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Thomas Mann e a política na Europa do século XX

Aquele que foi talvez o mais famoso escritor alemão do século XX, Thomas Mann, deixa, neste livro, pistas muito estimulantes para se perceber a Alemanha no contexto europeu do último século.

24 de Dezembro de 2016 às 12:30
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Thomas Mann, "Um Percurso Político", Bertrand, 205 páginas, 2016


Em meados da década de 1950, encerra-se um ciclo na história da literatura alemã. Thomas Mann morre em 1955 e Bertolt Brecht e Gottfried Benn falecem no ano seguinte. Cada um escreveu na sua área, mas os três reflectem diferentes formas de olhar para a realidade alemã. Thomas Mann apostou na sua prosa de características quase ensaístas, diferente das fórmulas de dramaturgia e poesia dos outros dois. Mas todos eles apresentam reflexões sobre uma das idades do terror.

Mann, nascido em 1875, foi talvez o mais famoso escritor alemão do século XX, tendo ganho, em 1929, o Nobel da Literatura. "Morte em Veneza" é, muito provavelmente, o seu livro mais conhecido. Mas, além de um romancista poderoso, Mann nunca deixou de olhar para o que se passava à sua volta. Este "Um Percurso Político", que reúne uma série de ensaios da sua autoria que vão desde os tempos da I Guerra Mundial até ao seu exílio americano, acaba por mostrar o seu pensamento sobre o que ia acontecendo no mundo.

Não deixa de ser curiosa a forma como o autor olha para a Alemanha logo a seguir ao fim da II Guerra Mundial: "O conceito alemão de liberdade sempre foi exclusivamente voltado para fora, significando o direito de ser alemão, alemão e nada mais, nada além disso. (…) Porque razão terá a necessidade alemã de liberdade de terminar sempre em submissão? Por que motivo teve ela de terminar até sob a forma de atentado à liberdade de todos os outros e à sua própria liberdade? A verdade é que a Alemanha nunca soube o que é uma revolução e nunca aprendeu a relacionar o conceito de nação com o conceito de liberdade. O conceito de nação nasceu com a Revolução Francesa e é uma ideia revolucionária e liberal que envolve a noção de humanidade. De um ponto de vista da política interna, significa liberdade, de um ponto de vista da política externa, significa Europa".

São palavras que nos obrigam a reflectir sobre as transformações profundas a que Thomas Mann assistiu. Afinal, desde que escreveu "Os Buddenbrooks", com apenas 26 anos, Mann interessou-se pelas mudanças a que se assistiam na cultura europeia. "Morte em Veneza" e, depois, "A Montanha Mágica" tratavam também da decadência, fosse de um proeminente intelectual, fosse de toda a cultura europeia. O escritor viu o declínio da classe dominante, a burguesia do século XIX que não se conseguiu adaptar aos novos desafios do século seguinte. Essa decadência está bem patente nos seus livros.

Ao mesmo tempo, Mann sempre escreveu bastante para conseguir manter a sua coesão emocional. Este "Um Percurso político" envolve outros conceitos, até porque Mann, com o advento do nazismo, teve de procurar no exílio o seu espaço de liberdade. E nunca deixa de reflectir sobre a alma alemã, como o faz durante a I Guerra Mundial: "O nosso moralismo, porém, está entrelaçado, na nossa alma, com a nossa condição de soldados, sim, enquanto outras culturas até ao seu estrato mais apurado, ao nível da arte, evidenciam a tendência de assumir por inteiro a forma de ética civil, o militarismo alemão, em verdade, é a forma e a manifestação da moralidade alemã".

Palavras duras mas que servem para se perceber um pouco melhor a evolução da Alemanha durante o século XX. Este livro é uma excelente forma de percebermos um autor, o seu país e também a Europa durante o século XX.

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