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Foto em cima: Apresentada no dia 10 de outubro, a proposta de Orçamento do Estado para 2025 vai ser debatida pelos partidos esta quarta-feira e votada já amanhã na generalidade.
O tema em destaque esta semana. A discussão da proposta de Orçamento do Estado para 2025 (OE 2025) entre todos os partidos arranca esta quarta-feira, dia 30 de outubro, no Parlamento e já amanhã será votada na generalidade. Depois do "clima tenso" das últimas semanas, e da "novela" política protagonizada pelo primeiro-ministro social-democrata, Luís Montenegro, o secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos, e o líder do Chega, André Ventura" - com um eventual chumbo do documento a ameaçar atirar o país para novas eleições, as segundas no mesmo ano - é agora esperado que o OE 2025 seja aprovado com os votos a favor do PSD e CDS, abstenção do PS e votos contra do Chega, Iniciativa Liberal e de todos os partidos à esquerda, do Bloco de Esquerda ao PCP, Livre e PAN.
Mas o "cartão vermelho" ao Orçamento do Estado para o próximo ano - o primeiro do Governo de Montenegro - não vem apenas dos extremos à direita e à esquerda do espetro político nacional. Também os ambientalistas dão uma nota "muito negativa" ao documento. A Zero - Associação Sistema Terrestre Sustentável fez uma análise às principais propostas orçamentais para o próximo ano e conclui que "as medidas mais sonantes são suportadas pela manutenção, ou até aumento, do consumo de combustíveis rodoviários fósseis, o que dizem ser "claramente inaceitável". "O OE 2025 não tem a ambição necessária para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa, travar o aumento da produção de resíduos, promover uma gestão sustentável dos recursos hídricos e adotar um modelo de agricultura que contribua para a restauração da natureza e a coesão social", refere a Zero na sua avaliação, que atribui 18 "cartões vermelhos", 10 amarelos e apenas 4 verdes.
Apesar disso, a associação ambientalista espera que nas negociações que se seguirão à aprovação do Orçamento seja "possível tornar este instrumento fundamental de política pública num incentivo efetivo à sustentabilidade em Portugal".
A primeira "negativa" dada pela Zero na sua avaliação foi logo na adequação do documento à Lei de Bases do Clima e à política climática, porque "continua a não ser mencionada a restrição da produção e comercialização de combustíveis ou biocombustíveis que contenham óleo de palma ou outras culturas alimentares insustentáveis". No entanto, reconhecem que "é positivo o empenho com a orçamentação verde".
Um Orçamento pintado de verde e castanho
O OE 2025 é o primeiro de sempre, em Portugal, em que este conceito foi aplicado a 100%, depois de em 2024 ter abrangido apenas alguma áreas governamentais: Ambiente e Ação Climática, Infraestruturas e Alimentação. Agora, a aplicação foi alargada a todos os programas orçamentais. De acordo com o Conselho das Finanças Públicas, a Orçamentação Verde utiliza as ferramentas de políticas orçamentais para alcançar objetivos climáticos e ambientais. Na prática, são identificados e avaliados os contributos positivos de cada rubrica orçamental, com a classificação das despesas e receitas como "verdes" (amigas do ambiente), "castanhos" (prejudiciais) ou neutras. No relatório que acompanha o OE 2025, o Governo contabiliza quase 6.000 milhões de euros de despesa "verde" no próximo ano, enquanto a "castanha" não chega aos 3.000 milhões de euros. Infraestruturas e Habitação, Ambiente e Economia apresentam maior despesa amiga do ambiente. "A despesa desfavorável inclui os combustíveis fósseis, rodovia e novas construções", diz o relatório. Mais positivos são os investimentos nos metros e ferrovia.
No entanto, diz a Zero, "as iniciativas relacionadas com matéria de política climática representam cerca de 2.302 milhões de euros no Orçamento de 2025, representando um valor ainda mais baixo do que no ano passado (cerca de três mil milhões).
Outro "vermelho" dos ambientalistas vai para a Fiscalidade Verde, dizendo os ambientalistas que "não existem medidas efetivas de promoção de uma economia circular, o que contrasta com a importância dada ao tema no relatório que acompanha a proposta de Lei de OE 2025, onde são reconhecidas as limitações do país nesta área e a necessidade de acelerar a transição para a circularidade".
Nos impostos com impacto ambiental, a avaliação diz que as previsões do Governo apontam para um aumento da receita do Imposto sobre os Produtos Petrolíferos (ISP) "conseguido não apenas à custa do fim do descongelamento da taxa de carbono, mas também assumindo um aumento do consumo de combustíveis fósseis". A Zero exige que o Governo explique a compatibilidade destas medidas com a metas do Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC 2030), que exige uma descida no consumo de gasolina e gasóleo de cerca de 5% ao ano com vista ao cumprimento da redução de 40% das emissões nos transportes até 2030. Ainda em matéria fiscal, é considerada negativa a redução da tributação autónoma para veículos a combustão, juntamente com o aumento dos limites de custo de aquisição, pois "estas medidas deveriam ser restritas a veículos 100% elétricos afetos às atividades empresariais".
Já no abate de veículos, a Zero assinala um "sinal ultravermelho". Isto porque, dizem, os incentivos para 2025 não contemplam a possibilidade de abate de veículo particular em troca de 4.800 euros em cartão de mobilidade, e "ficam muito aquém dos 600 milhões de euros para comparticipar a eletrificação de veículos de intensa utilização, com a criação de áreas exclusivas para o seu carregamento e a redução das tarifas de eletricidade para esta classe de veículos que circula mais de 50.000 km por ano".
Plásticos levam nota negativa
Na área dos resíduos, todas as notas dadas ao OE 2025 são negativas, a começar pela taxa sobre embalagens de plástico colocadas no mercado e não recicladas, que desde 2022 já ascende a 578 milhões de euros. "O Governo considera aceitável uma subsidiação de 205,6 milhões do Orçamento do Estado para uma obrigação de quem introduz este tipo de embalagens no mercado", diz a Zero. Sobre a contribuição sobre sacos muito leves, que "deveriam ser taxados", a proposta é omissa sobre a extensão desta medida a todos os sacos nesta categoria, independentemente do material em que são fabricados. Por fim, nas embalagens de "take away" (de utilização única utilizadas em refeições prontas a consumir), o OE 2025 é uma "oportunidade perdida", já que continuam a existir muitas exceções que tornam complexa a sua implementação.
Na agricultura e pescas, os "cartões vermelhos" são nove no total, e vão desde os programas nacionais de Regadios e Apoio à Agricultura de Precisão, à ausência de medidas para o incentivo de cadeias curtas agroalimentares, promoção da agroecologia, transição para dietas saudáveis, faltando também reforço da fiscalização das práticas agrícolas e ordenamento do território. A Taxa de Recursos Hídricos para a Agricultura e Produção Hidroelétrica, os incentivos à reutilização e uso eficiente da água e a redução de perdas de água no abastecimento público, também estão no "vermelho".
Sobre este último tema das perdas de água, para o qual a Entidade Reguladora dos Serviços de Água e Resíduos (ERSAR) também tem vindo a alertar ano após ano, a proposta de OE 2025 não inclui fundos para incentivar as entidades gestoras a investir em novas tecnologias para monitorização e deteção de fugas, nem na modernização e reabilitação das redes de abastecimento. "Tendo em conta a elevada taxa de perdas nas redes de abastecimento de água continuar-se-á a comprometer a sustentabilidade económica e ambiental dos serviços de abastecimento de água", diz a Zero.
Do lado dos "sinais verdes" neste Orçamento do Estado para 2025, a avaliação dá nota positiva a apenas quatro medidas, num total de 32, começando pela decisão de alargar o passe social gratuito a todos os jovens até aos 23 anos. No entanto, avisam, "deve ser complementada por uma melhoria na oferta de transporte público e nas condições de circulação, especialmente em áreas suburbanas e de baixa densidade". Também a transferência de 30 milhões de euros do Fundo Ambiental para o Instituto Financeiro para a Agricultura e Pescas (IFAP) foi elogiada, devendo "ser discriminadas as medidas de promoção da biodiversidade e prevenção de fogos rurais que queiram apoio através desta transferência de verbas".
Na proteção da floresta foi vista com bons olhos a intenção de promover políticas contra a desflorestação ilegal e o apoio dado ao associativismo agroflorestal. Soma-se ainda a necessidade de atualizar com maior regularidade o inventário florestal, "de forma que as decisões políticas tenham por base a realidade atual dos territórios". Por fim, a Zero destacou os apoios à agricultura familiar e pesca tradicional, através da consignação de receita do imposto cobrado sobre o gasóleo colorido. "É um ponto positivo, mas esta consignação deve ser exclusiva, uma vez que o montante máximo de 10 milhões de euros é reduzido face às necessidades e à fraca implementação do estatuto de agricultura familiar".