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Terá a Europa cometido um erro ao reabrir as suas fronteiras?

Terá sido tudo em vão? Com Espanha, França e Alemanha a registarem os números mais altos de casos do vírus, desde que emergiram do confinamento, o perigo de a Europa dar cabo da sua melhor hipótese de controlar o coronavírus cresce de dia para dia.

Espanha e Itália são os país europeus mais afetados pela epidemia de covid-19.
Juanjo Martin/EPA
30 de Agosto de 2020 às 14:00
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A esperança era a de que pudéssemos relaxar as restrições sociais e de viagens este verão porque as pessoas têm muito menos probabilidade de apanhar o vírus quando estão lá fora a aproveitar o tempo quente. As economias europeias dependem do turismo e não podiam suportar uma estação de restaurantes e esplanadas vazias. Companhias aéreas e hotéis colapsariam sem novas reservas, e implementaram novas medidas de higiene para tranquilizar os clientes. As pessoas estavam desesperadas para verem amigos e famílias, de novo.

O tiro saiu pela culatra, nesta experiência. Ainda nem chegámos ao final de agosto e os casos estão a aumentar na Europa ocidental, enquanto o sudeste europeu, que evitou o pior na onda inicial do vírus , está a enfrentá-la, também. A Alemanha recebeu aplausos pela sua gestão do surto da primavera, mas registou mais de 2.000 novos casos no sábado passado – o maior salto diário desde abril.

Um grande fator tem sido a retoma das viagens intra-europeias, incluindo pessoas que foram de férias ou visitar familiares e amigos. Quase 40% dos casos alemães recentes julga-se terem sido contraídos no estrangeiro, de acordo com o Instituto Robert Koch. Isto assemelha-se a Itália onde, quase um terço dos novos casos foram importados do exterior. Italianos que estavam a passar as suas férias na Sardenha também trouxeram o vírus de volta ao continente.

 

Também tem havido uma série de casos europeus ligados a festas. França – com mais de 7.000 novas infeções reportadas na sexta-feira – diz que esta é a maior fonte dos seus novos contágios. Não admira que o comissário europeu responsável pela pasta do comércio, Phil Hogan, se tenha demitido depois de ter estado presente num jantar com cerca de 80 convidados, infringindo as regras irlandesas.

 

A chanceler alemã Angela Merkel diz que a Europa deve evitar fechar as fronteiras novamente "a todo o custo". A liberdade de deslocação é central para o projeto europeu e o fecho das fronteiras contribuiu para um resultante colapso económico na primavera. No entanto, os políticos não podem ignorar o facto de as pessoas estarem a apanhar o vírus lá fora e a trazê-lo para casa.

 

Para aqueles que nunca viajaram para o estrangeiro, para os empresários domésticos que já sofreram ao longo de um confinamento que não causaram e para o pessoal médico que deverá tratar mais uma vaga de pacientes covid-19, estes eventos são especialmente frustrantes. A resposta é testagem muito mais rigorosa e monitorização dos viajantes que regressam e regras muito mais apertadas em relação a encontros sociais.

 

Felizmente, o número de novas hospitalizações e mortes é uma fração daquilo que foi na primavera porque há mais casos entre os jovens que experienciam ou sintomas ligeiros ou nenhum, de todo. A deteção de mais casos importados aponta para algumas melhorias na testagem. Com a época de viagens a chegar ao fim, o problema dos viajantes que regressam deve atenuar  ligeiramente.

 

Mas o dano económico provocado por este novo pico é já considerável. Os dados de serviços da tépida zona-euro e a decisão da Ryanair de reduzir a sua calendarização de voos para o outono sugere que os consumidores se estão a tornar mais cautelosos. A lista de países sujeitos a medidas de quarentena está a crescer.

 

Também há um risco de que as infeções comecem a espalhar-se dos jovens para os idosos e de que as escolas e creches sejam fechadas de novo – o pesadelo de qualquer pai e ministro das Finanças. Nas duas semanas desde que reabriram, mais de 40 escolas de Berlim já reportaram casos de vírus, forçando alunos e professores a fazer quarentena, de acordo com a Associated Press.

 

Merkel e o presidente francês Emmanuel Macron disseram que estão determinados em evitar novos confinamentos, mas precisam de controlar a situação. Há muito que os governos podem fazer sem voltarem a impor medidas draconianas. É vital que qualquer pessoa que chegue de uma zona de alto-risco seja testada. Na Alemanha, testes para os viajantes que regressam são grátis. No entanto, as autoridades de saúde locais nem sempre têm a capacidade de monitorizar os viajantes que estão de regresso para garantirem que foram testados ou que estão a cumprir a quarentena. Há relatos de atrasos de vários dias para obter resultados.

 

As infeções alemãs também aumentaram consideravelmente entre pais e crianças que regressaram do sudeste europeu. A tentativa da associação de turismo alemã DRV de culpar migrantes por isto e exonerar as agências de venda de pacotes de viagens foi rude e desnecessária. Destinos de férias populares também figuram proeminentemente na lista de casos importados.

 

Um aumento dos casos alemães relacionado com casamentos e festas privadas dificilmente surpreende, sendo que as regras junto de amigos e familiares variam tanto. Os estados federais podem definir as suas próprias orientações e algumas são demasiado permissivas: em Berlim, 500 pessoas podem juntar-se num espaço fechado. Em contraste, a Inglaterra restringe encontros privados a um máximo de 30 pessoas e o governo ameaçou multas de 10 000 libras para infrações. A Irlanda apertou as restrições para que apenas seis pessoas possam juntar-se num espaço fechado.

 

O ministro da Saúde alemão Jens Spahn tem razão ao dizer que se tivermos de escolher entre reabrir escolas ou organizar festas e marcar presença em carnavais, então, a escolha é óbvia. A Alemanha e outros países com infeções crescentes devem seguir o exemplo da Airbnb, que baniu festas nas suas propriedades e fixou o máximo de ocupação no limite de 16 pessoas.

 

A menos que a Europa acerte no básico, então os seus países podem ser forçados a implementar medidas ainda menos populares para proteger as suas populações, incluindo aconselhar os idosos a ficarem em casa e se manterem afastados de familiares mais jovens. Os meses de outono e inverno não vão ser fáceis, mas agir agora pode evitar sofrimento desnecessário.
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