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Descarbonizar a economia é salvar o futuro

Encarada como essencial para salvar o planeta, a descarbonização da economia é também uma oportunidade de negócio para os players que se posicionam do lado das energias renováveis e da eletrificação.

31 de Outubro de 2023 às 12:30
O debate “Descarbonizar o futuro” contou com a participação de Ana Júlia Pinto, António Motta Veiga, Emanuel Proença e Helder Pedro. A moderação foi da jornalista do Jornal de Negócios, Bárbara Silva.
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    A necessidade de descarbonizar o planeta está a levar a uma alteração acelerada na energia que alimenta toda a sociedade, de forma a abandonar os combustíveis fosseis para dar lugar às energias renováveis, trazendo consigo inúmeros desafios e oportunidades. O tema esteve em debate na talk "Descarbonizar o futuro", promovida pela iniciativa Negócios Sustentabilidade 2030.

    Esta descarbonização da economia é uma forte oportunidade de negócio para as empresas do setor da energia, porque estas empresas desempenham um papel fundamental na descarbonização da economia e na eletrificação de todos os consumos. Ana Júlia Pinto
    Responsável pela Economia Circular da EDP
    Como um dos maiores produtores de energia renovável no mundo, a EDP ocupa um papel central nesta transição. Pretende investir 25 mil milhões de euros na transição energética até 2025 e tem a ambição de ser 100% verde em 2030. "Esta descarbonização da economia é uma forte oportunidade de negócio para as empresas do setor da energia, porque estas empresas desempenham um papel fundamental na descarbonização da economia e na eletrificação de todos os consumos"", começa por referir Ana Júlia Pinto, responsável pela Economia Circular da EDP. Neste sentido, "todo o nosso investimento neste momento esta direcionado para a produção de energia através de fontes de energia renováveis e aqui temos também muitas oportunidades ligadas à inovação e ao encontro de novas tecnologias que sejam mais amigas do ambiente", acrescentou. Por outro lado, dado o papel da companhia na eletrificação dos consumos, através da mobiliação da mobilidade elétrica ou através de soluções de eficiência energética, existe também aqui "uma panóplia de novos negócios e novos modelos de negócio que para o setor da energia são uma oportunidade".

    Tendo a EDP um papel em toda a linha, desde a produção ao consumo, Ana Júlia Pinto sublinha que "no nosso downstream existe também uma grande oportunidade em termos de descarbonização". Nomeadamente, porque "há um papel muito importante na fase final da nossa cadeia de valor que é a eletrificação dos consumos. Existem várias soluções de inovação para esta parte". Exemplificou com modelos de caldeiras inteligentes que supervisionam os consumos das famílias, serviços que permitem a reutilização de equipamentos ou modelos de eficiência energética que permitem às famílias reduzir os seus consumos. No que toca ao "upstream", a responsável destaca que "na produção da energia renovável diariamente trabalhamos com start-ups e empresas que pretendem integrar no mercado soluções inovadoras para a produção de energia renovável".

    Tendo também como clientes a indústria que necessita de grandes consumos ao mesmo tempo que necessita de se descarbonizar, a EDP está igualmente a trabalhar para alavancar a descarbonização destes parceiros B2B. Neste caso, "a solução mais direta que temos é o fornecimento de energia verde", explica a responsável pela Economia Circular da EDP. Por outro lado, "existe também um outro grande conjunto de serviços que prestamos, nomeadamente para autoconsumo, como a instalação de painéis solares, ou o trabalho em conjunto com os parceiros para gerar conhecimento para que eles próprios possam fazer uma utilização mais eficiente da energia". Trata-se, portanto, de serviços de apoio e consultoria aos parceiros para que possam implementar soluções de eficiência energética. Ana Júlia Pinto destacou ainda a importância de apoiar toda a cadeia de valor, desde fornecedores a clientes, para alavancar a transição energética.

    Descarbonizar a indústria: um processo complexo

    No que toca à indústria, descarbonizar a sua operação exige mais soluções para além da eletrificação. António Motta Veiga, diretor de Desenvolvimento Estratégico e Controlo de Gestão da Bondalti, destacou que toda a indústria tem na descarbonização "um desafio muito grande, que começa por eletrificar tudo o que é possível, desde caldeiras que atualmente são a gás até ao processo produtivo". Porém, sublinhou que "há uma componente em que isso não é possível e aí entram soluções alternativas". O hidrogénio verde é visto como "uma solução para quando é necessário substituir o gás natural ou como fonte de matéria prima para o processo produtivo". Uma terceira via de descarbonização da indústria, segundo António Motta Veiga, é a inovação. "Contamos com processos inovadores para reduzirmos os nossos consumos e para revermos a nossa forma de produzir que tem décadas de história, pelo que não é de um dia para o outro que faremos tudo de outra forma".

    A Bondalti consome atualmente hidrogénio de duas fontes diferentes, nomeadamente de origem fóssil e de fonte verde, mas no âmbito da Estratégia Nacional para o Hidrogeno Verde está ligada a dois projetos de hidrogénio verde, um em Estarreja e outro em Sines. "O de Estarreja é um projeto que não é só para consumo interno, também tem a componente de mercado, e isso transformou a empresa, que tinha uma história muito antiga sempre ligada ao mesmo modelo de negócio. Este projeto tornou-se numa oportunidade", explica António Motta Veiga. O projeto em Sines, que conta com diferentes parceiros, "para além de ser um forte descarbonizador de toda a economia naquela zona tem uma componente de inovação, um novo processo de produção de hidrogénio, e com isso conseguimos reduzir consumos e evoluir para um futuro mais descarbonizado".

    O lítio neste momento é um mercado muito quente, com muita procura e que só irá aumentar. O problema não está na procura, mas sim na oferta, pois há competição mundial por esta matéria prima. António Motta Veiga
    Diretor de Desenvolvimento Estratégico e Controlo de Gestão da Bondalti
    A Bondalti anunciou três refinarias de lítio verde até 2030 com um investimento de cerca de 400 milhões de euros em cada uma delas. A empresa está ainda a estudar de onde virá a matéria prima, nomeadamente a nível nacional, europeia, norte-americana, sul americana e inclusive da Austrália. "O lítio neste momento é um mercado muito quente, com muita procura e que só irá aumentar. O problema não está na procura, mas sim na oferta, pois há competição mundial por esta matéria prima", frisou. Dada a elevada pegada de carbono que trazer matéria prima de tão longe pode acarretar, o responsável da Bondalti garantiu que a empresa tem isso em consideração. "O objetivo é reduzir a pegada e se isto tiver um impacto que não faz sentido não é por esse caminho que iremos. Está tudo a ser estudado", sublinhou.

    Portugal na liderança da energia verde

    Questionado sobre a efetividade do conceito de "green mining", Emanuel Proença, retorquiu defendendo que "nenhuma das soluções é absolutamente perfeita, mas estão a caminhar no sentido certo e são saltos quânticos partindo do sítio de onde estamos neste momento". O CEO salientou que as empresas estão a trabalhar na descarbonização já há muitos anos, com "resultados muito interessantes" do lado da eletricidade. Do lado da indústria, "estamos só agora a começar e a conseguir soluções de maior escala, maior valor e impacto". Frisou também que "do lado da mobilidade ainda consumidos 92,3% de petróleo, apesar de termos feito um trabalho muito interessante do lado dos combustíveis verdes nos últimos três ou quatro anos". Referiu que na mobilidade o setor ainda está a "passar pelas dores de desenvolvimento, tudo está em adaptação, mas está claramente a acontecer".

    Emanuel Proença salientou ainda que "para que tudo isto aconteça, ganhe força, velocidade e escala, é preciso mais e melhores soluções". Salientou que "a oportunidade da nossa geração é a de transformar a matriz energética, aproveitando bem o que isso pode trazer de valor para as regiões, para o país e para o mundo", acrescentando que "a oportunidade é enorme e Portugal tem a sorte de estar muito bem colocado para essa oportunidade". Nomeadamente porque "temos muita eletricidade verde, temos muita capacidade de produção de combustíveis verdes, temos boas condições para começar a trabalhar hidrogénio verde em maior escala e temos condições para trazer essa eletricidade verde para preços baixos e trazer assim mais indústria com melhores empregos para o país", defendeu. Para além disso, "temos agora a sorte de juntar o potencial de sermos o maior produtor de lítio da Europa".

    Tendo em conta a necessidade de multiplicar por 10 a disponibilidade de matérias críticas como o lítio até 2030, isto representa "uma quantidade de enorme de oportunidades para que muitos possamos participar nesta transformação e extrair daí valor". O CEO da Savannah Resources garantiu que a empresa visa extrair lítio da forma "o mais sustentável possível, até porque é o que a Europa pede e é o que o mundo pede e nós queremos responder ao desafio porque ele é uma oportunidade".

    Para a Europa é importante que haja mais ação por parte dos agentes europeus para desenvolverem a fileira no lítio, porque a geopolítica começa a ter efeitos muito relevantes no caminho que se está a construir. Emanuel Proença
    CEO da Savannah Resources
    Emanuel Proença salientou também que "para a Europa é importante que haja mais ação por parte dos agentes europeus para desenvolverem a fileira no lítio, porque a geopolítica começa a ter efeitos muito relevantes no caminho que se está a construir". Nomeadamente para não deixar nas mãos da China o controlo das energias e produtos verdes. Em Portugal, o CEO avançou que os projetos de lítio deverão começar a trabalhar em 2026, altura em que haverá um "pico de procura", pelo que "se nos atrasássemos perderíamos uma parte desse pico e não estaríamos a servir tão bem a sociedade, a economia e a posicionar Portugal para capturar valor nesta oportunidade".

    Mobilidade mais verde

    A par da indústria, a área dos transportes é outra que enfrenta elevados desafios para se descarbonizar. Helder Pedro, secretário-geral da ACAP - Associação Automóvel de Portugal, referiu que os transportes estão "a dar um passo enorme no sentido da descarbonização", destacando-se até dos outros setores neste esforço. "Nós estamos na União Europeia e temos uma regulamentação muito específica no sentido de reduzir as emissões em 2025, 2030 e 2035, quando os veículos colocados à venda terão de ter emissões zero", sublinhado que "a indústria automóvel, sendo centenária, soube adaptar-se e corresponder a este desafio e, neste momento, a indústria está do lado da solução". E a solução é, segundo especifica, "colocar no mercado todos os dias dezenas de modelos de emissões zero ou de baixas emissões". Reconhecendo que na totalidade do parque automóvel os elétricos são ainda "muito incipientes", porém "há quatro anos representavam 1% das vendas e neste momento os elétricos puros representam 16% e os eletrificados mais de 30%".

    A indústria automóvel, sendo centenária, soube adaptar-se e corresponder a este desafio e, neste momento, a indústria está do lado da solução. Helder Pedro
    Secretário-Geral da ACAP
    Sublinhado que a indústria está a fazer o seu caminho, destacou que "estas questões não passam só pela indústria, é necessário que haja políticas públicas no sentido de apoiar e incentivar essa eletrificação".

    Helder Pedro destacou ainda que é necessária bastante ambição por parte de todos, para cumprir os objetivos europeus de descarbonizar 55% da economia em 2030. "O mercado dos eletrificados terá de ter uma percentagem muito significativa nas vendas e é aí que surge a necessidade de haver políticas que possam dar sustentabilidade a esses objetivos".

    Chamou também a atenção para os corredores europeus para carregamento de viaturas elétricas, cujos objetivos europeus estipulam que deve existir um de 60 km em 60 km. Mas critica que "ainda existe muito pouca regulamentação" e que "temos neste momento dois países que concentram 50% dos pontos de carregamento entre os 27, que é a Alemanha e a Holanda". Portanto "ainda há uma grande assimetria", evidenciou.
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