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"Rezem por nós e pela África do Sul"
"Não há gasolina, os supermercados estão vazios e não conseguimos sair de casa", diz uma portuguesa a viver na cidade sul-africana de Ballito, perto de Durban.
Ana C. vive em Ballito, na província de KwaZulu-Natal, na África do Sul, e conta a medo o desespero que atualmente ali se vive, a par com muitas outras zonas do país, neste período conturbado de violência e pilhagem desde a detenção do ex-presidente Jacob Zuma. "Não ponham o meu apelido", pede.
"Por aqui não há gasolina, os supermercados estão vazios e não conseguimos sair de casa", relata Ana ao Negócios. "Já tentaram entrar nalgumas casas e agora temos os nossos homens a revezarem-se durante todo o dia e noite, a guardarem a entrada do prédio. Isto está muito feio", acrescenta, pedindo: "Rezem por nós e pela África do Sul".
Em pleno caos, há também um lado solidário a sobressair, como é o caso de um grupo de homens que se deslocou de Joanesburgo a Durban com camiões carregados de pão para distribuir. "A união das pessoas que se juntaram por aqui, para se protegerem e darem comida umas às outras quando esta falta, tem sido incrível", diz Ana, que é filha de emigrantes portugueses.
As duas irmãs e os pais de Ana vivem perto de Joanesburgo, na província de Gauteng, e dizem que por enquanto as coisas, por ali, não estão tão inflamadas como em Ballito. Ainda assim, não se pode falar de sossego, já que é uma das províncias onde se registam mais distúrbios.
O conselheiro da diáspora madeirense na África do Sul, José Nascimento, declarou à Lusa que "cerca de uma centena de negócios de seis grandes empresários portugueses, incluindo filhos de madeirenses, no setor alimentar e de bebidas, foram saqueados e vandalizados na África do Sul". "O número de negócios afetados ronda uma centena. Por exemplo, só o empresário Vicente Ferreira perdeu 28 negócios, grande parte no KwaZulu-Natal", sublinhou.
As vítimas mortais da onda de violência que assola a África do Sul pelo sétimo dia consecutivo já ascendem a pelo menos 117, tendo sido realizadas mais de 2.200 detenções, segundo um novo balanço divulgado esta quinta-feira pela Presidência da República sul-africana e citado pela Lusa.
"Estima-se que vivam cerca de 450.000 portugueses e lusodescendentes na África do Sul, dos quais pelo menos 200.000 em Joanesburgo e Gauteng, e 20.000 no KwaZulu-Natal, mas segundo o conselheiro português não há cidadãos nacionais entre as vítimas", refere a agência.
Recorde-se que Zuma se entregou às forças de segurança na passada quarta-feira à noite, 7 de Julho, para cumprir uma pena de 15 meses [ao fim de quatro meses poderá pedir liberdade condicional] por desrespeito, já que se recusou a testemunhar perante a comissão que está a investigar as acusações de que é alvo: corrupção na compra de armamento em 1999 e favorecimento de empresários durante a sua presidência (2009-2018).
Os protestos por parte dos seus defensores começaram na sexta-feira, 9 de julho – com os incidentes a terem origem no KwaZulu-Natal, província de nascimento do ex-presidente.
Os distúrbios prosseguem desde então e o atual presidente do país, Cyril Ramaphosa, anunciou ontem que está a equacionar o envio de 25.000 soldados para as ruas, na tentativa de travar esta espiral de violência. O número inicial do destacamento militar era de 2.500 homens, depois aumentou para 5.000 mas continua a ser insuficiente para conter os tumultos.