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Foi você que pediu um excedente orçamental? Os argumentos a favor e contra

A proposta do Orçamento do Estado para 2020 prevê o primeiro excedente da história da democracia. Os 0,2% do PIB representam cerca de 500 milhões de euros que serão destinados a abater a dívida do Estado. No entanto, esta opção suscita críticas de quem entende que esse dinheiro deveria ser canalizado para o investimento e o reforço dos serviços públicos.

Miguel Baltazar
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 Prós 

Argumentos a favor de procurar um excedente orçamental

Esta é a tese do Governo, da direita política e de instituições internacionais como a Comissão Europeia ou o Fundo Monetário Internacional. Tem sido a tese dominante na condução da política orçamental europeia.

Aproveitar para baixar a dívida
Em setembro de 2019, a dívida pública portuguesa superava os 250 mil milhões de euros e representava 120,5% do PIB nacional, sensivelmente o dobro do limite imposto pelas regras europeias. O excedente orçamental serve para abater a este endividamento e fazer descolar o país do grupo dos super-endividados, como Itália e Grécia. As economias menos endividadas também são menos penalizadas pelos mercados em períodos de crise.


"Continuamos a ter níveis de endividamento dos mais elevados do mundo. Se não queremos estar vulneráveis a crises externas, temos de ter uma dívida menor."
Álvaro Santos Pereira
Diretor da OCDE para a área de estudos sobre os países

Credibilizar e reduzir os juros
Ao gerar excedentes orçamentais, a economia portuguesa mostra aos investidores que tem capacidade para pagar a dívida contraída. A credibilização da imagem externa ajuda a reduzir as taxas de juro para financiar o país, gerando poupanças que revertem para a economia e para financiar a despesa pública.

Gerar confiança a empresas e famílias
Ao registar excedentes orçamentais, empresas e famílias podem ficar mais confiantes no futuro e investir. Se as administrações públicas tiverem contas equilibradas, reduz-se o risco de regressar a políticas duras de austeridade, como cortes salariais ou de benefícios sociais atribuídos.

Despesa primária controlada
Segundo o OE 2020, a despesa primária das administrações públicas vai subir 4%. Não registar excedentes orçamentais significaria uma despesa primária (ou seja, excluindo o pagamento de juros) a subir mais depressa, na casa dos 5% ou 6%, o que daria uma imagem de descontrolo das contas.

Ganhar margem para ter défice
Ao atingir uma posição superavitária, e assumindo que esta é estrutural, o país pode deixar os chamados "estabilizadores automáticos" funcionar em períodos de conjuntura económica mais negativa. Ou seja, pode aumentar os gastos com subsídios de desemprego e não precisa de subir impostos para compensar o efeito de uma recessão nas contas públicas. Se as contas se deteriorarem em dois pontos percentuais do PIB, como em média sucede nas crises, o país continuaria a cumprir o limite de endividamento de 3%, imposto pelas regras europeias.


"É extremamente importante do ponto de vista internacional. (...) Significa deixarmos de ser um paíscom défices permanentes."

Manuela Arcanjo
Economista, ex-secretária de Estado da Saúde e do Orçamento


 Contras 

Argumentos contra o objetivo de ter excedente orçamental

Esta é a tese defendida maioritariamente pela esquerda, mas também, em alguns domínios, por economistas que se distinguiram em instituições internacionais "mainstream" - como Olivier Blanchard, ex-economista-chefe do FMI.

Reduz o espaço para o investimento
Há quem argumente que seriam possíveis escolhas alternativas, mas a realidade dos anos de consolidação orçamental tem sido a de restringir o investimento (o seu peso está abaixo da média europeia), reduzindo a despesa. Isto acontece porque o investimento é uma rubrica relativamente simples de cortar - reduzir os gastos com pessoal, por exemplo, é mais difícil. Os 500 milhões de euros de excedente seriam mais produtivos para a economia se fossem aplicados em investimento, do que a baixar marginalmente uma dívida gigante.


"O efeito credibilizador do excedente é um manifesto exagero. (...) Um saldo mais razoável poderia ter um efeito mais acomodatício no crescimento."

José Castro Caldas
Economista e investigador da Universidade de Coimbra

Financiamento agora é barato
Abater o endividamento num momento em que finaciá-lo é barato não faz sentido. O facto de ser o modo de financiamento mais barato deve ser aproveitado para prosseguir com projetos que, se forem executados pelo setor privado, ficam mais caros para as administrações públicas.

Não chega para sair dos holofotes
A dimensão atual da dívida pública é tal que reduzi-la marginalmente não chega para tirar o país dos holofotes dos mercados, no caso de uma crise internacional. A economia ficaria mais protegida se aproveitasse o momento para reforçar os serviços públicos, investir e tornar-se mais competitiva e resistente, para quando a crise chegar.


"Esta estratégia traduz a política do nunca é suficiente, do subir sempre as fasquias, só para cumprir uma meta nominal sem sentido algum."

Ricardo Cabral
Economista e professor na Universidade da Madeira

Os juros desceram pela política do BCE
A redução das taxas de juro exigidas pelos investidores para financiar Portugal não pode ser dissociada da política acomodatícia do Banco Central Europeu. A descida de juros face ao período da crise foi generalizada e há exemplos que mostram que é possível registar défices orçamentais e ter juros baixos, como é o caso de Espanha.

Prejudica os serviços públicos
A restrição financeira na despesa implica mais dificuldades na provisão dos serviços públicos, tanto no que diz respeito à quantidade, como à qualidade dos mesmos. O garrote aos gastos na Saúde gera pagamentos em atraso aos fornecedores, que prejudicam a racionalidade da gestão, e a contenção salarial na função pública prejudica a sua atratividade face ao setor privado.



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