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14 de Julho de 2008 às 14:00

Portugal e o iPhone

Encontrar empresas com negócios em expansão é facílimo por má uma razão: são poucas e por isso sobressaem do palheiro, como tiras fosforescentes num túnel escuro, vêem-se logo. Caro leitor, hoje damos-lhe três opções típicas do deprimido: ter pena de si mesmo (página 22), ter esperança (página 4) ou beber para esquecer (página 14).

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A páginas 4: o Jornal de Negócios inicia hoje a publicação de um retrato alternativo dos sectores económicos do País. É "alternativo" porque procura casos positivos, subordinando o geral ao particular, ou seja, sobrepondo a "empresa" ao "sector". Em vinte pinceladas, uma por dia, mostraremos empresas miúdas e graúdas que vivem com mais crer na gestão que credo na boca, de outros tantos sectores, da agricultura, da indústria e dos serviços. Não se trata da conversa paternalista dos "casos de sucesso" - ter sucesso nas empresas é muitas vezes sobreviver muitos anos. São antes casos de boa saúde. Não é de facto difícil encontrá-los. Mas é entristecedor a noção de que é este o outro lado da moeda, pouco visto e representativo. O título deste editorial podia portanto ser "Portugal positivo" com ponto de exclamação! mas só umas boas reticências lhe dariam verosimilhança…

O retrato é "alternativo" porque é uma opção ao exercício entre a ira e a melancolia que podem ser provocadas pela leitura de jornais nos últimos meses. A palavra "crise" instalou-se nas manchetes, alternando com o minimal-repetitivo da subidas de preços, do desemprego, das falências. A opinião da Sedes, a análise do Compromisso Portugal, o relatório do Tribunal de Contas, as estatísticas do Eurobarómetro, tudo parece contribuir para uma sociedade deprimida como está a nossa, em que dois terços dos portugueses admitem que têm dificuldades em chegar ao fim do mês.

Portanto, se quer suspirar, vá até à página 22 desta edição e compraza a desgraça colectiva com o inquérito que valida essa não-novidade de sermos dos mais pessimistas da Europa. Se prefere a esperança à comiseração, dirija-se às páginas 4 a 7 e leia como a pequena Atlantic Meals ou a grande Companhia das Lezírias puxam pela agricultura nacional. Tem ainda a opção final, está na página 14 e é como beber para esquecer: consumir, endividar-se, comprar o iPhone.

A histeria em torno do iPhone é, embora cansativa, um incrível fenómeno de massas urbanas com aspiração ao cosmopolitismo. A Apple reinventou-se na geração dos i-produtos e conseguiu o milagre de pôr todos os meios de comunicação social a fazer notícias, e notícias positivas, sem qualquer restrição auto-imposta pelos jornalistas sequer pela banalização da mensagem: há um ano que se suspira pelo iPhone na imprensa, que assim alimenta a mitificação de um telefone-câmara-gira-discos bonito e funcional, num exercício de propaganda espontânea e frenética. Steve Jobs fez ideologia no marketing.

Não tarda, estarão os mesmos órgãos de comunicação social a censurar quem assim compra, pela irresponsabilidade que é persistir na encomenda de milhares de produtos a vendidos ao preço quebrado de €499. Ninguém resiste a dar lições de moral e elas são revalidadas sempre que saem vendas de pacotes de férias, de automóveis, de casas ou de telemóveis. Mas cada um faz o que quer e só ao Estado devemos encomendar sermões.

O iPhone é um anti-depressivo caro. Mesmo que chateie ver tanto consumismo, o problema é a depressão, não é o remédio.

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