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O Orçamento que (não) temos

Todos os anos Portugal é confrontado com a rábula do Orçamento. O que deverá ser, os lóbis, as possibilidades que estão a ser estudadas, as mudanças fiscais, as exigências do patronato e dos sindicatos, as críticas da oposição, e por aí adiante.

Este espectáculo tornou-se repetitivo, às vezes caricato (como a entrega da "pen" vazia), outras vezes peculiar, com medidas de alcance duvidoso (como os benefícios fiscais para a instalação de vidros duplos, em 2010).

 

Os orçamentos são um espelho do país e, em grande parte, explicam o estado a que o Estado chegou. Em todos eles há mudanças fiscais, para os cidadãos e para as empresas. Em todos eles há alterações em áreas como a saúde ou a educação. Em todos eles existe uma arquitectura de benefícios pelas razões mais diversas. E neste pode passar a existir uma "fat tax" para os refrigerantes ou o fim do IRS suave para quem arrenda casas a turistas ou um novo imposto sobre o património imobiliário.

 

Visto de fora, este espectáculo assusta. Assusta, por exemplo, os investidores, que não se dão bem com mudanças sistemáticas nas leis e na fiscalidade de um país. Visto de dentro, este espectáculo confrange, porque quase sempre termina com uma elevada dose de inocuidade que apenas fortalece o grau de desconfiança com que os cidadãos olham para o Estado.

Pode-se argumentar que este é o Orçamento em que o Governo liderado por António Costa irá definir a sua estratégia até final da legislatura. Poder, podia-se, mas, pelo que sabe, este Orçamento é mais um exercício de substituição dos impostos directos por indirectos e de encontrar novas formas de captar receita. A devolução de rendimentos aos pensionistas mais carenciados é algo demasiado curto para consubstanciar uma estratégia.

 

Na base de tudo isto está uma incapacidade crónica para reformar o Estado, condição essencial para criar uma relação de confiança com os cidadãos, suportada pela previsibilidade. Em vez disso temos medidas avulsas, cuja duração temporal é uma incerteza e que fazem com que cada Orçamento adquira uma proporção manifestamente exagerada na gestão da coisa pública. As linhas mestras do Estado, em matéria financeira, deviam ser um porto seguro e não um mar aberto ao sabor de correntes, até porque um Estado é um sistema de representação de uma sociedade e não dos diversos grupos que a compõem.

 

Um Orçamento devia ser um exercício corrente. Em Portugal, é uma prova de vida de cada Governo. 

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