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19 de Março de 2009 às 12:00

Os filhos da mãe dos salários

O mundo anda um bocado louco, é preciso dar o desconto. Mas o ataque aos salários altos, feito desta forma, é pólvora ao sol. Armando Vara e Zeinal Bava foram ontem atirados para o pelourinho, amanhã serão outros. Pelo que fazem? Não: pelo que ganham. Será que o Bloco de Esquerda está a governar e não demos conta?

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O mundo anda um bocado louco, é preciso dar o desconto. Mas o ataque aos salários altos, feito desta forma, é pólvora ao sol. Armando Vara e Zeinal Bava foram ontem atirados para o pelourinho, amanhã serão outros. Pelo que fazem? Não: pelo que ganham. Será que o Bloco de Esquerda está a governar e não demos conta?

A polémica dos salários é antiga, mas ficou actual com o colapso da banca: é incompreensível que os gestores que deram cabo disto fossem pagos em ouro; é imoral que tenham sido despedidos com pára-quedas dourados; é escandaloso que a AIG, que já sugou 180 mil milhões aos contribuintes americanos, tenha agora distribuído 165 milhões de dólares em bónus a gestores. Citando Marx, o Groucho, há homens que deviam ter vergonha de estar em empresas que os aceitam como presidentes.

Em Portugal, não houve nenhum destes casos. O único banco que pagava acima do que a decência recomenda era o BCP, no tempo de Jardim Gonçalves e, apesar de menos, também no de Teixeira Pinto. Desta vez, o caso Armando Vara não é um caso: o homem foi ganhar o dobro para o BCP porque na Caixa se paga menos que no resto da banca. Eis um bom exemplo sobre a relatividade: Vara e Santos Ferreira foram ganhar de mais, pois duplicaram o salário face ao da Caixa? Ou de menos porque o seu salário é cinco vezes menor que o dos seus antecessores?

Ao professar que os salários da PT devem baixar, Mário Lino está não só a meter o bedelho numa empresa privada como a ser mais moralista que moralizador. Quer transparência? Faz bem. Pode começar pelo seu próprio Ministério, pela TAP, pela CP, pela Refer, onde é impossível fazer escrutínio.

A PT tem comissão de vencimentos e as declarações de Lino são uma pressão sobre o que esta vai definir para a próxima administração da empresa. Mesmo que tenha razão, Lino optou pela forma errada: pela pressão pública e mediática. É "oportunismo", como bem disse ontem Sócrates.

É, até, injusto. Granadeiro e Zeinal merecem sair destes três anos na PT sem este anátema da ganância. A sua administração reduziu o números de chefias, limpou mordomias, eliminou um "andar" de antigos gestores perpétuos; congelou salários acima de 2.900 euros; reduziu o peso dos salários face aos dividendos, lucros e receitas, tendo aumentado dividendos, lucros e receitas - e impostos pagos.

Sobretudo: a retórica de Lino é incendiária numa altura em que o mundo está dividido entre privilegiados e proscritos - e ninguém sabe muito bem quem está de um lado ou do outro. Está a instalar-se um horror ao lucro que só apraz aos populistas. O moralismo está para a moral como o justicialismo está para a justiça: é o seu inverso. Não tarda estamos a apedrejar Mercedes novos. Outra vez.

Um óptimo exemplo foi ontem dado por uma empresa do próprio Ministério das Obras Públicas: pela primeira vez, a Carris deu lucro operacional. É uma notícia notável, conseguida depois da empresa passar a ter contrato de gestão e objectivos. Porque cortou carreiras, reduziu custos, reestruturou, subiu produtividade, mostrou-se que é possível gerir transportes de forma economicamente viável. Agora, a administração vai receber prémios. Ficamos horrorizados com a "ganância" de Silva Rodrigues? Ou elogiamos a sua gestão?

Felizmente, o homem que está à frente deste País está contra o "oportunismo" e o discurso "da mais pura inveja social". Ambição não é ganância e política não é demagogia. Mas uma e outra podem ser inveja. Cuidado com o fogo. É facílimo ateá-lo, difícil é apagá-lo.




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