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Ana Paula Zacarias: Europa tem uma constipação e não uma pneumonia
A secretária de Estado dos Assuntos Europeus, Ana Paula Zacarias, desvalorizou na segunda-feira a crise na União Europeia, que disse sofrer apenas de uma constipação e não de uma pneumonia.
"A Europa tem uma pneumonia? Acho que não. A Europa tem uma constipação", diagnosticou a secretária de Estado, num debate sobre a ideia da cidadania europeia, segunda-feira à noite, no Museu de Serralves, no Porto.
Os participantes discutiam a opinião que os europeus têm acerca do projecto comunitário europeu e sobre a forma como o programa de intercâmbio estudantil Erasmus contribui para essa formação de opinião.
"Temos a sensação de que os cidadãos se afastam", desabafou Ana Paula Zacarias, considerando que esse afastamento ajuda a reforçar a ideia de uma crise de identidade.
Ainda assim, acrescentou a secretária de Estado, não há razão para alarme, porque também há, entre os europeus, um sentimento de unidade e de pertença: "Ouço muitas queixas, mas também sinto que as pessoas se sentem parte de uma ideia e de um projecto que se vai construindo".
O debate centrou-se na "utopia democrática", no âmbito do ciclo de conferências Utopias Europeias, organizado pela Fundação de Serralves, com esta sessão a ser co-organizada pela secretaria de Estado dos Assuntos Europeus.
O moderador do debate, Carlos Jalali, Professor de Ciência Política na Universidade de Aveiro, situou o problema no conceito de "dissenso constringente" -- uma variável que está a obrigar a repensar a União Europeia, pelas dificuldades que suscita.
Por isso, a questão é saber como mobilizar a participação dos europeus, indicava Jalali.
"A ideia é falar com as pessoas. Não só explicar. Sobretudo, ouvir", disse a secretária de Estado dos Assuntos Europeus, referindo-se ao esforço que várias organizações têm feito para melhor fazer passar a mensagem comunitária.
"Chegámos a todos? Provavelmente, chegámos apenas a pessoas informadas e interessadas", concluiu Ana Paula Zacarias.
"Passámos por uma crise financeira internacional que deixou feridas", disse, procurando justificações para a falta de confiança no projecto político europeu.
Niccolo Milanese, fundador do movimento "European Alternatives" ("Alternativas Europeias") e co-autor do livro "Cidadãos de lado nenhum: como salvar a Europa dela própria", interrogou-se sobre se existirá um vazio no projecto político europeu, deixado por essa crise, que possa ser preenchido pelos cidadãos.
"A Europa é ambígua. O mito da Europa sempre foi ambíguo", afirmou Niccolo Milanese, remetendo a reflexão da utopia para o plano da sua realização.
"A Europa está sempre em risco de uma crise, mas sempre a oferecer esperança", explicou Milanese, argumentando que a actual crise de identidade não deve ser explorada por aqueles "que gostam de manipular medos", referindo-se aos movimentos extremistas e populistas.
A discussão foi comentada por um painel de três jovens que, em comum, tinham o facto de terem experimentado o programa Erasmus (um projecto de intercâmbio de alunos universitários europeus) e que procuraram enquadrar o tema na vertente de uma perspectiva não nacional, mas europeia.
Gonçalo Europeu, Professor Convidado na Católica Porto Business School, trouxe para a discussão a questão da "tecnocracia" imbuída no projecto europeu, que pode travar a participação dos europeus.
Catarina Neves, estudante de Relações Internacionais na Faculdade de Letras do Porto, que fez dois Erasmus, disse que a ideia de Europa é mais fácil de entender quando se viaja pelo Continente e se percebem os traços comuns que unem os cidadãos europeus.
José Santana Pereira, Professor de Ciência Política no ISCTE, usando a sua experiência, apresentou a ideia de que o contacto com pessoas de outros países europeus deve ser enquadrado, para não ser afectado por preconceitos.
Mas então, havendo tantos jovens a experimentar o programa Erasmus, porque não há mais participação? "Porque o sistema em que o programa está envolvido sofre do mal de estar contaminado para impedir a reflexão crítica sobre a Europa", concluiu Niccolo Milanese.