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Constitucional alemão recusa julgar programa que salvou o euro

Tribunal alemão mostra-se crítico mas diz que não tem competências

Bloomberg
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O Tribunal Constitucional da Alemanha considera muito provável que o programa de compra ilimitada de obrigações soberanas por parte do Banco Central Europeu (BCE) "exceda" o mandato concedido pelos tratados europeus à autoridade monetária, mas remeteu a apreciação definitiva para as mãos do Tribunal Europeu de Justiça, sediado no Luxemburgo.

Conhecido pela sigla OMT (Transacções Monetárias Definitivas), o programa do BCE nunca foi usado - e, idealmente, nunca será. O seu mero anúncio no Verão de 2012, depois de Mario Draghi ter prometido que o BCE faria o que for preciso para preservar o euro, terá, no entanto, sido decisivo para quebrar a espiral da crise da dívida soberana que ameaçava a sobrevivência da união monetária europeia.

Na análise dos juízes "há razões importantes para assumir [que este programa] excede o mandato de política monetária do Banco Central Europeu e isso infringe os poderes dos Estados-membros e viola a proibição de financiamento monetário dos orçamentos (nacionais)", refere o comunicado emitido pelo Tribunal Constitucional alemão.

O Tribunal de Karslruhe admite, ainda assim, que se for feita uma "interpretação restritiva" do programa este pode encaixar-se no mandato do BCE. A decisão não foi unanime, com seis votos a favor e dois contra.

O Tribunal Constitucional revelou ainda, segundo a Reuters, que deverá pronunciar-se sobre a conformidade do mecanismo permanente de resgate, o Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE), no dia 18 de Março.

"O BCE toma nota do anúncio feito pelo Tribunal Constitucional da Alemanha", mas, "reitera que o programa OMT enquadra-se no seu mandato", de acordo com uma nota enviada às redacções.

O jornal "Guardian" adianta que esta é a primeira vez que o Tribunal Constitucional alemão decide enviar um processo para o Tribunal Europeu.

Em norma, os juizes europeus demoram 18 meses a produzir sentenças. Isso quer dizer que o governo português terá de decidir (eventualmente em Abril/Maio) se pede ou não um programa cautelar à Europa para o pós-troika sem que a incerteza sobre a legalidade do OMT esteja dissipada. Na versão mais robusta, o cautelar pode envolver, como segunda linha de apoio, compras de dívida pública por parte do BCE.

Na sequência de inúmeras queixas, o Constitucional alemão foi instado a esclarecer se, ao admitir comprar dívida pública no mercado secundário em "quantidades ilimitadas" de países do euro em dificuldades, o BCE não estará a abrir a porta a uma eventual transferência de recursos entre os países do euro, capaz de condicionar os impostos que os contribuintes alemães terão de pagar e, logo, invadindo uma competência exclusiva do parlamento germânico.

O ministro alemão das Finanças Wolfgang Schäuble, e a chanceler Angela Merkel têm defendido a legalidade do programa, contrariando a opinião do banco central alemão que, no seio do BCE, votou isolado contra o OMT.

 

Opositores dizem que OMT fica suspenso

A decisão do Tribunal Constitucional alemão desapontou críticos do programa de compra de dívida pelo BCE: "Assim, na prática, o tribunal Constitucional abdicou [do seu poder]. No futuro em questões relacionadas com o euro ou com temas europeus ninguém precisa de recorrer ao Constitucional, pois as questões serão remetidas para o Tribunal Europeu de Justiça", afirmou na sexta-feira ao "Frankfurter Allgemeine Zeitung" Joachim Starbatty, um conhecido professor de economia alemão e candidato pelo partido eurocéptico Alternativa para a Alemanha. Ainda assim, os críticos do OMT conseguem pequenas vitórias, como defendeu Hans-Werner Sinn, outro professor alemão e presidente do influente instituto Ifo: por um lado, as críticas que os juízes de Karlsruhe fizeram irão animar o debate no país e dar força aos que criticam a compra de dívida; e por outro, enquanto o Tribunal Europeu não decidir, o BCE fica limitado na aplicação do OMT.

 
O programa do BCE em cinco passos

1. Condicionalidade

Ao contrário do primeiro programa de compra de dívida pública, onde o BCE gastou mais de 200 mil milhões de euros a tentar, sem grande êxito, baixar os juros, designadamente de Espanha e de Itália (ainda no tempo de Berlusconi), o novo programa, OMT, vai exigir que os países beneficiários se submetam a uma condicionalidade “rigorosa e eficaz”, o que os forçará a fazer previamente um pedido formal de ajuda aos seus parceiros.

 

Essa condicionalidade será negociada para aceder aos fundos de resgate do Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE) que estará sempre envolvido na primeira linha de qualquer modalidade de apoio a um Estado do euro. No caso eventual de Portugal querer beneficiar do apoio do BCE no pós-troika, teria de negociar com a Europa um programa cautelar, na sua versão de condicionalidade mais robusta.

 

2. Âmbito de intervenção

As compras de dívida serão executadas no mercado secundário (onde os privados trocam de mãos os títulos emitidos pelos Estados no mercado primário). As compras serão “ilimitadas”, no sentido em que o BCE não definirá ex-ante um limite quantitativo, e incidirão sobre os títulos de mais curto prazo, entre um e três anos.

 

3. Estatuto de credor

Para as obrigações compradas ao abrigo do OMT, o BCE renuncia à sua condição de credor privilegiado, colocando-se em igualdade de circunstâncias ("pari passu") com os com os demais investidores em caso de incumprimento. Nas intervenções anteriores o BCE surge a seguir ao FMI, que é o credor sénior por excelência (é sempre o primeiro a ser ressarcido em caso de incumprimento). O BCE clarificará este estatuto excepcional num acto jurídico específico.

 

4. Inflação

Todas as compras de dívida pública serão “integralmente esterilizadas”. Isso quer dizer que o BCE oferecerá depósitos ou títulos aos bancos para remover a liquidez injectada nos mercados com a compra das obrigações soberanas, neutralizando pressões inflacionistas – grande temor, sobretudo, dos alemães.

 

5. Comunicação

Os valores de mercado das OMT serão publicados semanalmente. Mensalmente, o BCE fará um reporte mais detalhado, explicitando quanto gastou em dívida de que países.

 

 

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