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Polícia cobra taxas ilegais por comprovativos de denúncia, diz a Provedora
Depois de um despacho que previa o direito a facultar sem taxas associadas comprovativos de denúncia, forças de segurança continuam a cobrar remetendo para ordens do gabinete do ministério, alerta a Provedoria de Justiça.
Quem for hoje à polícia apresentar queixa será alvo de uma cobrança na hora de pedir um comprovativo de denúncia que relate o conteúdo da sua queixa. Provedoria de Justiça diz que esta cobrança é ilegal e reveladora de uma "prática de má administração" e GNR diz que segue ordens do Ministério da Administração Interna (MAI).
Em 2015, depois de um alerta da Provedoria, o MAI determinou o direito dos denunciantes de receberem um comprovativo de denúncia no momento da sua queixa e sem qualquer taxa associada. No entanto, refere agora a Provedora de Justiça, as forças de segurança continuam sem emitir o comprovativo ou, nos casos em que o fazem, continuam a cobrar. Questionada pela Provedora, a GNR remete para ordens contraditórias do gabinete da ministra da altura.
Numa recomendação dirigida ao MAI que surge no seguimento de várias queixas relativas às taxas cobradas pelas entidades tuteladas por este ministério, Maria Lúcia Amaral sustenta que não está a ser seguida a recomendação que fez em 2015 - na altura, acatada por despacho no dia 24 de março do mesmo ano pela então ministra Anabela Miranda Rodrigues.
O comunicado refere que nestas situações é apresentada apenas a alternativa de ser emitida uma certidão cuja taxa correspondente é de 22 euros por página, ou uma cópia simples da denúncia mediante o pagamento do valor estipulado para fotocópias simples.
"Além de constituir prática ilegal, não é justo que se continue a verificar a omissão de entrega de comprovativo de denúncia, antes cobrando-se o valor tabelado para a emissão de certidões e declarações, que representa para o cidadão um custo desmesurado", defende a provedora.
A fim de esclarecer a falta de cumprimento do despacho ministerial, a provedora diz que entrou em contacto com a GNR e a PSP e que as respostas, nos dois casos, foram contrárias à recomendação feita há oito anos.
A Polícia de Segurança Pública, através do Comando Distrital de Aveiro, diz apenas que aquando da apresentação de uma denúncia, as ordens são para nunca entregar "cópia do auto, sendo apenas entregue comprovativo/declaração relativa à apresentação da mesma", exceto nos casos de violência doméstica.
Instruções contraditórias
A Guarda Nacional Republicana é mais esclarecedora. Admite que o despacho gerou dúvidas no seio do organismo e que, à época, foi dirigido um pedido de esclarecimento ao gabinete da ministra da Administração Interna sobre a matéria. Como resposta a este pedido, foram emitidas instruções no sentido de reverter o que havia sido anunciado e, assim, manter o procedimento anterior ao nível das taxas cobradas.
Tendo ficado o dito por não dito, e de modo a seguir as novas indicações, a norma foi difundida ao dispositivo da GNR, definindo que os queixosos têm sim direito aos comprovativos, mas devem ser informados dos custos devidos pelas fotocópias dos documentos que põem por escrito o conteúdo da sua queixa. Uma cobrança que, diz Maria Lúcia Amaral, "não é plenamente conforme ao teor" da recomendação posta em prática em 2015.
A provedora diz que estas queixas são reveladoras "de uma prática de má administração, em que de forma reiterada são lesados direitos dos administrados" e que fazem sobressair a injustiça das situações referidas, referindo que falta uma harmonização de "procedimentos em ordem, pelo menos, a assegurar a previsibilidade da respetiva atuação".
Vai além e diz que se trata de uma injustiça "ainda mais inaceitável" tendo em conta que as denúncias ocorrem normalmente "no contexto de uma experiência de vida traumática" e que "a recusa pela Administração de entrega de comprovativo da sua apresentação é, pura e simplesmente, incompreensível aos olhos dos cidadãos, gerando indignação".
O documento contempla mais duas recomendações referentes ao "valor da taxa a cobrar pela emissão de certidões, declarações ou fotocópias de participações de acidentes de viação" e ao "sentimento de injustiça manifestado pelos próprios funcionários relativamente à cobrança de taxas por declarações funcionais para efeitos de concurso".
A provedora Maria Lúcia Amaral deu ao ministro José Luís Carneiro um prazo de 60 dias para assumir uma posição relativa a esta recomendação.