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Berlim quer usar 15 mil milhões a fundo perdido da UE para não contrair mais dívida
O governo alemão pretende usar os 15,2 mil milhões de euros de dinheiro a fundo perdido que deverá receber da UE nos próximos dois anos para evitar agravar o respetivo endividamento público. Berlim havia suspendido regra de défice zero para se endividar e reagir à crise pandémica.
A Alemanha não vai aproveitar as subvenções a fundo perdido que receberá de Bruxelas para realizar investimento público capaz de promover o crescimento económico, antes para evitar contrair mais dívida e financiar, ainda que parcialmente, as medidas de resposta aos efeitos recessivos da crise da covid-19 já em curso.
De acordo com a Bloomberg, que cita fontes conhecedoras das discussões no seio do governo alemão, a coligação liderada pela chanceler Angela Merkel decidiu usar a parcela de 15,2 mil milhões de euros a fundo perdido a que tem direito no âmbito do plano de recuperação da União Europeia para financiar o plano de estímulos já implementado assim como a transição para uma economia descarbonizada.
A única medida ainda não implementada e que será financiada por verbas das subvenções diz respeito a uma iniciativa governamental de 500 milhões de euros para equipar as escolas com novos computadores portáteis, anunciou o governo germânico na quarta-feira.
A intenção de Berlim passa por manter a dívida pública germânica controlada ao longo de 2021 e 2022, os dois anos em que os meios do Fundo de Recuperação da EU (Próxima Geração UE) vão ser libertados. De acordo com um documento do parlamento germânico a que aquela agência noticiosa teve acesso, a Alemanha espera receber 15,2 mil milhões de euros em subvenções nos próximos dois anos. Neste período, Portugal deverá receber 9,1 mil milhões de euros a fundo perdido.
Note-se que 30% dos apoios a fundo perdido a que os Estados-membros terão direito serão apenas alocados em 2023 em função do desempenho das respetivas economias nos dois anos anteriores. Se aprovado tal como pelo Parlamento Europeu, o Próxima Geração EU garantirá a distribuição de 390 milhões de euros a fundo perdido e de 360 mil milhões via empréstimos com baixas taxas de juro.
No entanto, o montante que Berlim receberá sem custos associados permite apenas pagar uma parte dos apoios já injetados na economia. É que para responder às consequências económicas da crise pandémica, Berlim já colocou no terreno um programa de relançamento no valor de 1,2 biliões de euros.
Suspensão da regra dourada é mesmo extraordinária
Em março, o executivo germânico surpreendeu com a decisão de suspender a chamada regra de ouro, prevista na Constituição, que obriga à prossecução de défices nulos e vigora desde 2011, e que pode ser suspensa mediante a ativação de uma cláusula que admite o seu incumprimento perante choques económicos extraordinários.
O anúncio foi feito na sequência da aprovação de um orçamento suplementar de 156 mil milhões de euros a ser financiado pela emissão de nova dívida pública, a qual constituía uma violação da regra dos défices zero. Nessa mesma altura, a agência responsável pela gestão da dívida germânica adiantou que entre abril e junho haveria um aumento de 32,5 mil milhões de euros na emissão de títulos de dívida soberana.
O acordo entre a aliança conservadora CDU/CSU e SPD mostra como essa suspensão terá mesmo um caráter provisório, pois já a partir do próximo ano o governo federal pretende regressar a uma política orçamental disciplinada.
Esta decisão surge também numa altura em que a economia alemã parece dar sinais de que poderá recuperar mais rapidamente do que inicialmente previsto, como aliás salientou já esta semana o ministro alemão das Finanças e líder do SPD, Olaf Scholz.
As estimativas oficiais do governo de Merkel apontam para uma contração do PIB de 6,3% em 2020 e um crescimento de 5,2% em 2021. Contudo, a imprensa alemã refere que as projeções de Berlim poderão ser revistas em alta já em setembro.
Uma das medidas já em vigor cujos e cujos custos serão cobertos pelos dinheiros a fundo perdido oriundos de Bruxelas diz respeito ao layoff simplificado (Kurzabeit).
Na reunião do governo realizada na passada terça-feira, e que se prolongou durante cerca de oito horas, o executivo decidiu prolongar este regime por mais um ano, até ao final de 2021.