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Ecológico, biodegradável, sustentável, amigo do ambiente, biológico ou neutro em carbono são características que vemos cada vez mais estampadas nos rótulos de produtos e em campanhas publicitárias, um pouco por todo o lado, como resposta a uma procura crescente por produtos sustentáveis.
Segundo Elsa Agante, team leader de Energia e Sustentabilidade da DECO PROTESTE, "cerca de 57% dos consumidores da União Europeia estão recetivos às alegações ambientais, aquando da compra dos produtos, e cerca de um terço tem em consideração os rótulos ecológicos no momento da decisão de compra". "Acresce que cerca de 60% dos consumidores preferem comprar um produto com um rótulo ecológico e cerca de 66% estão até disponíveis para pagar mais por produtos sustentáveis." Porém, estas alegações ambientais encontradas nos produtos, em que se inclui também a utilização de símbolos e cores associadas à natureza, nem sempre são verdadeiras, visto não serem baseadas em factos científicos comprováveis. E, nestas circunstâncias, estamos perante práticas de ecobranqueamento (ou "greenwashing", em inglês).
A prática induz em erro e não confere a devida vantagem às empresas que estão a envidar esforços para tornarem os seus produtos e atividades mais ecológicos. Em última análise, conduz a uma economia menos verde, ou seja, leva no sentido inverso daquilo que se pretende. Por outro lado, conduz à descrença dos consumidores.
O caso do rótulo ecológico europeu (EU Ecolabel) é disso exemplo. Existe desde 1992, é considerado o mais fidedigno pela Comissão Europeia, pois só abrange produtos ou serviços que cumpram elevados padrões ambientais ao longo de todo o ciclo de vida do produto, mas já está a ser alvo de desconfiança. Um estudo publicado recentemente pela DECO PROTESTE verificou que apenas 29% dos consumidores conhecem este rótulo e, dos que o conhecem, mais de metade indicou que não tem confiança no mesmo.
Greenwashing em Portugal
Por cá, a Direção-Geral do Consumidor (DGC) é a entidade pública que define a política de defesa do consumidor e tem a responsabilidade de acompanhar e fiscalizar a publicidade em Portugal. É neste sentido que Gisela Serafim, chefe de Divisão de Publicidade da DGC, dá conta de que, de facto, "a DGC, no âmbito das fiscalizações que efetua, verifica que em Portugal são cada vez mais as marcas que utilizam estas alegações na promoção dos seus bens e serviços".
As ações de fiscalização realizadas em Portugal resultaram em cerca de uma dezena de processos de contraordenação em matéria de publicidade, em 2020. A DGC não dispõe de dados relativos ao impacto, inclusive económico, destas práticas no mercado, porém reconhece serem práticas lesivas dos direitos dos consumidores. "A DGC não dispõe de dados estatísticos específicos sobre valores monetários. Contudo, pode afirmar-se que a utilização destas alegações de forma irresponsável e contrária à lei contribuirá negativamente para a sã concorrência e poderá afetar negativamente as escolhas dos consumidores, que estão cada mais sensibilizados para os impactos das suas opções de compra no meio ambiente", assinala Gisela Serafim.
A legislação relativa às Práticas Comerciais Desleais é o Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26 de março, que transpõe a Diretiva 2005/29/CE. Este é o instrumento jurídico que permite estabelecer se uma alegação é enganosa, quer no seu conteúdo, quer na forma como é apresentada aos consumidores.
Já quando se trata de sanções, é o Regime Jurídico das Contraordenações Económicas, nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 9/2021, que estabelece os valores. Assim, alegar que um produto é amigo do ambiente, sem comprovadamente o ser, pode levar o infrator a incorrer numa coima com uma moldura contraordenacional que pode ir dos 2 mil aos 90 mil euros. "Tratando-se de pessoa singular, a moldura contraordenacional é de € 2.000,00 a € 7.500,00, ao passo que, tratando-se de microempresa, esta será de € 3.000,00 a € 11.500,00, no caso de pequena empresa, de € 8.000,00 a € 30.000,00, quanto a média empresa, de € 16.000,00 a € 60.000,00 e, por fim, quando se trate de grande empresa, de € 24.000,00 a € 90.000,00. A estas contraordenações poderão acrescer, em função da gravidade da infração e da culpa do agente, as sanções acessórias previstas na lei", explica Gisela Serafim.
Porém, para a responsável da DECO, Elsa Agante, a proteção do consumidor deveria ser mais acautelada: "Consideramos que apenas com legislação específica poderá haver uma maior proteção do consumidor." Elsa Agante recorda o esforço conjunto que está a ser feito a nível europeu para tornar mais ecológicos vários aspetos da vida dos cidadãos, nomeadamente através do Pacto Ecológico Europeu. "Neste contexto, a UE está a trabalhar não só para tornar os produtos mais sustentáveis, mas também para tornar as alegações e rótulos ecológicos mais fiáveis. Não obstante, levará ainda algum tempo até que o ‘greenwashing’ seja devidamente regulamentado."
Um guia para empresas e consumidores
O Guia das Alegações Ambientais na Comunicação Comercial, lançado recentemente pela DGC e pela Auto Regulação Publicitária, tem como destinatários simultaneamente os operadores económicos e os consumidores. Contém orientações dirigidas aos operadores económicos com vista a que, na promoção dos seus bens e serviços, não induzam os consumidores em erro nas suas alegações ambientais, optando por menções verdadeiras, precisas e devidamente baseadas em factos científicos e comprováveis.
Contém, por outro lado, informações destinadas aos consumidores alertando-os para a problemática das alegações ambientais utilizadas no marketing e na publicidade. O guia alerta, por exemplo, que existe uma proliferação de selos, logos e símbolos "verdes" criados pelas empresas e que são, na realidade, publicidade. Esta forma de comunicação comercial não se pode confundir com a certificação, que obedece a requisitos e procedimentos específicos. O guia apresenta um conjunto de exemplos de más práticas como, por exemplo, alegar que um produto tem um consumo de água reduzido, quando se verifica que esse produto, quando comparado com outro da mesma categoria, consome na realidade mais energia e tem um impacto negativo no ambiente.
O que fazer então perante uma situação destas? Às empresas, é recomendada a consulta deste guia, em particular a lista de verificação constante do mesmo. Os operadores económicos poderão ainda consultar diretamente a DGC, a Direção-Geral das Atividades Económicas ou a Autorregulação Publicitária para mais esclarecimentos. Já os consumidores, perante uma alegação aparentemente imprecisa, "poderão apresentar, à DGC, reclamação contra o operador económico em causa, através de vários meios à sua disposição, designadamente utilizando o formulário de reclamações da DGC, ou através do Livro de Reclamações da empresa em causa, nas suas versões eletrónica ou física", explica Gisela Serafim.
A DECO aconselha o consumidor a tentar verificar as alegações ambientais dos produtos, eventualmente na ficha técnica dos mesmos e, em caso de imprecisões, a fazer queixa no livro de reclamações do operador económico e a comunicar o caso à ASAE.