Opinião
O apertar da tarraxa
O bloqueio ocidental do Irão ficou completo com a entrada em vigor este mês das sanções da UE interditando o seguro de transporte de crude e a aquisição de petróleo a Teerão.
O bloqueio ocidental do Irão ficou completo com a entrada em vigor este mês das sanções da UE interditando o seguro de transporte de crude e a aquisição de petróleo a Teerão.
Obrigar o Irão a renunciar a um programa nuclear passível de uso militar é objectivo da UE e de Washington, tal como das sanções decretadas pela ONU, mas após o fracasso das negociações entre Teerão e os membros permanentes do Conselho de Segurança mais a Alemanha, é pouco crível que estas pressões venham a surtir efeito.
A semana começou, entretanto, com exercícios militares iranianos e lançamento de mísseis "Shahab" de longo alcance (1300 Km) e ameaças de parlamentares de Teerão de eventual bloqueio do estreito de Ormuz a navios que transportem crude para países que apliquem sanções.
A um nível mais prosaico o governo de Teerão anunciou a suspensão de aumentos de preços de produtos alimentares, água e energia, no âmbito de um programa a cinco anos de eliminação de subsídios iniciado em Dezembro de 2010, enquanto o Banco Central referia dispor de 150 mil milhões de dólares em divisas para fazer frente à ofensiva ocidental.
Ante a iminência de novas sanções a quebra na produção e exportações de petróleo já se tinha feito sentir.
Os 3,3 milhões de barris/dia extraídos em Maio reduziram-se para 2,95 milhões em Junho, de acordo com estimativas da "Reuteurs", prevendo a "Agência Internacional de Energia" que o Irão venha produzir menos 1 milhão de barris/dia no segundo semestre deste ano.
Neste cenário a Arábia Saudita mantém altos níveis de extracção e o Iraque ultrapassou o Irão, tornando-se no segundo maior produtor da OPEP que, em Junho, extraiu 1,63 milhões de barris/dia acima do tecto de 30 milhões acordado entre os 12 estados, ainda que o crude tenha caído de 130 USD em Março para menos de 90 USD no mês passado.
Para Teerão à perda do mercado da UE, que representava 18% das exportações, vêm juntar-se reduções nas aquisições da Coreia do Sul, Japão, Índia e China.
A prazo a China e a Índia não prescindirão do crude iraniano para evitar uma excessiva dependência das monarquias do Golfo sujeita a garantia em última instância de defesa e segurança por parte dos Estados Unidos.
Nesta fase, contudo, Pequim e Nova Deli salvaguardam os seus interesses a troco de concessões e descontos nas compras de petróleo que Teerão terá de acomodar para reduzir prejuízos.
Vendas através de empresas de fachada, o recurso a troca directa, pagamentos em ouro ou divisas distintas do dólar e do euro, não compensarão as perdas num sector que representa 80% das exportações e metade das receitas do orçamento do Irão.
Teerão não conta com indústrias que evitem o recurso a importações significativas de artigos de consumo corrente e bens de capital, confronta-se com a desvalorização do rial (perda em relação ao dólar superior a 50% num ano) e uma taxa oficial de inflação anual que, em Maio, atingiu os 22,2%.
O Irão corre o risco -- apesar de a dívida pública rondar apenas 9% do PIB – da deterioração dos saldos positivos do orçamento e da balança de pagamentos provocar uma espiral inflacionista e uma contracção económica superior aos 1% previstos para este ano e aos 0,7% estimados para 2013 pelo "Banco Mundial".
O regime tem resistido às sanções que os Estados Unidos começaram a impor desde 1992 para conter o programa militar nuclear, posteriormente acompanhadas de restrições aprovadas pela ONU e ampliadas por estados aliados de Washington.
O boicote comercial, económico e financeiro falhou até agora os seus objectivos políticos e nada indica que os decisores políticos iranianos não estejam dispostos a arrostar com os custos do desafio a velhos inimigos.
As sanções internacionais criaram sérias dificuldades à prossecução de programas de desenvolvimento de armas de destruição maciça no Iraque e na Líbia, mas, do ponto de vista preponderante no Irão, os exemplos de Saddam Hussein, Gaddafi e da Coreia do Norte, no pólo oposto, provam que um estado em confronto com Washington só garante alguma imunidade perante um ataque militar se dispuser de meios de retaliação.
O apertar da tarraxa surge numa altura em que Teerão aposta que um ataque israelita seja contido por Washington, aguardando, de resto, pelos resultados das eleições de Novembro para a Casa Branca antes de eventualmente optar por novas tácticas para protelar concessões.
O bloqueio económico, comercial e financeiro dos Estados Unidos e da União Europeia é mais uma frente de combate num conflito que caminha para um confronto letal.
barradas.joaocarlos@gmail.com
Obrigar o Irão a renunciar a um programa nuclear passível de uso militar é objectivo da UE e de Washington, tal como das sanções decretadas pela ONU, mas após o fracasso das negociações entre Teerão e os membros permanentes do Conselho de Segurança mais a Alemanha, é pouco crível que estas pressões venham a surtir efeito.
A um nível mais prosaico o governo de Teerão anunciou a suspensão de aumentos de preços de produtos alimentares, água e energia, no âmbito de um programa a cinco anos de eliminação de subsídios iniciado em Dezembro de 2010, enquanto o Banco Central referia dispor de 150 mil milhões de dólares em divisas para fazer frente à ofensiva ocidental.
Ante a iminência de novas sanções a quebra na produção e exportações de petróleo já se tinha feito sentir.
Os 3,3 milhões de barris/dia extraídos em Maio reduziram-se para 2,95 milhões em Junho, de acordo com estimativas da "Reuteurs", prevendo a "Agência Internacional de Energia" que o Irão venha produzir menos 1 milhão de barris/dia no segundo semestre deste ano.
Neste cenário a Arábia Saudita mantém altos níveis de extracção e o Iraque ultrapassou o Irão, tornando-se no segundo maior produtor da OPEP que, em Junho, extraiu 1,63 milhões de barris/dia acima do tecto de 30 milhões acordado entre os 12 estados, ainda que o crude tenha caído de 130 USD em Março para menos de 90 USD no mês passado.
Para Teerão à perda do mercado da UE, que representava 18% das exportações, vêm juntar-se reduções nas aquisições da Coreia do Sul, Japão, Índia e China.
A prazo a China e a Índia não prescindirão do crude iraniano para evitar uma excessiva dependência das monarquias do Golfo sujeita a garantia em última instância de defesa e segurança por parte dos Estados Unidos.
Nesta fase, contudo, Pequim e Nova Deli salvaguardam os seus interesses a troco de concessões e descontos nas compras de petróleo que Teerão terá de acomodar para reduzir prejuízos.
Vendas através de empresas de fachada, o recurso a troca directa, pagamentos em ouro ou divisas distintas do dólar e do euro, não compensarão as perdas num sector que representa 80% das exportações e metade das receitas do orçamento do Irão.
Teerão não conta com indústrias que evitem o recurso a importações significativas de artigos de consumo corrente e bens de capital, confronta-se com a desvalorização do rial (perda em relação ao dólar superior a 50% num ano) e uma taxa oficial de inflação anual que, em Maio, atingiu os 22,2%.
O Irão corre o risco -- apesar de a dívida pública rondar apenas 9% do PIB – da deterioração dos saldos positivos do orçamento e da balança de pagamentos provocar uma espiral inflacionista e uma contracção económica superior aos 1% previstos para este ano e aos 0,7% estimados para 2013 pelo "Banco Mundial".
O regime tem resistido às sanções que os Estados Unidos começaram a impor desde 1992 para conter o programa militar nuclear, posteriormente acompanhadas de restrições aprovadas pela ONU e ampliadas por estados aliados de Washington.
O boicote comercial, económico e financeiro falhou até agora os seus objectivos políticos e nada indica que os decisores políticos iranianos não estejam dispostos a arrostar com os custos do desafio a velhos inimigos.
As sanções internacionais criaram sérias dificuldades à prossecução de programas de desenvolvimento de armas de destruição maciça no Iraque e na Líbia, mas, do ponto de vista preponderante no Irão, os exemplos de Saddam Hussein, Gaddafi e da Coreia do Norte, no pólo oposto, provam que um estado em confronto com Washington só garante alguma imunidade perante um ataque militar se dispuser de meios de retaliação.
O apertar da tarraxa surge numa altura em que Teerão aposta que um ataque israelita seja contido por Washington, aguardando, de resto, pelos resultados das eleições de Novembro para a Casa Branca antes de eventualmente optar por novas tácticas para protelar concessões.
O bloqueio económico, comercial e financeiro dos Estados Unidos e da União Europeia é mais uma frente de combate num conflito que caminha para um confronto letal.
barradas.joaocarlos@gmail.com
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