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PRR é um "almoço grátis" mas atenção que projeção é "benigna"

Na análise ao Programa de Estabilidade para 2021 a 2025, o Conselho das Finanças Públicas reconhece que o PRR é "um almoço grátis", mas avisa que a projeção de impacto macroeconómico é "benigna".

Nazaré da Costa Cabral, presidente do CFP, apresentou ontem as projeções para a economia em 2020-2024.
Mário Cruz/Lusa
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O Programa de Recuperação e Resiliência pode ser visto como um "almoço grátis", mas atenção que o impacto macroeconómico que está previsto pelo Governo é, de certa forma, "benigno". O aviso é do Conselho das Finanças Públicas (CFP), na Análise ao Programa de Estabilidade para 2021-2025, publicada esta quarta-feira.

"Parte-se do princípio de que a eficiência e a qualidade dos investimentos serão elevadas. Igualmente se considera que todos os fundos disponíveis serão devidamente absorvidos", explicam os peritos. "Estas são hipóteses que não estão garantidas à partida, e a experiência histórica, tanto no nosso país como em outras paragens, aponta para que se tenha de manter um máximo de rigor na seleção e no acompanhamento de todos os projetos que farão parte deste importante programa", alertam ainda.

Outro problema é que "a projeção dos impactos do PRR tem subjacente a ideia de que todos estes investimentos e despesas são adicionais àquelas que ocorreriam caso não existisse PRR. Também aqui
parece tratar-se de uma hipótese limite", frisa o CFP.

Porém, é "verdade que existe aqui, e no imediato, um aparente 'free lunch' orçamental – o financiamento comunitário da despesa permite um caráter expansionista à política orçamental sem que se incorra no custo habitual de aumento do défice e concomitantemente da dívida pública", reconhecem os técnicos.

No Programa de Estabilidade, o Governo calcula que o PRR permita aumentar o PIB potencial do país em mais de três pontos percentuais, ao longo de 20 anos. "A rendibilidade macroeconómica implícita neste investimento compósito afigura-se assim bastante elevada," comenta o CFP.

Riscos acumulam-se do lado da despesa

Além deste risco, o CFP lembra ainda que as despesas de capital podem vir a revelar-se bastante superiores ao que está agora previsto. Desde logo, a evolução pandémica ainda é incerta, bem como a recuperação económica, o que poderá ditar uma execução das garantias públicas superior aos 70 milhões de euros considerados pelo Governo até 2025.

Depois, há "responsabilidades implícitas nas moratórias, bem como responsabilidades relacionadas com ações arbitrais submetidas por concessionárias e subconcessionárias no âmbito de projetos de Parcerias Público-Privadas (PPP)," lembra o documento. 

A isto, haverá que ter em conta que o Executivo está a presumir que, até 2025, o Novo Banco deixará por utilizar 484 milhões de euros que estariam disponíveis no âmbito do acordo de capitalização contingente. Também prevê que o apoio financeiro à TAP não implique mais transferências de capital a partir de 2023, "embora na apresentação do plano de reestruturação da companhia aérea o Governo tenha indicado que as respetivas necessidades de financiamento poderiam totalizar entre 3.414 e 3.725 milhões de euros até 2024", frisa ainda o CFP.

Política para lá de 2023 já é restritiva mas não chega para cumprir metas

Outro ponto frisado pelo Conselho das Finanças Públicas diz respeito ao cumprimento das regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC). Apesar de o Governo prever uma política orçamental "restritiva" de 2023 em diante, isso não chegará para cumprir as regras orçamentais europeias, tal como estão definidas neste momento. 

Os peritos em contas explicam que admitindo que as regras do PEC regressam em 2023, esse será o único ano em que o caminho desenhado pelo Executivo para as contas públicas está de acordo com os limites previstos.

O problema não está no limite para o défice orçamental de 3% em percentagem do PIB, mas sim no ajustamento em termos estruturais que o Governo projeta para as finanças públicas – ou seja, na correção dos desequilíbrios de forma sustentada e não apenas conjuntural ou à boleia de medidas extraordinárias.

"A variação do saldo estrutural sinaliza o risco de desvio anual face à trajetória de ajustamento de 0,3 pontos percentuais e 0,2 pontos percentuais em 2024 e 2025, respetivamente, ficando muito próximo da qualificação como risco de desvio significativo, quando considerada a média dos desvios calculada para aqueles anos", alerta o CFP, no relatório.

Apesar desta conclusão, o organismo liderado por Nazaré da Costa Cabral reconhece que depois de uma política de caráter expansionista, e contracíclica, aplicada em 2020 e 2021, a partir de 2023 a política orçamental torna-se "restritiva" e novamente contracíclica, ainda que de forma "ténue". A restritividade das medidas de política do Governo fica patente na projeção de uma variação média do saldo primário na ordem dos 0,3 pontos percentuais, adianta a instituição.

Já no que diz respeito à dívida, o CFP diz que a sua evolução entre 2023 e 2025 é compatível com os critérios definidos neste momento nas regras. As regras comunitárias pedem um ajustamento anual de pelo menos um vinte avos do excesso da dívida face ao PIB, tendo como referência o limite de 60%. Em 2020 a dívida pública portuguesa ficou em 133,6% do PIB e o Governo espera que em 2021 esteja em 128%. Em 2023, o primeiro ano em que as regras do PEC deverão voltar a aplicar-se – a menos que se consiga uma revisão até lá – o rácio da dívida estará ainda em 120,7%, mais de metade do limite.

Sobre as regras do PEC, o CFP lamenta que o debate para a sua revisão ainda não beneficie de uma proposta nem da Comissão Europeia, nem de Portugal, enquanto país que preside neste momento à União Europeia, e pede para ser ouvido.
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