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Geringonça desdramatiza demissão de perita fiscal

Glória Teixeira abandonou o grupo da fiscalidade por terem sido ignoradas iniciativas de combate ao planeamento das grandes empresas. O BE garante que vai insistir nas propostas. Já o PS não quer medidas unilaterais que afugentem o investimento e lembra que a política fiscal não se esgota no Orçamento.

Miguel Baltazar
20 de Outubro de 2016 às 20:59
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Com tranquilidade, Bloco de Esquerda e PS vêem na demissão da fiscalista Glória Teixeira "a reacção natural" de alguém que se sente frustrado pela rejeição das suas propostas - a perita convidada pelo BE contribuiu com um conjunto de medidas de combate ao planeamento fiscal agressivo em sede de IRC que não tiveram eco no Orçamento do Estado para 2017. Mas se os bloquistas garantem que vão continuar a insistir nestas sugestões, que perfilharam, do lado dos socialistas rejeitam-se "medidas unilaterais que correm o risco de afugentar o investimento do País".

Esta quarta-feira, através de um email, a fiscalista do Norte dirigiu-se a Catarina Martins para lhe agradecer o convite feito em Março e pôr um ponto final na sua colaboração no grupo sobre a fiscalidade, uma experiência de seis meses, da qual guarda "a falta de transparência do Governo no âmbito do processo legislativo em Portugal".

O Governo não estava vinculado às conclusões do grupo de trabalho, mas a proposta de Orçamento do Estado não só não reflectiu muito do que chegou a ser discutido, como trouxe inovações (como a manutenção da sobretaxa) e, "adicional ao IMI" à parte, acabou por revelar-se globalmente favorável às empresas.

O sector financeiro, por exemplo, recebe um grande balão de oxigénio, quer por via da possibilidade de dedução dos juros de novos instrumentos de dívida que vão ser emitidos para reforço do capital, quer através de incentivos ao aumento de capital, quer através da flexibilização da dedução dos prejuízos fiscais (que aproveitam todas as empresas). Tudo medidas que encontram pouco contrapeso ao nível da prevenção da erosão da base tributável das empresas - pelo menos directamente no OE.
cotacao As propostas da professora Glória Teixeira são as nossas propostas. (...) Apesar de o Governo não as ter aceite, no Bloco não vamos desistir delas, continuaremos a apresentá-las no futuro. Mariana Mortágua, deputada do BE 

Contactado, o ministério das Finanças não teceu comentários às acusações deixadas pela professora universitária, mas entre socialistas que não quiseram identificar-se porque "não vale a pena alimentar uma coisa que não tem grande fundamento", rejeita-se a ideia de que o Governo possa estar a ser titubeante no combate à fraude e evasão fiscal das grandes empresas: a "forma liderante" como foi feita a transposição da directiva sobre a troca automática de informações, o "country-by-country reporting", e a directiva sobre a prevenção e branqueamento de capitais", que está a ser ultimada, são dados como exemplos dessa vontade.

Mariana Mortágua, do BE, também desdramatiza o incidente, que não terá beliscado as relações entre o partido e a professora universitária. "Compreendemos que, para a professora Glória Teixeira, o processo tenha sido frustrante, pelo facto de as suas propostas não terem sido acolhidas. Mas as propostas da professora Glória Teixeira são as nossas propostas", diz a deputada, para garantir que, "apesar de o Governo não as ter aceite, no Bloco não vamos desistir delas, continuaremos a apresentá-las no futuro".

E para o futuro há ainda um longo caderno de encargos para cumprir. BE, PS e Governo deverão dar continuidade aos encontros para procederem à revisão dos benefícios fiscais, no Parlamento está constituído um grupo de trabalho para analisar medidas de "combate à criminalidade económica, financeira e fiscal" e as Finanças estão a trabalhar num novo plano de combate à fraude. "A política fiscal não se esgota no Orçamento do Estado", lembra-se do lado do PS, embora a linha vermelha esteja traçada: propostas isoladas do contexto europeu, que fragilizem a capacidade de atracção de investimento, ficam de fora.
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