Opinião
A maneira errada de lidar com uma decisão acertada
Faz sentido que sejam os grandes depositantes a assumir as perdas da reestruturação da banca de Chipre. Mas não faz sentido nenhum a forma como os líderes europeus se comportaram na gestão da crise da ilha do Mediterrâneo. Vamos em três anos de crise de dívida soberana na Europa e os líderes europeus continuam a cometer erros crassos na forma como comunicam as decisões que tomam para enfrentar os problemas que vão surgindo pelo caminho.
O resgate de Chipre é um exemplo. A primeira reunião do Eurogrupo dedicada ao assunto obrigou Chipre a encontrar 5,8 mil milhões de euros e deixou à discrição do presidente cipriota a fórmula a aplicar para o valor ser obtido.
Na União Europeia existe uma regra, que há não muito tempo atrás era considerada de ouro, que garantia aos aforradores que os seus depósitos de até 100 mil euros eram intocáveis. Mas os ministros das Finanças nem pestanejaram quando a proposta que foi apresentada aos deputados cipriotas para votar implicava uma perda de 6,5% para os depósitos abaixo de 100 mil euros. Saíram notícias que o Eurogrupo estava contra, mas nada impediu que a proposta fosse votada pelos deputados cipriotas. No comunicado oficial do presidente do Eurogrupo apenas se lembrava que na União Europeia os depósitos inferiores a 100 mil euros beneficiavam de uma garantia total. E foram vários os responsáveis europeus a dizerem que o importante era Chipre angariar 5,8 mil milhões de euros para salvar a banca e não a forma como o dinheiro era obtido.
Um disparate total que poderia abrir uma caixa de Pandora na Zona Euro e que os deputados cipriotas tiveram o bom senso de recusar. A solução acordada no último fim-de-semana emendou a mão face ao erro que se estava prestes a cometer, deixando os pequenos depositantes de fora dos que vão pagar a factura dos erros cometidos pelos dois maiores bancos do país. Serão os grandes depositantes, os mesmos que colocaram o dinheiro em Chipre para tirarem partido das condições únicas oferecidas pela banca da ilha mediterrânica – impostos reduzidos e controlo quase nulo – que vão agora sofrer perdas. O que faz todo o sentido, pois Chipre é mesmo um caso único na banca europeia: e é por isso que o outro grande erro de comunicação cometido pelos líderes europeus foi cometido na entrevista que o presidente do Eurogrupo deu à Reuters e ao Financial Times.
Apesar dos recuos e clarificações face ao que disse Jeroen Dijsselbloem, nos mercados a mensagem que passou foi que mais nenhum banco europeu será salvo com o dinheiro dos contribuintes, independentemente do contexto, país e situação que gerou o problema.
Mario Draghi precisou de uma pequena frase para salvar o euro. Para destruir a confiança dos investidores sobre o futuro da Zona Euro também não é preciso muito.
*Subdirector
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