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PRR é uma "oportunidade perdida" para a transição digital na UE, diz TCE
Tribunal de Contas Europeu alerta que a falta de orientação estratégica tira potencial aos PRR na transição digital. Estados-membros avançaram com vasto leque de medidas digitais, mas que não concretizam qualquer mudança estrutural. "Bazuca" está a dar tiros pouco certeiros, avisa.
Os Planos de Recuperação e Resiliência (PRR) são "uma oportunidade perdida" para responder aos desafios da transição digital. O alerta é do Tribunal de Contas Europeu (TCE) e consta de um relatório divulgado esta quinta-feira, onde o auditor europeu avisa que a "falta de orientação estratégica" nas reformas e investimentos digitais inscritos nos PRR faz com que esses tenham um reduzido potencial.
A transição digital é um dos principais objetivos da "bazuca" europeia. Cada Estado-membro deve alocar, pelo menos, 20% do orçamento total dos PRR a reformas e investimentos na área da digitalização, o que faz do PRR o maior instrumento de financiamento da UE para apoiar esse objetivo (com quase 150 mil milhões de euros). Mas, segundo o TCE, é "uma oportunidade perdida para responder eficazmente às principais necessidades digitais dos Estados-membros".
O auditor europeu reconhece o esforço dos 27 Estados-membros em aplicam corretamente a etiquetagem digital nas reformas e investimentos contratualizados com a Comissão Europeia e nota que os países cumprem todos (e, em alguns casos, excedem) o limiar de 20% definido para ser alocado à transição digital, com base nas suas estimativas de custos. Mas esse financiamento "carece de orientação estratégica", adverte.
Essa falta de estratégia é explicada, segundo o TCE, pelo facto de os países não estarem obrigados a atribuir as verbas a medidas que respondam às principais necessidades digitais assinaladas em estudos anteriores. Por conseguinte, "alguns Estados-membros dedicaram menos financiamento do MRR [Mecanismo de Recuperação e Resiliência, onde estão incluídos os PRR] a domínios em que tinham um desempenho insuficiente, reduzindo assim o potencial do Mecanismo para contribuir eficazmente para a transição digital".
O TCE dá conta de que os regulamentos "não definem claramente" o que se entende por transição digital e essa ambiguidade levou os Estados-membros a proporem "um vasto leque" de medidas, que podem estar a conduzir a "bazuca" europeia a disparos pouco certeiros. Nesse sentido, o auditor europeu salienta que "investir apenas em medidas digitais não equivale necessariamente a um contributo para a transição digital".
Quanto à avaliação do impacto das reformas e investimentos adotados na transição digital, os indicadores usados são "demasiado genéricos", focando realizações imediatas, e não permitem aferir sobre o seu contributo para a estratégia digital da União Europeia (UE). Além disso, os indicadores não são comparáveis entre países.
Como os investimentos têm de estar concluídos até ao verão do próximo ano, a possibilidade de se realizarem projetos a longo prazo com outros países também "não foi aproveitada". Para a entidade liderada por Tony Murphy, esses projetos transfronteiriços seriam fundamentais para promover as tecnologias e capacidades digitais da UE, mas, como o período de execução do PRR é curto, é quase inviável adotar projetos tão complexos.
O TCE chama ainda a atenção para a existência de atrasos na execução das metas e marcos relativos à transição digital. No início de 2024, os países informaram que tinham atingido 31% dos objetivos na área digital, quando o plano inicial era chegar a 37%. Nas auditorias realizadas em cinco países da UE (Dinamarca, França, Itália, Luxemburgo e Roménia), o TCE concluiu que quase metade dos marcos e metas examinados estavam atrasados, porque alguns foram alterados, adiados ou substituídos.
"Consequentemente, o potencial do MRR para funcionar como força motriz da transição digital da UE poderá não ser plenamente aproveitado", conclui o TCE. "O financiamento da UE pode ser desembolsado na íntegra por marcos e metas que meçam realizações parciais ou intercalares, sem garantia de que os projetos subjacentes serão concluídos até ao fim do período de execução do MRR".
Portugal é o quarto país da UE que destina menos fundos do PRR para a transição digital, segundo as contas do TCE. Dos 22,2 mil milhões de euros do PRR, Portugal reservou 4,5 mil milhões para dar resposta a este desígnio europeu, o que corresponde a cerca de 21% do total. É de notar que estes valores foram entretanto alterados no âmbito da segunda reprogramação do PRR, com a ambição a aumentar na meta digital.
Entre os novos investimentos que vêm reforçar esta área estão a criação do "chatGPT português", a promoção da aplicação de inteligência artificial nas pequenas e médias empresas (PME), a disponibilização de plataforma de Educação Digital às escolas públicas, e o reforço dos apoios à Indústria 4.0, com vista a fomentar a investigação industrial, o desenvolvimento experimental e projetos de inovação e transformação digital das empresas.