Opinião
Parque Mayer
Devem ser muito poucos os cidadãos que se deram ao trabalho de acompanhar a discussão, na generalidade, da proposta de Orçamento do Estado para 2008. Havia deveres profissionais a cumprir, enquanto deputados e Governo trocavam argumentos. E os incentivos
Na essência, um espectador menos informado que tenha sintonizado o canal televisivo do Parlamento terá julgado que a campanha eleitoral já tinha chegado, acompanhada do inevitável estrépito dos ajustes de contas e das acusações sobre quem fez pior no passado. Só faltaram as bandeirinhas, já que os sacos de plástico de outrora foram banidos por ponderosas razões ambientais. Para o debate sobre um documento que transforma em lei algo tão decisivo como a definição de onde virá e em que será gasto o dinheiro dos contribuintes portugueses, o que se viu e escutou foi decepcionante.
Houve oportunidade para assistir a muita trica política, o que cumpre requisitos e expectativas quando o objectivo prioritário é o de avaliar quem esteve melhor no jogo imediatista em que ganha quem prega a rasteira mais certeira. Mas faltou a discussão sobre políticas, que é, no fim de contas, aquilo que está em causa de cada vez que um Governo se dirige aos deputados para debater e pedir a validação das suas opções. De substância, pouco ficou para a história, se forem exceptuadas as propostas concretas de Paulo Portas, no dia de estreia da discussão, ou as questões levantadas por Francisco Louçã sobre as Estradas de Portugal, cuja retirada do perímetro orçamental é, no mínimo, uma decisão comparável à táctica das receitas extraordinárias que, no passado, colocou os cabelos da bancada socialista em pé.
Para a oposição, discutir e votar uma proposta de Orçamento quando, do outro lado, está uma maioria absoluta que assegura, à partida, a respectiva aprovação, corresponde a representar um papel potencialmente ingrato. Mas este reconhecimento não serve de desculpa para intervenções que revelam escassa preparação e análise do documento, disfarçadas sob a máscara de acusações generalistas que atiram o confronto para o terreno que mais convém ao Executivo. Em matéria de grandes números, o Governo tem resultados para apresentar e não deixou de os acenar, como era esperado. O problema é que faltou talento na oposição para evitar cair nesse alçapão.
O défice público vai manter-se, em 2008, numa rota de arrefecimento? Há incertezas sobre os contributos do crescimento económico para que a meta seja alcançada, mas, neste campo, José Sócrates e Fernando Teixeira dos Santos estão à vontade para responder com a credibilidade de quem cumpriu, até agora, os compromissos assumidos. Teria valido a pena, ainda assim, questionar o caminho escolhido para chegar a este desempenho. E denunciar aquilo que, por detrás da redução do desequilíbrio das contas, mantém pressão suficiente sobre os gastos para que a consolidação orçamental que a contabilidade oficial aparenta se possa considerar uma obra bastante incompleta.
Pedro Silva Pereira, que ontem encerrou o debate, fez um discurso truculento, ao estilo do seu chefe, em que desancou, um por um, os partidos da oposição. O ministro da Presidência foi o retrato do que, por estes dias, se passou na Assembleia. Se não estava no Parque Mayer, pareceu.