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15 de Março de 2007 às 13:59

A revolta do consumidor

É proibido fumar em locais fechados. É proibido fazer publicidade a bebidas alcoólicas. É proibido conduzir velozmente. É proibido vender hambúrgueres hipercalóricos. É proibido fazer publicidade a chocolates. É proibido comprar diamantes africanos.

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Está a imaginar um mundo assim? Ele existe. E hoje é o dia em que se celebram os habitantes desse mundo. Hoje é o Dia do Consumidor.

A proibição de fumo está vulgarizada e a ComissãoEuropeia já deu aval à prática de excluir fumadores nos recrutamentos em empresas. Em Espanha, uma ministra fundamentalista quer proibir a publicidade de bebidas alcoólicas em folhetos de supermercado, onde as garrafas devem passar a ficar trancadas à chave atrás de vitrinas.

A mesma ministra abriu guerra à Burger King e quer proibir a cadeia de vender o seu novo hambúrguer de 800 calorias. As velocidades máximas autorizadas nas cidades europeias têm vindo sucessivamente a baixar: 60 kms, 55 kms, 50 kms... O presidente da Masterfoods anunciou a retirada da publicidade dos chocolates Mars de todos os meios que tenham audiência junto de menores de 12 anos.

O filme "Blood Diamonds" gerou uma chuva de protestos da indústria diamantífera por mostrar diamantes com sangue de gente explorada por mercenários.

Todos estes exemplos foram dados há uma semana por José Luis Nueño, no Fórum anual da APED, no Estoril. Nueño, um académico-jurista-consultor espanhol, diz que esta paranóia proibicionista viola as liberdades civis mas instalou-se na Europa do cinismo e da impotência dos políticos. O resultado, diz, será a revolta dos consumidores, que têm o direito de comer comida que lhes faz mal desde que estejam informados disso. Mesmo que a maioria dos europeus se acomode, balindo como carneiros num rebanho. O resultado, prossegue, é uma legião de europeus contidos, infelizes na sua opção (?) de viver em lares monofamiliares e sem crianças. O europeu é um consumidor infeliz que busca experiências de pico, transgressões sociais de velocidade, desportos radicais e violências que por um fim-de-semana distraiam as frustrações individuais.

Esta é uma visão apocalíptica da nossa sociedade, que defende ao limite a liberdade individual. Do outro lado estão os que supõem que o indivíduo precisa de protecção das mensagens de marketing massivo e enganador das marcas de comida-lixo, das tabaqueiras, das destilarias.

O Dia do Consumidor é como quase todos os outros dias de qualquer coisa: serve para fingirmos que nos preocupamos. Hoje é um desses dias: para políticos, patrões, trabalhadores e desempregados fingirem que se preocupam com os consumidores. Mas, além de declarações de circunstância, é importante perceber que o consumidor está entalado entre uma indústria de produtores e distribuidores que quer vender abundâncias e uma indústria do politicamente correcto e socialmente puritana que exige proibições. E há negócio em ambas as indústrias.

O consumidor é hoje dissecado por hordas de cientistas que analisam tendências, padrões, fragilidades, moralismos.

As crianças mandam nos pais, as mulheres têm um poder crescente, os produtos orgânicos estão na moda, os veículos poluentes não, há um contra-movimento emergente, o anti-consumismo, e a Internet é um meio de extraordinária difusão.

Não é como "Fahrenheit 451", de Truffaut, o filme onde os livros eram proibidos. Mas estamos de facto entre liberdades infinitas e proibições sucessivas. E, claro, a hipoteca da casa.

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