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Conheça os argumentos de Draghi para não fazer nada
O presidente do BCE recusou que a Europa enfrente um cenário de deflação, mas admitiu os riscos de inflação baixa. Por enquanto o BCE não actua, o que Draghi justifica por precisar de mais informação. “A situação é complexa”, defendeu.
A inflação baixa na Zona Euro não antecede a deflação, mas há sinais preocupantes. O BCE entende que precisa de analisar melhor um cenário que Mario Draghi caracterizou como “complexo”, adiando para Março qualquer decisão. O presidente do BCE explicou os argumentos que fazem o BCE hesitar perante uma taxa de inflação que está abaixo de 1% desde Outubro, um valor significativamente abaixo da meta de 2% assumida pelo banco central.
Na conferência de imprensa mensal de quinta-feira, dia 7, que se seguiu à reunião de governadores do BCE, o presidente do banco central começou por defender que “não há deflação na Europa” e que “as expectativas de inflação estão firmemente ancoradas”. “Não vemos semelhanças com o Japão” do início do século, garantiu depois.
Draghi diz que não há “uma queda generalizada de preços por um longo período de tempo num conjunto países”, o que é a definição de deflação, nem há evidência de “adiamentos de planos de despesa”, uma das características de processos deflacionistas.
Por outro lado, continuou, “a taxa de inflação não está muito mais baixa que nos EUA, onde a recuperação está mais avançada” – sendo que o BCE antevê uma recuperação lenta da Zona Euro nos próximos meses – e os níveis de inflação registados na Zona Euro “são mais ou menos os mesmos” que os verificados nas duas últimas crises.
Munido de muitos argumentos para responder aos que avisam para os riscos de deflação, Draghi defendeu ainda que grande parte do ajustamento em baixa "da inflação core [a que exclui os preços mais voláteis da energia e alimentação] vem dos quatro países de programa", isto é, Portugal, Espanha, Grécia e Irlanda. E assim sendo, "isto significa mais um ajustamento relativo de preços [dentro da Zona Euro] do que um fenómeno de deflação", defende.
No entanto, se não há riscos de deflação, tal não significa que não existam riscos no actual cenário. Pelo contrário. “A inflação baixa é um risco em si mesmo”, prejudicando a recuperação e a sustentabilidade da dívida, afirmou o presidente do BCE que defendeu que o banco precisa de mais tempo para analisar a realidade europeia.
É que se uma parte da inflação mais baixa se deve à evolução dos preços da energia e alimentação, outra parte resulta de menor procura, e é necessário analisar como evoluirá a economia nos próximos tempos, quer na actividade económica, quer na concessão de crédito.
Além disso, os dados das vendas a retalho no Natal não foram muito bons e em Itália e França há sinais que apontam para que os aumentos da tributação indirecta não tenham passado para os consumidores, o que significa que o poder de definição de preços pelas empresas “é ainda fraco”.
Perante esta descrição, Draghi descreveu a situação como “complexa”. “Antes de tomarmos qualquer decisão, vamos esperar”, justificou, atirando qualquer decisão para Março. Na mesa dos governadores está um vasto leque de opções que o presidente do BCE garante que têm estado a ser estudado, podendo ser aplicadas, isoladas ou em conjunto, assim que considerem oportuno.
O BCE poderia baixar a taxa de juro central, actualmente em 0,25%, tornando o preço do dinheiro ainda mais barato. Vários analistas apostam num corte inferior a 0,25% para não encostar a taxa aos 0%. Outra hipótese é cortar a taxa de juro de depósitos – isto é a remuneração que o BCE oferece pelo dinheiro que os bancos lá depositam – para valores negativos. Neste caso, o objectivo seria incentivar as instituições financeiras a emprestar dinheiro à economia em vez de o ter parqueado em Frankfurt.
Além de alterar as taxas com que conduz a política monetária, o BCE poderá tentar estimular a economia, o crédito e os preços por outras vias, como a realização de mais um leilão de longo prazo que garanta dinheiro barato aos bancos até depois de 2016, procurando aumentar a confiança entre instituições e o crédito à economia. Mais polémica seria a decisão de comprar carteiras de créditos directamente aos bancos, especialmente aos da periferia - uma forma de baixar o preço do crédito nas economias mais frágeis do euro. Finalmente, e talvez a opção mais polémica de todas seria a compra directa de dívida pública.
(Actualizado às 18 horas nos três últimos parágrafos com informação sobre instrumentos que o BCE poderá usar)