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A outra Primeira Guerra Mundial

Niall Ferguson discorre sobre as causas e os efeitos do primeiro conflito mundial e diz que a entrada da Grã-Bretanha no conflito foi um erro. Terá sido?

24 de Março de 2018 às 17:00
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Niall Ferguson
O Horror da Guerra 1914-1918
Temas&Debates, 655 páginas, 2018

Niall Ferguson é um historiador que gosta de criar polémicas, umas mais sólidas do que outras, para promover as suas convicções. Isso é, há muito, o seu maior trunfo quando lança um livro ou uma série de televisão. A isso junta o seu alinhamento com o seu conservadorismo americano, onde as suas opiniões têm repercussão. Muito do seu trabalho roda à volta da história do Império Britânico, que pela sua riqueza permite boas investigações. Há alguns anos, num dos seus livros ele declarava: "O Império Britânico foi o maior Império de todos." Mais do que isso, o autor praticamente identificava o império onde o Sol nunca se punha com a civilização ocidental e aquilo que considera ser o seu papel civilizador em todo o mundo. Não admira por isso que Ferguson devotasse a Portugal, nessa obra, pouco mais do que umas linhas. Para ele o sucesso do Ocidente (a outra face da moeda "Grã-Bretanha") devia-se desde logo à competição das lideranças medievais que fez com que o desenvolvimento tecnológico tivesse mesmo superado o dos chineses. Esquecia as contribuições do mundo muçulmano para a ciência na Europa, a influência que Portugal e Espanha tiveram na futura hegemonia inglesa (e, de alguma maneira, os erros que fomentaram os mercados financeiros de Inglaterra e Holanda e que desviaram o dinheiro e a massa crítica da Península Ibérica). Esquecia a grande qualidade da medicina chinesa, hoje tão recuperada, e ignorava o poder económico chinês até ao século XVIII, esquecendo que depois do declínio dos Qing, os Ming levaram a cabo uma enorme extensão territorial. Afinal Ferguson olha quase sempre para o globo, utilizando apenas fontes ocidentais.

Agora Ferguson atira noutra direcção. Viaja até às origens da I Guerra Mundial e declara com contundência que a entrada da Grã-Bretanha no conflito foi o maior erro da história moderna. Para o historiador, Londres poderia ter convivido com a vitória alemã e deveria ter ficado fora da guerra. É um sinal dos tempos que ecoa o cada vez maior isolacionismo americano dos nossos dias (e, de alguma maneira, também o britânico pós-Brexit). A tese de Ferguson é de que não havendo uma ameaça imediata sobre a Grã-Bretanha esta deveria ter retardado qualquer intervenção, deixando os alemães dominar a Europa. Isto porque a intervenção pouco preparada levou a custos catastróficos.

Para Ferguson poderia ter actuado depois, como sucedeu contra Napoleão, quando a Grã-Bretanha só colocou forças no terreno mais tarde, durante a Guerra Peninsular. Enviar um exército formado rapidamente, sem preparação, levou no conflito entre 1914 e 1918 a colossais baixas. Para o autor, se a Alemanha tivesse derrotado França e a Rússia, teria de diversificar as suas forças e estaria mais fraca do que as forças britânicas quando esta quisesse intervir. Assim, segundo ele, a entrada no conflito levou ao fim do Império e a um Estado muito mais fraco com uma dívida pública brutal, que limitou a capacidade britânica até à II Guerra Mundial. Ferguson critica também os líderes da Europa e da Grã-Bretanha pelo desastre, tentando desmontar "mitos" sobre o conflito. Polémico, com boa análise financeira, parece às vezes construir a sua tese à volta de um argumento definido à partida.



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