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Austeridade, não. Contenção, sim

O relatório do Conselho de Finanças Públicas mostra que a política orçamental foi restritiva e contracíclica. Isso não significa que tenha havido austeridade, mas prova que houve muita contenção na despesa.

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Apanhadas as canas do foguetório em torno da redução do défice, a discussão agora já não é sobre a capacidade de o Governo cumprir as metas de Bruxelas. O que aquece agora o debate é saber se vai mais longe do que precisa e se está a atropelar as promessas que fez sobre o fim da austeridade.

Vejamos o retrato tirado pelo Conselho das Finanças Públicas (CFP) às contas das administrações públicas de 2017: quatro em cada 10 euros da redução do défice orçamental (ajustado das medidas temporárias) são explicados por acções discricionárias do Governo. Essas acções têm tradução no saldo primário estrutural (excluindo juros e ciclo económico) que melhorou em 0,6 pontos percentuais do PIB. O défice estrutural, o indicador usado pela Comissão Europeia para medir a consolidação orçamental, baixou um ponto percentual quando a Comissão pedia um corte de 0,6.

Para o CFP, os números mostram uma "postura restritiva e contracíclica da política orçamental", no que configura ser uma "retoma do processo de consolidação estrutural das finanças públicas interrompido em 2014". Dito isto, ficamos a um passo de concluir que Costa fez austeridade em 2017. Errado.

Uma política orçamental restritiva não implica austeridade. Embora não haja uma definição para austeridade, esta remete para a ideia de medidas com implicações nos rendimentos dos agentes económicos, seja com cortes directos em salários ou pensões, aumento de impostos ou redução dos serviços prestados pelo Estado.

Ora, a despesa do Estado, já retirando o efeito da CGD, não baixou em 2017. Segundo o CFP, a despesa corrente primária (sem juros) cresceu 0,9%. Então, se o Estado está a gastar mais, António Costa virou mesmo a página da austeridade. Errado também.

Acontece que a despesa corrente primária cresceu abaixo do PIB nominal (4,1%), isto é, o seu peso baixou em termos relativos. E desacelerou face a 2016, ano em que tinha crescido 1,8%. Este forte abrandamento deve-se à despesa com consumo intermédio (no qual a Saúde tem um peso relevante) e aos salários da Função Pública.

Ou seja, o Governo foi mais longe do que Bruxelas pediu e em rubricas que doem. Ainda que o PS possa argumentar que parte da redução do défice estrutural resulte de um aumento do PIB potencial e dos juros (considerados estruturais), impressiona ver uma contenção destas quando a carga fiscal subiu para níveis inéditos.

As Finanças argumentam que os ganhos reputacionais – que valem milhões quando traduzidos na redução do "spread" da dívida portuguesa – mais do que compensam o custo de travar a despesa corrente primária. Mas fica a dúvida se esses ganhos se perderiam com um défice um pouco maior. O que terá sido mesmo decisivo para esta contenção exagerada foi o receio nunca assumido por Centeno de ver a Caixa empurrar o défice para níveis bem acima dos 3%, que poderiam levar a uma nova abertura do Procedimento por Défices Excessivos, com os custos inerentes para o financiamento do Estado. 
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