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Bilhete de identidade Idade: 46Cargo: NTT Data Portugal, CEO (desde abril de 2020) - Everis (atual NTT Data Portugal, desde 2003)Formação: Engenharia Eletrotécnica e de Computadores, Instituto Superior Técnico
Acredito muito no modelo híbrido de trabalho. É uma conquista social.
As empresas estão a deixar a fase da experiência e a avançar para a integração da inteligência artificial (IA) nos processos, afirma Tiago Barroso, convidado das "Conversas com CEO", integradas na iniciativa Negócios Sustentabilidade 20|30, aqui editada e que pode ser ouvida na íntegra em podcast. Começou a liderar a NTT Data Portugal, onde trabalha há mais de duas décadas, exatamente na altura em que o país entrou em confinamento por causa da pandemia e é um defensor do trabalho híbrido que considera uma "conquista social". A forma como trabalham, o facto de estarem espalhados pelo país, a cultura de inclusão e o modelo da casa-mãe japonesa de distribuição de bónus em função de objetivos coletivos são as vantagens que identifica para atrair talento. Está convencido que os salários terão de aumentar e tem dúvidas que o IRS Jovem contribua para atrair ou reter talento. Sobre o problema energético, que se reforça com o uso da IA, mostra-se otimista, esperando que a investigação o resolva.É invulgar, hoje, encontrar quem tenha feito a sua carreira apenas numa empresa. O que o levou a escolher esse caminho?
São já 21 anos na mesma empresa. Nunca estabeleci isso como um objetivo, acabou por ser uma sucessão de oportunidades que me foram dadas e que fui agarrando. A meta que tive desde sempre foi ter muita ambição em superar-me, ultrapassar obstáculos, experimentar coisas. Concordo que é singular atualmente, mas não serei caso único. Representa sobretudo aquilo que é a aposta da empresa e que espero perpetuar e até acentuar no desenvolvimento dos colaboradores, criando oportunidades para que possam prosperar nas suas carreiras profissionais.
Houve algum momento que lhe tenha ficado especialmente na memória?
Tenho sempre muita dificuldade em responder a essas perguntas, porque sou muito focado no futuro. Mas assumir a posição de CEO quando foi decretado o primeiro confinamento obrigatório, creio que me marcou bastante.
O que faz a NTT Portugal? Consultora de negócios e tecnologia é um chapéu enorme
A nível global é uma das empresas líderes no mercado de consultoria e de serviços na área da tecnologia. Está presente em 50 países com sede no Japão e cotada na bolsa de Tóquio.
E ser japonesa nota-se na empresa?
Nota-se. A tomada de decisão, por exemplo, tem uma perspetiva de longo prazo a que nós, ocidentais, não estamos habituados. O nosso longo prazo serão 5 anos, na cultura japonesa são décadas. E isso nota-se na perspetiva estratégica com que se tomam as decisões. Mas é uma empresa global com um portefólio de serviços abrangente de apoio às organizações na sua transformação. Temos uma componente de infraestrutura tecnológica, muito assente na capacidade dos nossos ‘data centers’. Depois uma componente de serviços nas tecnologias de informação, que vão desde a gestão das infraestruturas tecnológicas e da ‘cloud’, passando por serviços de ‘data’ e inteligência artificial, de desenvolvimento de aplicações, de integração de softwares, de cibersegurança. Temos igualmente uma área de consultoria focada no conhecimento do negócio dos setores de atividade. E ainda uma componente de comunicação e criatividade, com a nossa agência que em Portugal trabalha sob a marca Tangity. Em Portugal, temos toda estas componentes de serviços, excetuando os ‘data centers’ que não existe nem está planeada nos próximos anos.
Os ‘data centers’ em Portugal não seriam mais eficientes por causa da energia renovável?
Talvez, mas há muitas variáveis que impactam essas decisões. A entidade a nível global cresceu por aquisição de empresas fora do Japão. E essa questão nunca se colocou.
Porque têm de estar presente em 15 cidades do país?
O talento em Portugal é de elevada qualidade e está disperso pelo país. Nós temos de ir ter com o talento.
Mas isso não significa mais custos para a empresa?
Não me parece que seja o ponto fundamental. O fundamental é estarmos próximos do talento e proporcionar uma carreira, numa grande empresa, a pessoas que querem desenvolver a sua vida fora das grandes cidades. Esta lógica de ter estes polos dispersos pelo país procura dar resposta às necessidades das pessoas e também às nossas necessidades.
Há cada vez mais CEO preocupados com o trabalho remoto e em atrair os colaboradores para o escritório. Essa preocupação não existe consigo?
Existe, mas acredito muito no modelo híbrido de trabalho. É uma conquista social, pelo menos na área de serviços. Quebrámos a lógica de termos todos que começar às nove da manhã e terminar às seis no mesmo sítio. O trabalho remoto permite conciliar a vida pessoal e profissional de uma forma que antes não conseguíamos. Em todo o caso, o trabalho presencial continua a ser fundamental para criar espírito de equipa, para o tornar mais eficiente, para os mais novos aprenderem com os mais velhos. Mas pode ser conjugado com o trabalho remoto.
E não deteta qualquer problema nesse modelo?
Deteto um desafio permanente de o manter válido, mas continua a ser um modelo produtivo. Durante a pandemia o facto de as pessoas estarem em casa aumentou claramente a produtividade. Houve uma altura em que tive de dizer a toda a gente que devíamos trabalhar todos um bocadinho menos. O ritmo de trabalho era excessivo. Hoje parece-me que é um modelo estabilizado e com níveis de produtividade, no nosso caso, iguais aos do passado.
Além de ir ao encontro do talento e do trabalho híbrido que outras estratégias têm para reter o talento em Portugal que é um problema do país?
Sim, é um problema do país reter o talento. A prazo teremos de ser mais competitivos nos salários em comparação com os restantes países da Europa.
Temos de aumentar os salários?
Tem vindo a acontecer e acho que será inevitável. Mas as pessoas não se movem só por dinheiro. Movem-se também pelo seu bem-estar, por uma cultura onde se sentem bem.
No nosso caso os objetivos individuais não existem, só existe o bem comum, o resultado global.
O que é que quer dizer cultura?Queremos ser uma empresa onde não há estereótipos, onde toda a gente se sente bem, onde a diversidade, de facto, é plural, onde quem tem determinados interesses se sente bem. Outro aspeto é ser modelo solidário e colaborativo que não será sempre assim no nosso mercado de consultoria e tecnologia. Por exemplo, todos os executivos têm um bónus no final do ano em função dos resultados e, na maior parte das empresas, de um determinado objetivo individual. No nosso caso os objetivos individuais não existem, só existe o bem comum, o resultado global. E nem sequer é o resultado em Portugal, é por sub-regiões que, no nosso caso, envolve pelo menos 14 a 15 países. O que traduz essa cultura de colaboração e de solidariedade para dentro, que depois transparece em pequenas atitudes. As pessoas vão reconhecendo essa forma de estar e sentem-se muito bem.
Quais é que são os desafios que identifica a cinco anos?
A questão da escala. Na NTT Data Portugal queremos ter um impacto no grupo NTT Data maior do que aquilo que podia perspetivar a dimensão do país. Temos de aumentar a quota de mercado. Para além disso temos de trabalhar para os nossos colegas de outras operações. Já fazemos isso, mas temos e queremos fazer muito mais. É a única forma de termos mais peso no grupo, para que as nossas pessoas possam ter mais perspetivas de carreira. Temos vindo a crescer muito nos últimos seis anos, mas também temos de trabalhar muito para as outras operações do grupo NTT Data.
Qual é a vossa vantagem competitiva em relação ao resto do mundo?
Em Portugal temos um talento acima da média e é isso que temos de explorar. E também pela capacidade de atrair talento de outros países. Se fizermos esse caminho contribuímos para o desenvolvimento do país e damos oportunidades de carreira às nossas pessoas.
O IRS Jovem até aos 35 anos pode reter ou atrair talento?
Tenho algumas dúvidas. Alguma coisa deveria ser feita para reter as pessoas. É fundamental que os jovens, quando saem das universidades em Portugal, possam ter mais perspetivas de vida do que aquelas que têm hoje. Se essa é a medida adequada ou não, tenho algumas dúvidas, mas também não sei propor outra e, portanto, esperarei para ver o resultado.
Que saltos se perspetivam ao nível da tecnologia?
Estamos a viver um momento especial e se calhar ainda não nos demos conta disso. Há um conjunto de tecnologias que convergiram do ponto de vista de grau de maturidade ao mesmo tempo, como a inteligência artificial, que é a primeira, mas há o 5G, a capacidade de processamento, uma série delas. Provavelmente estaremos num momento de disrupção, do ponto de vista social e económico.
E os vossos produtos já usam aquilo que designamos como inteligência artificial?
Prestamos imensos serviços que já têm inteligência artificial. Os nossos clientes passaram por uma fase de experimentação e nós também. Mas está a começar a emergir a fase da incorporação da IA nos processos, nas operações das organizações. Publicámos um estudo global sobre IA, dos maiores no mercado, em que entrevistámos 2.300 pessoas a nível global, decisores das maiores empresas. E mais de 90% consideram que agora têm de colocar a IA a funcionar, não podem só experimentar, porque senão correm o risco de ficar para trás.
Este é um setor que consome muita energia, agora ainda mais com a IA. Como estão a resolver este problema?
O consumo de energia pela inteligência artificial é um facto, deu um salto enorme. Estou convicto que a própria tecnologia, a investigação, ultrapassará esse problema. Nos nossos ‘data centers’ temos investigação em curso, já com provas dadas, de tornar mais eficiente a refrigeração, diminuindo assim o consumo energético. O nosso motor de inteligência artificial generativa focado na língua japonesa foi desenvolvido já com essa preocupação de consumir menos energia, tanto no treino como na execução. Comparado com outros motores apresenta níveis de consumo energético mais baixos. E a preocupação da NTT Data com a sustentabilidade não se resume à energia, seguramente um eixo fundamental. Um outro exemplo é o ‘gap’ de literacia digital, que pode acentuar desigualdades no mundo. Como outra preocupação da empresa é o uso da tecnologia de forma ética e com um propósito.
Como concretiza esse objetivo da literacia digital?
Fazemos um esforço enorme, em todos os países, de ter alguns contributos. Temos algumas ações, ‘pro bono’ de ensino a crianças carenciadas. Fizemos isso durante muitos anos no nosso escritório, interrompemos com a pandemia e agora estamos a estudar como voltar a fazer. E temos, há muito tempo, em Portugal, o programa ‘Mais Impacto’ em que oferecemos serviços a organizações do terceiro setor, para que possam fazer a sua transição digital.