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Domar Trump

A combinação de políticas numa administração pragmática de Trump seria ideologicamente inconsistente e moderadamente negativa para o crescimento. Mas seria muito mais aceitável para os investidores - e para o mundo - do que a agenda radical que ele prometeu aos seus eleitores.

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Agora que Donald Trump venceu inesperadamente a presidência dos Estados Unidos, resta saber se governará de acordo com o populismo radical da sua campanha ou se vai adoptar uma abordagem pragmática e centrista.

 

Se Trump governar de acordo com a campanha que o levou a ser eleito, podemos esperar sustos nos mercados, nos Estados Unidos e em todo o mundo, assim como danos económicos potencialmente significativos. Mas há boas razões para esperar que ele vá governar de forma muito diferente.

 

Um Trump populista radical destruiria a Parceria Transpacífico (TPP), revogaria o Tratado de Livre Comércio da América do Norte (NAFTA) e imporia elevadas tarifas sobre as importações chinesas. Também construiria o prometido muro entre os Estados Unidos e o México; deportaria milhões de trabalhadores ilegais; restringiria os vistos H1B para os trabalhadores qualificados necessários no sector da tecnologia; e revogaria totalmente o Affordable Care Act (Obamacare), deixando milhões de pessoas sem seguro de saúde.

 

De forma geral, um Trump radical aumentaria significativamente o défice orçamental dos Estados Unidos. Reduziria acentuadamente os impostos pagos pelas empresas e pelos mais ricos. E, ainda que aumentasse a base tributária e encorajasse as empresas a repatriar os lucros obtidos no estrangeiro, o seu plano não seria neutro em termos de receita. Trump aumentaria os gastos militares e os gastos do sector público em áreas como a infraestrutura, e os seus cortes nos impostos pagos pelos mais ricos reduziriam as receitas do governo em 9 biliões de dólares ao longo de uma década.

 

Um Trump radical também mudaria drasticamente a actual abordagem de política monetária – em primeiro lugar, substituindo a presidente da Reserva Federal dos Estados Unidos, Janet Yellen, por um falcão monetarista, e depois preenchendo as actuais e futuras vagas na Fed com mais do mesmo. Além disso, revogaria o que pudesse das reformas financeiras Dodd-Frank; eliminaria o gabinete de protecção financeira ao consumidor; cortaria subsídios de energia alternativa e regulamentos ambientais, e todos os outros regulamentos que supostamente penalizam as grandes empresas.

 

Por fim, a política externa de um Trump radical desestabilizaria as alianças dos Estados Unidos e intensificaria as tensões com os rivais. A sua postura proteccionista poderia incitar uma guerra comercial global, e a sua insistência na necessidade de os aliados pagarem pela sua própria defesa poderia levar a uma proliferação nuclear perigosa, diminuindo, ao mesmo tempo, a liderança americana no cenário mundial.

 

Mas é mais provável que Trump siga políticas pragmáticas e centristas. Para começar, Trump é um empresário que aprecia a "arte do negócio". Por isso, é mais um pragmático do que um ideólogo. A sua decisão de concorrer como populista foi uma táctica e não reflecte necessariamente crenças arraigadas.

 

Na verdade, Trump é um magnata do imobiliário que viveu a vida toda rodeado por outros empresários ricos. É um comerciante experiente que aproveitou o zeitgeist político agarrando os republicanos da classe trabalhadora e os "democratas Reagan", alguns dos quais podem ter apoiado o senador de Vermont Bernie Sanders nas primárias democratas. Isso permitiu que ele se destacasse num campo lotado de políticos tradicionais pró-negócio, pró-Wall Street e pró-globalização.

 

Uma vez no cargo, Trump irá lançar carne simbólica aos seus apoiantes, ao mesmo tempo que reverte para o lado da oferta tradicional e, aos poucos, para as políticas económicas que os republicanos têm favorecido durante décadas. A escolha de Trump para a vice-presidência, Mike Pence, é um político estabelecido do Partido Republicano, e os conselheiros económicos da sua campanha foram empresários ricos, financiadores, empreendedores imobiliários e economistas do lado da oferta. Além disso, já está a considerar o nome de republicanos populares para o seu gabinete, incluindo o ex-presidente da Câmara dos Representantes Newt Gingrich, o senador do Tennessee Bob Corker, o senador do Alabama Jess Sessions, e o antigo executivo do Goldman Sachs, Steven Mnuchin (que também foi conselheiro da sua campanha).

 

Os republicanos tradicionais e os líderes empresariais que Trump deverá nomear moldarão as suas políticas. O poder executivo adere a um processo de tomada de decisão no qual os departamentos e agências relevantes determinam os riscos e recompensas de determinados cenários e, em seguida, fornecem ao presidente um menu limitado de opções de políticas. E, dada a inexperiência de Trump, ele será ainda mais dependente dos seus conselheiros, assim como aconteceu com os ex-presidentes Ronald Reagan e George W. Bush.

 

Trump também será empurrado mais para o centro pelo Congresso, com o qual terá que trabalhar para aprovar qualquer legislação. O presidente da Câmara, Paul Ryan, e a liderança republicana no Senado têm uma visão mais tradicional do Partido do que Trump sobre o comércio, a migração e os défices orçamentais. Ao mesmo tempo, a minoria democrata no Senado será capaz de obstruir todas as reformas radicais que Trump propuser, especialmente se tocarem no terceiro trilho da política americana: Segurança Social e Medicare.

 

Trump também será controlado pela separação de poderes do sistema político americano, agências governamentais relativamente independentes, como a Fed, e uma imprensa livre e vibrante.

 

Mas o próprio mercado será o maior constrangimento de Trump. Se ele seguir políticas populistas radicais, a resposta será rápida e punitiva: as acções vão descer, o dólar vai cair, os investidores vão fugir para os títulos do Tesouro dos EUA, os preços do ouro vão subir, e assim por diante. No entanto, se Trump mesclar políticas populistas mais benignas com outras pró-negócios, não enfrentará uma queda no mercado. Agora que ganhou as eleições, tem poucos motivos para preferir o populismo à segurança.

 

Os efeitos de uma presidência pragmática de Trump seriam muito mais limitados do que no cenário radical. Primeiro, ele abandonaria na mesma o TPP; tal como Hillary Clinton o faria. Trump afirmou que revogaria o NAFTA, mas provavelmente tentará ajustá-lo como um aceno aos operários americanos. E mesmo que um Trump pragmático quisesse limitar as importações da China, as suas opções seriam limitadas por uma recente decisão da Organização Mundial do Comércio contra tarifas de "dumping direccionado" sobre produtos chineses. Os candidatos muitas vezes criticam a China durante as suas campanhas eleitorais mas, uma vez no poder,  percebem rapidamente que a cooperação é do seu próprio interesse.

 

Provavelmente, Trump construirá o seu muro na fronteira com o México, embora a chegada de novos imigrantes seja agora menor do que no passado. E, provavelmente, só vai deportar imigrantes ilegais que tenham cometido crimes violentos, em vez de tentar deportar 5 a 10 milhões de pessoas. Ao mesmo tempo, poderá limitar os vistos para trabalhadores altamente qualificados, o que irá esgotar parte do dinamismo do sector da tecnologia.

 

Um Trump pragmático ainda poderá gerar défices orçamentais, embora menores do que no cenário radical. Se ele seguir o plano de impostos proposto pelos republicanos do Congresso, por exemplo, as receitas serão reduzidas em apenas 2 biliões de dólares ao longo de uma década.

 

Na verdade, a combinação de políticas numa administração pragmática de Trump seria ideologicamente inconsistente e moderadamente negativa para o crescimento. Mas seria muito mais aceitável para os investidores - e para o mundo - do que a agenda radical que ele prometeu aos seus eleitores.

 

Nouriel Roubini é presidente da Roubini Global Economics (www.roubini.com) e é professor de Economia na Stern School of Business, da Universidade de Nova Iorque.

 

Copyright: Project Syndicate, 2016.
www.project-syndicate.org
Tradução: Rita Faria

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