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Virgolino Faneca a caminho do Parlamento se a senhora Domicília quiser

Virgolino Faneca prontifica-se a resolver o problema da senhora Domicília Costa que foi eleita deputada sem querer. O sacrifício é tanto que está disposto a ir para o Parlamento, tendo como referência Calisto de Barbuda.

10 de Outubro de 2015 às 13:00
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Cara senhora Domicília

Espero que esteja tudo bem com a sua saúde e a de todos os seus. Eu tenho andado com problemas nas cruzes e nos joanetes, mas como a senhora não me conhece de lado nenhum, deve ser para o lado que dorme melhor. Eu, em contrapartida, não durmo, porque a minha senhora ronca que se farta e o barulho colossal que gera dá-me uma incontrolável espertina. Por isso, lá vou cabisbaixo para o sofá da sala ver os programas de televendas, sonhando comprar os magníficos produtos que são promovidos. Por exemplo, uma espectacular vassoura eléctrica rectangular, uma assombrosa ferramenta de pregar quadros sem danificar as paredes, um estrondoso veneno de cobra, um creme com propriedades curativas, ou um grandioso robô que limpa vidros e azulejos.

Entendo que chegada a este ponto da leitura, a senhora dona Domicília ache que esta carta não faz sentido nenhum e que o seu autor é um refinado cretino. Contudo, peço-lhe encarecidamente que não se deixe levar pelas primeiras impressões. Além do mais porque esta carta tem o nobre propósito de a pretender aliviar de um pesado fardo.

Soube pelo Jornal de Notícias que a senhora Domicília Costa foi eleita deputada pelo Bloco de Esquerda e não contava com isso, tendo desabafado ao dito órgão de comunicação social: "Só me vai complicar a vida. Toda a gente me diz que tenho de ir para Lisboa. Não sei como me vou organizar." Não vá. Fique quietinha aí no Porto que tenho o remédio para a sua maleita. Eu, Virgolino Faneca, estou disposto a sacrificar-me e a ocupar, em sua vez, um lugar no Parlamento, mostrando o quanto sou altruísta. A única condição que coloco é ficar ao pé da Joana Mortágua e nas imediações do André Silva, o deputado eleito pelo partido Pessoas-Animais-Natureza, para podermos trocar impressões sobre os seres conscientes e sencientes ou a proibição da produção e comercialização de "foie gras".

Não! Não há na proposta que lhe faço qualquer oportunismo. Não! Não há na proposta que lhe faço qualquer tentativa de ter um tacho. Nada disso, senhora dona Domicília. Eu preocupo-me genuinamente com o próximo e até estou disposto a ceder-lhe um vinte avos do salário que vier a receber como deputado. Parafraseando Sérgio Godinho, eu dou conta do recado e para si é um sossego.

Além disso, comprometo-me a fazer um discurso por ano que a senhora pode escrever, porque eu, com toda a certeza vou ter o tempo todo preenchido por múltiplos afazeres, tais como: almoçar, conviver, jantar, conviver e, porventura, arranjar uma actividade remunerada extra como consultor, porque o custo de vida na capital é muito caro. E o facto de não ter sido eleito é uma minudência. Tenho um primo que é amigo de um rapaz que trabalha na reprografia do Parlamento, onde fazem os cartões de deputados, e ele diz que não custa nada trocar uma fotografia pela outra e que a marosca facilmente passa despercebida. No fundo, não se trata de uma fraude, mas sim de uma forma não-convencional de ajudar o próximo.

Resta-me acrescentar que sou da casta de Calisto Elói de Silos e Benevides de Barbuda, o deputado cujo perfil foi imortalizado por Camilo Castelo Branco em "A Queda do Anjo". Ou seja, sou austero e conservador, mas quero deixar de ser tudo isso se me der a oportunidade de ir para o Parlamento. E olhe que não serei o único.

Um abraço solidário deste seu

Virgolino Faneca


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Quem é Virgolino Faneca

Virgolino Faneca é filho de peixeiro (Faneca é alcunha e não apelido) e de uma mulher apaixonada pelos segredos da semiótica textual. Tem 48 anos e é licenciado em Filologia pela Universidade de Paris, pequena localidade no Texas, onde Wim Wenders filmou. É um "vasco pulidiano" assumido e baseia as suas análises no azedo sofisma: se é bom, não existe ou nunca deveria ter existido. Dele disse, embora sem o ler, Pacheco Pereira: "É dotado de um pensamento estruturante e uma só opinião sua vale mais do que a obra completa de Nuno Rogeiro". É presença constante nos "Prós e Contras" da RTP1. Fica na última fila para lhe ser mais fácil ir à rua fumar e meditar. Sobre o quê? Boa pergunta, a que nem o próprio sabe responder. Só sabe que os seus escritos vão mudar a política em Portugal. Provavelmente para o rés-do-chão esquerdo, onde vive a menina Clotilde, a sua grande paixão. O seu propósito é informar epistolarmente familiares, amigos, emigrantes, imigrantes, desconhecidos e extraterrestres, do que se passa em Portugal e no mundo. Coisa pouca, portanto.

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