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Conheça o populista de esquerda que quer ser "um bom presidente do México"

López Obrador protagoniza uma histórica viragem política após 90 anos de governação à direita. Aos receios dos investidores e vizinhos norte-americanos responde com prudência económica e orçamental e respeito pelas liberdades individuais.

02 de Julho de 2018 às 10:52
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À terceira foi de vez. Depois de perder as eleições em 2006 e 2012, Andrés Manuel López Obrador venceu este domingo, 1 de Julho, as Presidenciais no México. No final de um longo processo de transição de poder, que só vai terminar com a tomada de posse prevista para 1 de Dezembro, o político de esquerda que foi a votos como candidato anti-sistema vai iniciar um mandato de seis anos, sucedendo a Enrique Peña Nieto à frente da segunda maior economia da América Latina.

 

Ainda sem números finais, mas com uma vantagem de mais de 30 pontos nos primeiros dados do Instituto Nacional Eleitoral (a maior em Presidenciais desde os anos 1980), este resultado eleitoral representa uma inédita viragem à esquerda na história democrática do país, que nas últimas nove décadas foi governado à direita – e quase sempre pela mão do Partido Revolucionário Institucional (PRI), apenas afastado do poder durante 12 anos, entre 2000 e 2012, pelos também conservadores do Partido da Acção Nacional (PAN).

 

Andrés Manuel López Obrador, normalmente tratado pelas iniciais AMLO, tem 64 anos, lidera o Movimento Regeneração Nacional (MORENA) e chega à Presidência num movimento político em contraciclo com as soluções mais conservadoras que têm ganho força naquela região. Prometendo combater a desigualdade, aumentar os salários e os gastos com o Estado Social, apresentou-se ao eleitorado como o líder mais à esquerda desde Lazaro Cardenas, que, ao assumir o poder em 1934, distribuiu terras pelos camponeses e nacionalizou as indústrias estrangeiras, incluindo as petrolíferas.

 

As mudanças serão profundas, mas ocorrerão de acordo com a ordem legal estabelecida. (…) O novo governo manterá disciplina financeira e orçamental e serão reconhecidos os compromissos contraídos com empresas e bancos nacionais e estrangeiros. Andrés Manuel López Obrador, presidente eleito do México

Esta madrugada, perante dezenas de milhares de apoiantes que se concentraram numa praça da capital, Lopez Obrador anunciou que a primeira medida será dobrar as pensões de reforma e que quer "entrar para a história como um bom presidente do México". Num tom descrito pela Reuters como conciliador, deixou promessas de prudência económica, manutenção da disciplina orçamental, independência para o banco central e respeito pelas liberdades individuais. Ao lado da mulher e dos filhos, garantiu ainda que não irá confiscar a propriedade privada e que "o novo projecto da nação vai tentar perseguir uma democracia autêntica".

 

Nascido numa região pobre do México onde começou a exploração de petróleo – aliás, entre as principais promessas está a de passar a pente fino todos os contratos de energia celebrados entre o Estado e empresas privadas nos últimos seis anos, à procura de "sinais de corrupção" –, o futuro líder máximo dos quase 130 milhões de mexicanos apontou também a uma estratégia de menor confrontação com os cartéis da droga no país, incluindo algumas hipóteses de amnistia. Só na última década, os combates entre o Exército e os traficantes já resultaram em cerca de 230 mil mortes.

 

Populista à mesa com Trump

 

Reconhecido na cena política desde que assumiu a liderança da autarquia da Cidade do México nos primeiros anos do século, AMLO é descrito pela generalidade da imprensa internacional como um populista. E disso sobram alguns primeiros e fortes sinais: vai cortar os salários dos altos responsáveis políticos, viver numa casa de classe média, transformar a residência oficial num centro de artes e vender o avião presidencial.

 

Ao populismo, o novo líder soma os ideais nacionalistas, a teimosia e a crítica implacável aos adversários políticos. Traço de carácter e de actuação política que já lhe valeram algumas comparações com Donald Trump. Apesar de, poucas horas antes ter ameaçado aumentar a tributação aos carros importados do México se as tensões entre os dois países aumentarem neste novo ciclo político, o presidente dos Estados Unidos já saudou o futuro homólogo, via Twitter, afirmando estar "muito ansioso para trabalhar com ele".

 

 

O primeiro contacto oficial entre Lopez Obrador e a Casa Branca deverá ser uma chamada telefónica ainda esta segunda-feira, 2 de Julho. A equipa de trabalho que está a acompanhar o sucessor do impopular Enrique Peña Nieto (sai de cena com uma taxa de reprovação de 90%) inclui alguns elementos do "establishment" mexicano, o que está a acalmar o nervosismo dos investidores e também do parceiro norte-americano, com quem terá de lidar em matérias sensíveis como a construção de um muro na fronteira ou a renegociação do tratado regional de livre comércio (NAFTA), que envolve também o Canadá.

 

Enquanto não é claro se o jovem partido MORENA consegue a maioria no Congresso – disso dependerá o grau de liberdade para produzir alterações mais radicais na política económica –, para a história fica a campanha eleitoral mais violenta das últimas décadas. Citando a consultora Etellekt e relatos da imprensa local, a agência AFP contabilizou um total de 124 políticos assassinados desde o início da pré-campanha, em Setembro de 2017, ano em que os números oficiais registaram um recorde de 29.168 homicídios no país.

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