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ASAE sem sinais de "pré-aumento" de preços nas vésperas do fim do IVA zero

Inspetor-geral da ASAE diz que não foram detetadas situações de subida prévia dos preços dos produtos alimentares em resposta aos receios de deputados sobre potenciais aproveitamentos do grande retalho alimentar às portas do fim do IVA zero.

Paulo Novais / Lusa
Diana do Mar dianamar@negocios.pt 03 de Janeiro de 2024 às 13:15

O inspetor-geral da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) afirmou não existirem sinais de "pré-aumento de preços"  nas vésperas do fim da isenção do IVA num cabaz de 46 produtos alimentares, uma medida que levou a uma "diminuição efetiva" dos bens e que termina já esta quinta-feira, dia 4 de janeiro.

"Não temos informação sobre o que se vai passar, mas iremos continuar a nossa monitorização", garantiu Luís Lourenço, adiantando que "num último esforço esta semana" verificou-se que "as situações estão estabilizadas" e descartou um potencial cenário de "pré-aumento de preços". "Não foi o caso", sustentou, depois de questionando sobre um eventual aproveitamento das grandes superfícies comerciais à boleia da mudança no IVA, durante uma audição na Comissão de Economia, Obras Públicas, Planeamento e Habitação, na Assembleia da República, a requerimento do PSD.

"Esperamos que tudo corra pelo melhor nesta transição do IVA", reforçou, lembrando que "os preços são livres" e que "a sua aplicação não está balizada em termos legais", mas mostrando-se "confiante de que as associações representativas dos setores vão continuar a manter os compromissos assumidos".

A isenção temporária do IVA entrou em vigor em 18 de abril, após um acordo do Governo com a Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED) e a Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP).

Este pacote foi desenhado para seis meses de vigência da medida (de 18 de abril a 31 de outubro), mas o Governo decidiu, depois, prolongar a política por mais dois meses, até 31 de dezembro. Com efeito, acabaria por ser sensível aos argumentos dos retalhistas relativamente às dificuldades operacionais que implicaria a mudança no primeiro dia de 2024 e adiou a reposição do imposto para dia 5 de janeiro.

A medida "teve o seu efeito, com a redução de mais de 6% de acordo com a nossa monitorização", afirmou, em resposta aos deputados, reconhecendo que houve "variações" ao longo do tempo, que podem ser explicadas com "questões sazonais" ou de "escassez de produto decorrente do normal funcionamento do mercado", mas que foram "sempre abaixo dos 6%".

"Houve efetivamente uma diminuição real, uma vantagem económica para todos os consumidores", frisou, dando um exemplo em números: "Estamos a falar do valor de um cabaz que chegou a ter 15 euros por mês de diminuição na monitorização que fizemos", apontou, reconhecendo diferenças face a outras análises, como a da Deco Proteste, que, a seu ver, decorrem simplesmente da metodologia.

A monitorização por parte da ASAE foi acompanhada de fiscalização, como sublinhou Luís Lourenço, que assumiu a liderança da ASAE há dois meses, puxando dos números provisórios de 2023: "Em mais de 2.000 operadores económicos fiscalizados sobre esta matéria foram detetadas 174 situações de crime", o que resulta numa percentagem de sensivelmente 9%, uma média que "não está fora do normal".

Como noticiou o Negócios, até 31 de agosto, tinham sido instaurados 58 processos-crime por incumprimento na aplicação da isenção do IVA, com quase dois terços dos casos a versarem sobre o pequeno comércio.

Questionado por vários deputados sobre as mudanças na intervenção da ASAE antes, durante e depois do pacto para a estabilização dos preços alimentares, Luís Lourenço explicou que a principal teve a ver com o redirecionar de prioridades em face dos mesmos recursos (tanto em termos humanos como de meios). "Tendo esta medida sido crítica foi alterado mecanismo operacional para priorizá-la". Atualmente, atestou, a ASAE tem 485 trabalhadores, dos quais 240 inspetores, mas apenas 170 operacionais no terreno.

"O que fizemos com o pacto e faremos em 2024 será manter a fiscalização nesta matéria de forma a podermos continuar a detetar estas situações", disse, referindo-se em concreto às diferenças entre os preços afixados na prateleira e os cobrados na caixa.

A este respeito, aliás, Luís Lourenço sublinhou, em resposta aos deputados, que não cabe à ASAE verificar se essa diferença decorreu de um erro ou de má-fé do operador: "Não pode haver ninguém sem responsabiidade. O que é importante é ver o lado do consumidor que não pode ser prejudicado por isso".

O "número 1" da ASAE reconheceu, no entanto, que há dificuldades neste tipo de processos em identificar o culpado. "Quem é que colocou o preço na prateleira? Foi a pessoa coletiva ou o funcionário? A responsabilização da pessoa coletiva nem sempre é fácil de provar",  observou, apesar de realçar que "na maioria" dos casos as irregularidades "foram corrigidas pelos operadores económicos no momento em que foram detetadas", se bem que isso não trava o processo-crime.

Margens de lucro ilegítimo? "Não dá para transpor de forma direta para um Excel"

Relativamente a margens de lucro ilegítimo do grande retalho alimentar, após perguntas sobre a matéria, Luís Lourenço foi perentório ao afirmar que a só a definição desse termo é "bastante complexa".

"Não há uma forma que conheçamos de transpor isto para um quadro de Excel de forma direta", apontou argumentando que na equação para chegar às margens de comercialização e de lucro entram variáveis que vão transporte dos produtos ao custo do trabalhador. "Toda a cadeia tem um valor que é bastante complexo de ser definido em cada um dos momentos", ou seja, desde o prado até ao prato. "A nossa legislação, o decreto-lei 28/84, fala da intenção em obter lucro ilegítimo. É um conceito bastante subjetivo, cabe depois aos nossos profissionais desmontá-lo".

Neste âmbito, e depois de ter sido confrontado com o facto de o preço do azeite continuar a escalar, Luís Lourenço deu conta de este produto tem sido "um foco" da atuação recente da ASAE especialmente na vertente da qualidade, revelando que foram instaurados "20 processos-crime por fraude com mercadorias".

Esta audição decorreu na sequência de um requerimento do PSD que data de meados de 2023 e solicitava, em audição conjunta com os deputados da Comissão de Agricultura e da Alimentação, que além da ASAE fossem ouvidos representantes da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED), da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) e da Confagri (Confederação Nacional das Cooperativas Agrícolas e do Crédito Agrícola de Portugal).

O objetivo era perceber as causas da escalada nos preços dos bens alimentares acima da inflação média que ultrapassavam "largamente os aumentos verificados nos salários e colocando um enorme problema à maioria das famílias portuguesas" e "teimava em não abrandar" quando comparada com a evolução dos preços de outros bens de consumo, num altura marcada por uma espécie de "caça às bruxas" às razões por detrás das subidas.

Na abertura dos trabalhos, o presidente da Comissão de Economia, Obras Públicas, Planeamento e Habitação, na Assembleia da República, Afonso Oliveira, reconheceu precisamente que o requerimento foi apresentado "há bastante tempo", mas argumentou que "o tema é sempre atual". "Infelizmente", como concordaram outros deputados.

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