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29 de Abril de 2008 às 13:59

Mobile commerce: crónica de um “boom” anunciado

Em meados de 2003, as receitas de toques para telemóvel alcançaram cerca de 10% do mercado global de música. As taxas de crescimento de acesso à Internet por dispositivos móveis faziam prever que este novo canal superasse, num curto espaço de tempo, as li

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Em uníssono, consultoras e académicos advogaram um fenómeno emergente de “marketing”, disruptivo quanto a receitas e actuais modelos de negócio. Os impactos do mobile commerce (m-commerce) atingiriam os mais diversos agentes: operadoras de serviços móveis, empresas presentes na Internet, fabricantes de telemóveis e entidades financeiras.

A realidade veio refrear este optimismo.

O desenvolvimento tecnológico dos dispositivos móveis (telemóveis, PDA, “smartphones”,...), conjugado com crescentes taxas de penetração de Internet e ambientes wireless, propiciaram uma convergência de serviços em soluções all in the pocket, anytime, anywhere: jogos, música, fotografia, televisão, Internet, publicidade, informação, localização, entre outros.

Simultaneamente, e segundo dados da Eurostat1, em 2006 a taxa média de penetração de telemóveis nos países europeus superou os 100%. Portugal não é excepção, e, segundo a ANACOM2, atingiu em 2007 uma penetração de 125%. Este facto, aliado a um rácio crescente de utilização dados/voz (OfCom statistics3), permite reunir todas as condições para auspiciar um enorme potencial para o m-commerce.

A publicidade foi um dos exemplos de rápido avanço na exploração deste canal. Diversas empresas do Reino Unido passaram a intermediar marcas e consumidores – estes últimos são tipicamente jovens que aceitam contrapartidas em chamadas e SMS, a quem se solicita feedback relativamente à publicidade distribuída. Várias marcas globais, como a MTV, Volvo, Sony Pictures, MacDonald’s, Coca-Cola, Pepsi, L’Oréal, Nike, Walt Disney e Adidas exploraram já, directa ou indirectamente, as potencialidade deste canal.

O consumidor encontra nos serviços por dispositivos móveis uma fonte de valor, conveniência e adequação ao seu estilo de vida, factos confirmados por vários estudos nos E.U.A., Coreia, Reino Unido e Finlândia. Contudo, há um desencontro evidente entre a oferta e as expectativas do consumidor. A falta de informação, a complexidade, a dificuldade de navegação ou o custo associado são repetidamente referidos pelos consumidores como barreiras à adopção dos serviços.

Dados relativos à utilização de dispositivos móveis para fins transaccionais revelam uma penetração marginal, alcançando, na Europa, uma decepcionante taxa de 6%4.

O diferencial entre o interesse dos consumidores pelos serviços por dispositivos móveis e a sua utilização real chega a superar, na Europa, os 50% para algumas formas de m-commerce, como os serviços financeiros (Sybase5), evidenciando o estado embrionário deste canal de distribuição.

A aposta de vários sectores de actividade, dos transportes à banca, do entretenimento ao transaccional, tem sido maioritariamente feita de forma experimental ou através de adaptações simplistas de conteúdos “on-line” já existentes. Em termos estratégicos, a integração com outros canais tende a ser imperativa, já que a informação disponibilizada para os dispositivos móveis é normalmente incompleta e necessita de outro meio complementar. Contudo, assiste-se a uma lógica dominante de ampliação multicanal sem privilegiar as especificidades do mesmo, ou tendo em conta as percepções do consumidor, factos que estarão certamente entre as causas da fraca expressão do m-commerce no momento actual.

Salienta-se ainda o enfoque excessivo na vertente tecnológica em detrimento da usabilidade e visibilidade dos serviços. São inúmeros os casos de serviços oferecidos em versões WAP, PDA, entre outras, algo que é, para muitos consumidores, indetectável e fonte de resistência ao uso efectivo. As comunicações por satélite dão o exemplo a seguir: não obstante a enorme complexidade tecnológica subjacente, os serviços televisivos por parabólica registam uma forte adesão. Não será alheio o facto de apenas ser mencionado o serviço oferecido e nunca a tecnologia utilizada. Assim, no contexto de m-commerce, de interactividade e conectividade, potenciadas pela tecnologia, as actividade de “marketing” das empresas terão de ser repensadas numa lógica centrada no serviço6.

Por outro lado, um dos inibidores do desenvolvimento de aplicações de m-commerce, visível na baixa quantidade e qualidade dos serviços oferecidos, reside na complexidade das aplicações, o que está patente no número de entidades envolvidas (produtores de conteúdos, fornecedores de aplicações, agregadores e fornecedores de serviços wireless/operadoras), protocolos, sistemas operativos, versões ou tipos de dispositivos móveis.

À semelhança do que aconteceu em finais da década de 90 do século passado com o e-commerce, a mesma euforia centra-se actualmente nos dispositivos móveis. Agora como então, só uma aposta enérgica e estruturada por parte das empresas poderá converter esta oportunidade numa realidade.

1) http://epp.eurostat.ec.europa.eu
2) http://www.anacom.pt/template12.jsp?categoryId=250442
3) http://www.ofcom.org.uk/research/
4) Kleijnen, M.; Ruyter, K. & M. Wetzels (2007). An assessment of value creation in mobile service delivery and the moderating role of time consciousness, Journal of Retailing. 83 (1), 33-46.
5)
http://www.sybase.com/detail?id=1054292
6) Vargo, S. & R. Lusch (2004). Evolving to a new dominant logic of Marketing, Journal of Marketing. 68 (1), 1-17.

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