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Rui Rio: "Quando o político é dos bons, as pessoas nem percebem que estão a ser enganadas"
O ex-autarca do Porto lamenta que "nem sempre" seja preso quem comete grandes roubos, explica por que rejeitou disputar a liderança do PSD com Passos Coelho em 2009 e volta a atacar os "truques" da imprensa portuguesa.
Durante uma intervenção no fórum "Norte Yoga 2017", realizado na Porto Business School, o "partner" da Boyden referiu que "ninguém vai preso na vida pública por chegar ao microfone, dizer duas coisas e enganar as pessoas". "Normalmente nem vai politicamente preso porque as pessoas nem percebem que estão a ser enganadas quando o político é mesmo dos bons", ironizou.
"Claro que tudo tem um limite e chega uma dada altura em que as pessoas começam a perceber. Alguns têm arte para durante bastante tempo andarem a enganar, até deturpando o que os outros disseram que é verdade, transformando a verdade dos outros em mentira", completou Rio, frisando que os políticos não devem prometer o que é impossível nem "esconder o que é muito relevante e que sabem que vão fazer".
Falando da indispensabilidade das regras da ética nas áreas que o Direito "não consegue albergar", deu o exemplo do princípio de não roubar, que encontra defesa nas leis. Com uma pequena nuance, que assinalou numa altura em que o caso BES e a Operação Marquês voltaram às primeiras páginas. "Se alguém rouba é preso - nem sempre, mas enfim [risos]. Ou melhor, se roubar coisa pequena é preso; se roubar uma coisa muito grande já é diferente. Já tem um inquérito, já tem uma acusação ou não. Aí já é muito mais complicado", declarou.
A coerência foi outra das regras éticas destacadas neste evento dedicado à produtividade, excelência e felicidade nas empresas e instituições públicas. Recuou às autárquicas de Outubro de 2009, quando afixou na cidade um cartaz com uma foto de corpo inteiro e a mensagem "Com os dois pés no Porto", para justificar por que é que, um mês depois de ser eleito na Invicta, não se candidatou a presidente do PSD, sucedendo a Manuela Ferreira Leite.
"Eu tinha dito que tinha os dois pés no Porto, e não um no Porto e outro em Lisboa. Não aceitei [candidatar-me à liderança do PSD] por coerência e por lealdade a quem me confiou o seu voto", argumentou o ex-autarca, embora reconhecendo que "dá jeito às vezes não cumprir esta regra de coerência" e que "em situações limite" até pode ser desculpável quebrá-la.
Ataque aos "truques" da imprensa
Mas para o actual quadro da Boyden, uma empresa especializada no recrutamento de executivos, "pior do que a mentira é a meia verdade", já que "a mentira apanha-se relativamente rápido, enquanto a meia verdade é um problema – às vezes é só 15% de verdade, mas são suficientes para baralhar tudo e enganar as pessoas".
Retomando uma crítica já recorrente, Rui Rio sustentou que "isto é particularmente grave no quadro da Comunicação Social". Apontando-a como aquela que "hoje em dia mais viola as regras éticas, justamente por recurso à meia verdade", continuou, num tom acusatório, que "não [deve] tomar partido por ninguém [ou] seleccionar as notícias em função da publicidade que se dá e dos almoços e das viagens que se pagam aos jornalistas".
"Aconteceu deturparem o que eu digo, mais tarde eu repito o que antes tinha dito e dizem que entrei em contradição. Este é um dos truques muito vulgares. Disse uma coisa, deturpam. Repito isso passados três meses e [dizem que] alterei a minha posição. E só os mais atentos é que notam", resumiu o economista que foi deputado, dirigente nacional do PSD e presidiu à Câmara do Porto durante 12 anos.
Sublinhando que em Portugal, ao contrário dos Estados Unidos, não é comum os partidos trazerem "para a praça pública aspectos de natureza pessoal, que não têm a ver com o exercício da função, apenas para as denegrir politicamente", Rui Rio insistiu que "pior ainda é quando isto passa para a Comunicação Social (…) apenas em nome das vendas e do lucro". E voltou a defender sanções agravadas para a imprensa.
"Dão cabo da vida de alguém, sem regra nenhuma, apenas para vender mais meia dúzia de jornais durante uma semana ou duas. Isto é o cúmulo. E isto não está defendido pelo Direito, mas podia. De facto, não se quer porque, se se quisesse, estava. Este é também um dos sintomas do desgaste do regime, que estamos a viver", concluiu.