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Um convite para conhecer o mundo cristão

David Toscana desafia-nos a trocar as voltas à História e imaginarmos que a filha de Maria poderia ter sido uma mulher em vez de um homem. Uma hipótese estimulante.

13 de Maio de 2017 às 09:15
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David Toscana
Evangelha
Parsifal, 296 páginas, 2017

David Toscana, sólido escritor mexicano e autor de livros como "O Exército Iluminado", surge nestes tempos de profunda discussão religiosa com uma controversa pergunta: o que aconteceria se, em Belém, Maria tivesse dado à luz uma filha e não a criança que haveria de converter-se em Jesus Cristo?

Ou seja, reescrevendo a história, Toscana troca-nos as voltas: Maria dá à luz uma menina a que chama Emanuel, que irá crescer rebelde, algo que não é comum nas mulheres dessa época. Entretanto, sentado à direita do Pai, Jesus espera um ser corpóreo para ser proclamado filho de Deus. Esta é uma hipótese que fez cintilar a imaginação de Toscana, um leitor assíduo da Bíblia, uma obra que considera um clássico da literatura. Talvez devido a esse conhecimento profundo, decidiu trocar as voltas à história conhecida e colocar-lhe uma hipótese que, para muitos, poderá ser menos plausível. Ou mais.

Trata-se, claro, de uma ousadia, porque isso implica, de alguma maneira, "reescrever" um texto sagrado. Mas a ideia é apresentar uma história que poderia mudar a visão hegemónica no mundo católico. Trocar as personagens da história poderá não ser bem compreendido, mas aí está o risco que Toscana assume sem rodeios. Talvez por isso, a filha, Emanuel, surge como uma rebelde contra as lógicas de educação do seu tempo e a tradição. Exactamente porque não é possível ter uma Messias que se preste a seguir as regras estabelecidas pelas normas sociais. Há, claro, outro universo que se altera na novela de Toscana: os fariseus que questionam Jesus sobre questões relacionadas com a fé aqui têm de questionar a redentora sobre outros temas, incluindo a condição de mulher. E isso coloca-nos perante o supremo desafio: crucificar um homem não é exactamente a mesma coisa que crucificar uma mulher. E é aí que muitas coisas passam a divergir face ao que encontramos no Evangelho.

Toscana, lendo o livro, não busca aqui qualquer escândalo. Procura apenas colocar uma hipótese que nos pode fascinar, tal como nos motivar a reflectir sobre uma questão central da fé cristã. Há aqui uma lógica de diálogo com o texto bíblico que contribui para que possamos reflectir muito mais sobre tudo aquilo que vem na Bíblia e que, algumas vezes, não é objecto da discussão alargada que merecia como obra superior.

Questionar é aqui uma mais-valia. A própria ideia de Deus foi-se modificando ao longo dos tempos (a sua imagem dos Evangelhos é diferente da dos textos anteriores). Toscana coloca hipóteses: face aos 12 apóstolos, coloca apenas quatro na história de Emanuel. No fundo, esta aventura de Toscana é um convite para que se volte a ler a Bíblia e para que se encontre nela o mundo fantástico que acaba por propor. Este é um livro tentador, que nos conduz para o mundo do debate. E, sobretudo, desperta a curiosidade para olharmos de forma inteligente para o sedutor mundo que a Bíblia nos trouxe.

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