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Luigi Zingales - Professor de Finanças 30 de Julho de 2013 às 12:44

Bancos alemães no topo

A superação da actual crise económica da União Europeia, como quase toda a gente reconhece, exige uma maior integração, com o primeiro passo a assumir a forma de uma união bancária supervisionada pelo Banco Central Europeu. Mas a união bancária da Europa também requer regras uniformes para liquidar instituições financeiras insolventes – e é aqui que está o ponto da discórdia.

A Alemanha opôs-se ao novo mecanismo de resolução bancária, proposto pela Comissão Europeia, o que gerou apoio moral e político dentro de portas, ao descrever a sua posição como um esforço para proteger os contribuintes germânicos: Por que é que as formigas alemãs devem pagar pelos gafanhotos do sul europeu? Na realidade, a posição da Alemanha é um estratagema para esconder o seu comportamento anti-concorrencial, onde o governo subsidia os bancos e a indústria alemã às custas de toda a gente – incluindo dos contribuintes germânicos.

 

O mercado comum europeu é o maior sucesso da política europeia no pós-Segunda Guerra Mundial, impulsionando o crescimento económico e dinamizando o intercâmbio cultural. Mas um mercado comum exige igualdade de circunstâncias e a Comissão Europeia tem trabalhado bastante, ao longo dos anos, para alcançá-la em muitos sectores.

 

Até agora, a principal excepção foi a banca. A emergente união bancária não é apenas o primeiro passo para uma união orçamental europeia; é também o passo final para a conclusão do mercado comum europeu. Sem um mecanismo de resolução comum que iguala todas as condições, o mercado comum vai permanecer inacabado.

 

Na teoria, as regras da banca da União Europeia são comuns a todos os Estados-membros. Na prática, a sua implementação estava, até há pouco tempo, nas mãos dos reguladores nacionais, que aplicavam padrões muito distintos. Mais importante que isso, enquanto os subsídios estatais a outros sectores são proibidos, são comummente aceites no sector financeiro – não só subsídios explícitos, como os resgates da Alemanha a vários bancos regionais depois da crise americana do “subprime”, mas também subsídios implícitos. Alguns operadores da banca francesa vangloriam-se abertamente do apoio dado pelo governo francês, que nunca irá deixar os bancos falirem.

 

Infelizmente, este não é um problema apenas francês ou alemão. Todos os intervenientes do mercado sabem que os governos europeus não vão deixar os grandes bancos entrarem em bancarrota. Este subsídio implícito custa milhões de euros aos contribuintes de cada um dos países; também distorce a concorrência, porque nem todos os subsídios implícitos são criados de igual forma. Independentemente dos seus fundamentais, um banco alemão será considerado mais seguro do que um congénere italiano, porque a garantia implícita do governo alemão é muito mais valiosa do que a do governo italiano.

 

Como consequência disso, os bancos alemães têm menores custos de financiamento e – se tudo o resto for semelhante – maiores lucros. Tendo em conta que os custos mais baixos se reflectem nos seus clientes, também as empresas industriais na Alemanha desfrutam de um mais baixo custo de capital, dando-lhes uma vantagem desleal face aos concorrentes europeus.

 

Uma das formas de impedir esta distorção será a criação de um mecanismo para resgatar todos os bancos com dinheiro europeu. Mas esta abordagem não iria apenas deixar os contribuintes alemães numa posição difícil; também iria criar incentivos perversos em todo o sistema financeiro europeu, acabando por maximizar a instabilidade.

 

A alternativa preferida é a constituição de um mecanismo de resolução comum, que seria aplicado em toda a Europa, independentemente do país de origem do banco. Tal mecanismo iria evitar a necessidade de uma intervenção estatal.

 

A proposta recente de Michel Barnier, o comissário europeu para o Mercado Interno e Serviços, é um esforço para implementar esta solução. Ela proporciona um mecanismo de resolução comum para todos os bancos na Europa, o que obriga a que as perdas sejam absorvidas pelos accionistas, pelos obrigacionistas e por grandes depositantes antes de ser necessário dinheiro estatal. Para fornecer financiamento a curto prazo para determinado banco durante a sua reestruturação, o plano da Comissão passa por criar um Fundo Europeu, colocando todos os bancos em igualdade de circunstâncias.

 

A proposta da Comissão está longe de ser perfeita. Depois de os accionistas de um banco serem dizimados e de os credores assumirem um desconto de 8%, o Fundo Europeu transforma-se a ele próprio num fundo de resgate, o que justifica alguns dos receios da Alemanha. E não há nenhuma proibição explícita de alguma forma de resgates nacionais.

 

Ainda assim, a proposta é um passo na direcção certa. A crítica alemã deverá ser direccionada para melhorá-la e não para enterrá-la.

 

Os contribuintes germânicos pagaram caro pelos erros dos seus bancos. Em 2008, quando se descobriu que os Landesbanks [um grupo de bancos organizados a nível regional] estavam recheados de hipotecas “subprime”, o governo alemão resgatou-os com um pacote de 500 mil milhões de euros à custa dos contribuintes. Em 2010, quando os bancos alemães estavam demasiados expostos – em torno de 704 mil milhões de euros – à Grécia, Irlanda, Itália, Portugal e Espanha, os contribuintes europeus e o Banco Central Europeu ajudaram-nos a que o dinheiro regressasse a casa. A maior ameaça para os contribuintes alemães não é a falta de regras no sul da Europa mas os seus próprios bancos.

 

Neste sentido, a união bancária não é um esquema para causar maiores encargos aos contribuintes alemães com as perdas dos bancos falidos do sul da Europa; em vez disso, é um mecanismo para tornar todos os bancos (incluindo os alemães) responsáveis pelos seus próprios erros, reduzindo os custos que se impõem aos contribuintes domésticos. É tempo de os eleitores germânicos perceberem que os maiores gafanhotos estão no centro das suas próprias cidades.

 

Luigi Zingales é professor de empreendedorismo e finanças na Universidade de Chicago e autor do livro "A Capitalism for the People: Recapturing the Lost Genius of American Prosperity". 

 

Copyright: Project Syndicate, 2013.
www.project-syndicate.org

Tradução: Diogo Cavaleiro

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