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Riqueza: portugueses têm menos 30 mil euros do que os restantes europeus
No seu discurso nas cerimónias do 25 de Abril, o Presidente alertou para a necessidade de se produzir e repartir melhor a riqueza. Números oficiais mostram que a família portuguesa típica tem menos dinheiro do que as do resto da Europa e distribui-o de forma diferente.
Falar de Portugal e de riqueza é como estar preso no argumento do filme Dia da Marmota*. O país cresce pouco, cria pouca riqueza e é mau a distribuí-la. O diagnóstico é feito há muito tempo, mas o Presidente da República quer agora o tratamento. "Os dois anos e meio que faltam para o termo da legislatura parlamentar terão de ser de maior criação de riqueza e melhor distribuição", afirmou Marcelo na cerimónia comemorativa do 25 de Abril. Um desafio actual sobre um problema antigo e que novos dados do Banco Central Europeu (BCE) precisar de uma solução urgente.
Se descontarmos as dívidas que acumulou, o português típico tem menos 30 mil euros de riqueza do que um europeu. Estes dados do BCE revelam uma diferença de quase 30% face à mediana dos 19 países analisados pelo banco central, para o período 2013/2014.
Em Portugal, a recolha de dados coube ao Banco de Portugal (BdP) e do INE. A habitação ocupa um lugar central nas conclusões. A tradição de compra de casa – o principal activo detido pelas famílias portuguesas – é uma faca de dois gumes: por um lado, evita que a riqueza dos portugueses seja ainda mais baixa; por outro lado, como muitas das casas ainda estão a ser pagas, deixa as famílias portugueses no topo das mais endividadas.
As conclusões dos inquéritos do INE e BdP mostram que o português mediano tem 71 mil euros de riqueza líquida (valor já subtraído de dívidas). À primeira vista, pode parecer elevado. Afinal, quantas pessoas conhece com 70 mil euros no banco? Mas a riqueza não conta só com o dinheiro que temos, mas também com o valor dos nossos bens, em particular a casa.
"Quando se compara em termos internacionais, a riqueza da família típica situa-se cerca de 30% abaixo da área do euro. Mas noutros agregados económicos até estamos mais abaixo", explica Sónia Costa, economista do BdP e responsável pelo estudo sobre a realidade nacional, utilizando os dados destes inquéritos. "Na parte do património, conta muito as pessoas terem imóveis. Como em Portugal a percentagem de pessoas que tem imóveis é bastante elevada, apesar de a riqueza estar abaixo da média, talvez não se situe tão abaixo como o rendimento."
Casas, poucas jóias e muitos negócios
Não é só o nível de riqueza que muda. A forma como os portugueses a distribuem também é diferente. Olhando apenas para as posses materiais, nove em cada dez têm activos reais, como casas, carros, jóias ou riqueza de empresas em nome individual. Até aqui, é igual à Europa. As diferenças começam a aparecer quando se decompõe esse número.
Além do maior peso da casa onde vivem (quase 75% é proprietário vs. 61% nos restantes países analisados), também há mais portugueses com outras casas para além da habitação principal. Portugal destaca-se ainda ao nível das jóias e objectos valiosos. Neste caso, por não os ter: menos de um em cada dez portugueses possui esse tipo de bens, o que compara com um em cada dois europeus.
E quanto valem esses activos? O português típico tem uma riqueza real bruta – isto é, sem subtrair a dívida – próxima de 102 mil euros, longe dos quase 137 mil da média europeia. Ainda assim, abaixo de Portugal estão Estónia, Grécia, Letónia, Hungria, Polónia, Eslovénia, Eslováquia e… Alemanha. O posicionamento alemão é explicado, em parte, pelo facto de apenas 44% da população ser proprietária de casa.
Por outro lado, os negócios têm uma relevância maior na vida das famílias portuguesas: 49 mil euros da sua riqueza vem daí, enquanto na generalidade dos países analisados são apenas 30 mil. Estes activos dizem respeito a participações, que não sejam acções cotadas (essas estão na categoria financeira), em que um membro da família seja proprietário e tenha um papel na gestão ou trabalhe na empresa.
Pouco mais que depósitos
*Filme americano de 1993, com Bill Murray, em que o protagonista acorda todos os dias no mesmo dia. O título original, em inglês, é Groundhog Day. Na versão portuguesa foi traduzido por Feitiço do Tempo.