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Desde que tudo corra bem

Os Satyricon cumprem-se onde nem todos ambicionam ir – em território de emoções hostis. São dois em estúdio, porque ao vivo carecem de mais para sobressaltar, e vão mostrar-se em Lisboa a 19 de Novembro. Enquanto não se encaminham, há disco novo para situar e passado para recapitular.

21 de Setembro de 2013 às 10:00
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Satyr é um norueguês de voz áspera que achou acordes diabólicos na guitarra. Frost partilha a potência nórdica, mas é na bateria que exerce o inferno. E são músicos melhores porque não são melhores um com o outro. "Parece-me saudável que nunca tenhamos sido especialmente chegados." Reflexões do primeiro a examinar como se combina com o segundo.

Em disco e em palco, Satyr e Frost são Satyricon – há filme de Fellini e narrativa de Petrónio que se evocam igual. Escrevem música há duas décadas e alcançam nas canções o que não estimulam profundamente fora delas – proximidade. "Há consideração e entendimento entre ambos, mas nunca fomos de sair juntos. Isto que há entre nós talvez fosse pior se o tivéssemos feito." Mais apreciações de Satyr, que revelou como dois que usufruem de temperamento espinhoso e frenesim imoderado se aguentam a compor canções duras. Porque é disto que se trata.

Eles iniciaram-se com música a arder em ruído e hostilidade, lacerada por sujidade e deformidades, mas sobretudo decidida a vociferar o que frequentemente subsiste silenciado – o que há de negro dentro dos que vivem. Foi em 94: um disco sobre dias umbrosos, que tinha "Dark Medieval Times" grafado na capa, vinha com sete temas para esconder nada. Não forçosamente para serem assimilados, estimados ou aconselhados, mas para evidenciar as sombras que se acham na gente inteira.

Jung falou disto: há obscuridade em todos. E falou mais: "desde que tudo corra bem", não é necessário conhecê-la. Os Satyricon não a ocultam, mas produziram uma forma de não correr bem sem correr mal – confeccionam canções extremas. E escorregadias, porque testam o quadro de vivências dos que as escutam – nuns gera catarse, noutros violência ou ambos ou nada (improvável) ou tudo (admissível). É o flanco ambíguo do black metal, que é onde os Satyricon se movimentam: é género que auxilia o corpo a desapertar tensões no sossego possível de quem ouve um disco, mas pode promover o que não deve se for baralhado com realidade – se é assim com a música toda, aparenta ser mais com esta. Mas há que ir lá, seja para lhe cuspir os procedimentos e condenar-lhe a misantropia ou para lhe consentir a provocação e contextualizar-lhe as sensações. Porque isto existe mesmo – ou se finge que não ou então percepciona-se que sim.

E depois há as canções – ainda que no black metal nunca as sejam unicamente, porque a ferocidade que palpitam ocasiona juízos além das circunscrições musicais. Os Satyricon têm 10 novas, atadas num disco homónimo que é dos álbuns salientes disto que é 2013. A brutalidade abrandou-se, a singularidade permanece: a efervescência black diluiu-se em rock, mas Satyr e Frost não retornaram afáveis. E não há que solicitá-los de outro jeito, desde que tudo corra bem.

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