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Singularidade

Segundo a Lei de Moore, um dia os computadores atingirão uma capacidade de processamento superior à do nosso cérebro.

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Começou a falar-se em singularidade, no sentido abordado neste texto, quando se percebeu que a impressionante progressão no desenvolvimento de algumas tecnologias iria resultar em imprevisíveis consequências. Um primeiro contributo para esta questão foi dado logo em 1965 quando Gordon Moore da Intel constatou que a capacidade de instalar transístores num centímetro quadrado duplicava cada ano. Em meados da década de 70 esse período passou para dois anos, facto que tem sido mantido e deve durar pelo menos mais uma década. A isto chamou-se a Lei de Moore. Ora, basta fazer contas. Segundo esta lei, um dia os computadores atingirão uma capacidade de processamento superior à do nosso cérebro. É esse momento a que se deu o nome de singularidade. Ou seja esse instante singular e único na história que assinala o dia em que a máquina atingirá maior capacidade «mental» do que um humano.

A possibilidade de darmos origem a uma inteligência mais inteligente do que a nossa terá consequências inimagináveis. Algumas delas paradoxais, pois não conseguimos sequer conjecturar o que fará uma tal entidade por evidente falta de capacidade da nossa parte. O que acontecerá então? Será o fim da civilização ou pelo contrário um novo impulso que permitirá resolver muitos dos problemas com que actualmente nos debatemos? Ninguém sabe.

Sintomático do espírito científico do nosso tempo é que tais questões se coloquem tão intensamente. O debate sobre a singularidade é muito activo no meio académico e também entre os amadores da ciência, o que não deve ser menosprezado, porque levanta muitos outros tipos de reflexões importantes. É desde logo evidente que tais progressões apresentam um horizonte para além do qual não se pode ir, pois tal entraria em contradição com os fundamentos do universo. A velocidade da luz é um limite; assim como, no campo da miniaturização, existirá um momento em que não se pode fabricar mais pequeno. Por isso alguns dizem que esta particular singularidade, a da máquina mais inteligente do que o homem, nunca se produzirá. E, pelo contrário, há quem se atreva, e são muitos, a apontar a data de 2035 como o momento em que tal terá lugar.

Bastante interessante também tem sido a derivação do conceito para outras áreas. No aumento populacional, por exemplo. A continuar à taxa actual chegará um dia em que o planeta não conseguirá sustentar tanta gente. O que sucederá então? Iremos assistir à quase extinção da espécie, como aconteceu na Ilha da Páscoa, quando a competição entre tribos para erguer as enormes estátuas de pedra levou a que se cortassem todas as árvores, necessárias para arrastar os megálitos, e daí sucedeu o fim da agricultura e a fome generalizada?

Mas olhando para o mundo actual é legítimo imaginar um outro evento singular de proporções catastróficas que poderá ocorrer a qualquer instante. Estamos a assistir a uma escalada de violência sem precedentes. Não tanto porque a história não seja fértil em barbaridades, conflitos religiosos, fanatismos e falta de bom senso. Mas porque hoje temos meios de destruição nunca vistos. A guerra contra o terrorismo, tal como é conduzida, poderá levar o campo do terrorismo, e precisamente porque é mais fraco, a utilizar os grandes meios. Depois dos aviões de Nova Iorque o próximo passo será um engenho atómico ou uma qualquer arma bacteriológica e igualmente mortífera. Se tal vier a acontecer, e as probabilidades são enormes, o que fará o mundo? No dia em que uma cidade inteira for destruída por um atentado com uma bomba nuclear o que restará do mundo civilizado?

É por isso que embora parecendo mais próprias dos livros de ficção científica e das utopias negras, tais questões têm que ser debatidas, ponderadas e analisadas na sociedade e, em particular, no debate cívico e político. As opções que se tomam não podem deixar de ter em conta os cenários possíveis. Ou seja, e posto de outro modo, será que as nossas sociedades democráticas que perdem tanto tempo a discutir ninharias, imediatismos e matérias obsoletas, têm capacidade para pensar a realidade do mundo contemporâneo? Duvido.

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