos 40 anos", disse numa entrevista a Anabela Mota Ribeiro, publicada no Diário de Notícias em Junho de 2003.

Em Janeiro do ano passado, numa entrevista à revista Cristina, admitiu: "Tenho noção que a minha vida pessoal não tem sido sempre de acordo com os cânones da Igreja Católica".

No PSD, irrompeu como um relâmpago. Fez parte da Ala Nova Esperança (que não via com bons olhos o governo do Bloco Central) e apoia Cavaco Silva em 1985. Em 1986, é nomeado secretário de Estado da presidência do Conselho de Ministros. O farol da comunicação hipnotiza-o. Em 1988, funda a PEI, que adquire o Record e o Diário Popular ao Estado, cria o semanário O Liberal, a RádioGeste e a revista Sábado. Em 1990, regressa ao Governo como secretário de Estado da Cultura. E foi aí que cometeu uma gaffe que ainda hoje é recordada, sobretudo para o menorizar. Quando lhe perguntaram sobre o reportório dos músicos eruditos de que mais gostava respondeu: os violinos de Chopin. O problema era simples, o compositor polaco (1810-1849) escreveu 264 peças mas nenhum concerto para violino. Depois volta ao ensino e à advocacia. 

Quando Cavaco Silva abandona a liderança do PSD em 1995 ainda começa a luta pela liderança contra Durão Barroso e Fernando Nogueira, mas afasta-se. E aceita o desafio de José Roquette (apostado em transformar o Sporting num clube da nova era da indústria do futebol) para ser presidente dos leões. Acaba por se demitir do cargo e regressar à política porque esse sempre foi um eco maior nas suas decisões.

 

Em 1997, candidata-se a presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz e vence. Em 2000, disputa a liderança do PSD para Durão Barroso, mas este vence. Aproximava-se um novo desafio. Torna-se presidente da Câmara de Lisboa contra João Soares, mas a saída súbita de Durão Barroso, então primeiro-ministro, rumo à presidência da Comissão Europeia leva-o a São Bento. É primeiro-ministro em 2004. Mas a sua coabitação com o Presidente Jorge Sampaio não é fácil. Poucos meses depois, Sampaio dissolve o Parlamento e em 2005 perde para José Sócrates, que consegue maioria absoluta para o PS.

Santana Lopes com Durão Barroso em 2002 como candidato à Câmara de Lisboa.
Santana Lopes com Durão Barroso em 2002 como candidato à Câmara de Lisboa.


Volta a ser deputado. Perde as eleições para a Câmara de Lisboa em 2009 contra António Costa. Em 2011, Pedro Passos Coelho indica-o como provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e acaba reconduzido, em 2016, por António Costa. Os dois revelam-se verdadeiros aliados de Santana Lopes, reconhecendo os seus méritos. 

Em declarações ao jornal Sol, a 18 de Outubro, feito durante um dos seus últimos actos públicos enquanto provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa - inauguração de uma unidade da instituição dedicada ao cuidado e residência de pacientes tetraplégicos – Santana Lopes disse que este o cargo o mudou enquanto político e foi uma experiência de "impacto enorme". "Quem está na política tem de fazer um esforço interior para não desfocar da realidade. Na Santa Casa aprende-se isso. Dá-nos um olhar diferente".

Santana Lopes fotografado no seu gabinete da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa em 2014.
Santana Lopes fotografado no seu gabinete da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa em 2014.


"A vida já me ensinou que na política pode-se morrer muitas vezes", afirmou numa entrevista ao Expresso, em Dezembro de 2016. Pedro Santana Lopes, com a sua candidatura à liderança do PSD, ensaia uma nova ressurreição, transformando em axioma o comentário que o escritor Mark Twain fez relativamente às informações que o davam como morto: "parece-me que as notícias sobre a minha morte são manifestamente exageradas".

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