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Bruxelas avisa que Portugal não está a usar juros nem dividendos para baixar a dívida

A Comissão avalia o Orçamento português como estando em risco de incumprimento. Tem um cenário macroeconómico optimista para 2019, demasiada despesa primária e um ajustamento orçamental curto em termos estruturais.

Reuters
21 de Novembro de 2018 às 13:32
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O Governo português não está a usar as folgas inesperadas que têm surgido nos orçamentos para acelerar a correcção da dívida pública. Antes pelo contrário, parece estar a usá-las para pagar falhas da receita e aumentos da despesa primária. A conclusão é da Comissão Europeia, no documento onde expõe a opinião sobre o Plano de Orçamento do Estado para 2019, submetido por Mário Centeno, ministro das Finanças, a Bruxelas.

"Os ganhos extraordinários resultantes de despesa mais baixa com juros, e de dividendos do Banco de Portugal e da Caixa Geral de Depósitos que se esperam mais elevados, não parecem estar a ser usados para acelerar a redução do rácio da dívida pública no PIB, mas antes para compensar reduções na receita fiscal e aumentos na despesa primária", lê-se no documento, publicado esta quarta-feira, 21 de Novembro, em Bruxelas.

Ao contrário do Governo português, a Comissão Europeia não considera que a redução da despesa com juros, ou o aumento dos dividendos recebidos do Banco de Portugal e da Caixa Geral de Depósitos, sejam medidas discricionárias. Ou seja, para Bruxelas estas medidas não dependem directamente da vontade política do Governo, daí serem consideradas como uma espécie de folgas que devem ser usadas para pagar a dívida, e não para compensar menos receita ou mais despesa primária. Esta era, aliás, uma das recomendações do Conselho Europeu, emitidas a 13 de Julho.

Também o Conselho das Finanças Públicas (CFP), na apreciação que fez da proposta de Orçamento do Estado para 2019, levantou reservas à classificação da redução dos gastos com juros como uma medida de acção política do Governo. A entidade dirigida por Teodora Cardoso frisou que os documentos do Executivo não têm informação que permita concluir que tais poupanças não são apenas uma consequência das condições de mercado.

Cenário macro optimista, despesa a mais e consolidação a menos
Na opinião sobre o Orçamento português, a Comissão Europeia enumera uma série de insuficiências dos planos de Mário Centeno. Afirma, lembrando a avaliação do CFP, que embora o cenário macroeconómico de 2018 pareça plausível, as projecções do ministro das Finanças para o próximo ano são "optimistas". A diferença é de quatro décimas: Bruxelas vê Portugal a crescer 1,8% em 2019, enquanto Centeno se compromete com 2,2%.

Como? Os peritos europeus explicam que a maior discrepância diz respeito às estimativas de investimento, em que o Governo nacional está bem mais confiante do que o Executivo europeu, que está mais cauteloso por causa do abrandamento da conjuntura externa.

Sobre as metas orçamentais em termos estruturais – as relevantes para Portugal, na medida em que está no braço preventivo do Pacto de Estabilidade e Crescimento – a Comissão diz preto no branco que "projecta um risco de desvio significativo do ajustamento exigido em direcção ao objectivo orçamental de médio prazo, tanto para 2018 como para 2019". 

Para este ano, o desvio no saldo estrutural é de 0,2% do PIB e na regra da despesa atinge os 1,4%. Para 2019, o desvio do saldo estrutural é de 0,4% e na despesa de 1,1%.

A Comissão avalia as medidas apresentadas por Centeno para 2019 como tendo um impacto de apenas 0,2% no défice estrutural, em vez dos 0,3% que o ministro diz que têm. E explica que as projecções de Outono da Comissão são ainda mais pessimistas, antevendo que o saldo estrutural ficará inalterado. É que em termos globais, Bruxelas espera mais despesas com pessoal e menos receitas, fruto do tal cenário macroeconómico mais prudente. Depois, o ajustamento cíclico será menor e a variação do impacto das medidas extraordinárias não será tão positiva, antecipam os peritos.

Além disso, Bruxelas soma que "não espera que Portugal faça progresso suficiente em direcção ao cumprimento do objectivo de redução da dívida em 2019". Conclusão: "Portugal fez progressos limitados na parte estrutural das recomendações orçamentais do Conselho, de 13 de Julho, contexto do Semestre Europeu" e por isso precisa de "acelerar esses progressos".

"A Comissão convida as autoridades a tomar as medidas necessárias no âmbito do processo orçamental para assegurar que o Orçamento do Estado de 2019 cumprirá as regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento e usará os ganhos extraordinários para acelerar a redução do rácio da dívida pública no PIB", frisa o documento.

O polícia bom, e o polícia mau

Apesar da opinião emitida pela Comissão ser genericamente negativa, Pierre Moscovici, comissário para os Assuntos Económicos e Financeiros, desvalorizou as divergências, durante a conferência de imprensa desta quarta-feira. O comissário reconheceu que há sempre discrepâncias nas projecções e sublinhou as conquistas que Portugal já obteve.

"As finanças públicas de Portugal melhoraram muito nos últimos anos", sublinhou Moscovici, argumentando que "as políticas certas produzem crescimentos económicos" e que os efeitos até "podem ser rápidos a materializar-se".

É que os avisos de Bruxelas têm sido recorrentes, sem que depois na realidade os desvios significativos se materializem. Até agora, os resultados da execução têm apresentado algum desvio face ao objectivo de correcção de 0,6 pontos percentuais do défice estrutural por ano, mas essa diferença tem sido inferior a 0,5 pontos, o limiar para ser considerada como significativa.
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