Opinião
Como preocupar-se
Desde que há memória, as pessoas sempre se preocuparam com o futuro do planeta. Já acreditámos que um dia o céu cairia sobre nós. Mais recentemente, preocupámo-nos com o facto de o planeta poder congelar e, depois, com o facto de os sistemas tecnológicos
Esses receios desapareceram, mas actualmente o mundo tem muitos problemas reais e prementes. Pense no ambiente, na governação, na economia, na saúde ou na população e terá imensas razões para estar preocupado.
No entanto, lamentavelmente, tendemos a focalizar-nos apenas em algumas das grandes questões do Planeta e, dessa forma, acabamos por ficar com uma visão distorcida do mundo. A desflorestação é um desafio que já deu origem a manchetes alarmantes, à intervenção de celebridades e a um sentimento generalizado de angústia. Trata-se, sendo directo, de uma causa popular.
Assim sendo, parece surpreendente que a desflorestação seja entendida como um problema que pode ser relativizado. A solução não foi encontrada na condenação, por parte do Ocidente, das práticas dos países em desenvolvimento, nem nos protestos feitos por ambientalistas bem-intencionados, mas sim no crescimento económico. Os países desenvolvidos aumentam, de forma generalizada, as suas áreas florestais porque têm condições económicas para o fazer. Os países em desenvolvimento não têm essas condições. Para incentivarmos uma menor desflorestação – e uma maior reflorestação –, a melhor coisa que podemos fazer é ajudar as nações subdesenvolvidas a ficarem, rapidamente, mais ricas.
Alguns desafios não conseguem desencadear um sentimento generalizado de preocupação. Provavelmente, deveríamos preocupar-nos muito mais com as mudanças demográficas, que provocarão um declínio bastante acentuado na potencial mão-de-obra nos países ricos e um aumento do número de pessoas que dependem de pensões e de cuidados de saúde. Nos países mais industrializados, o emprego está concentrado numa estreita faixa etária, pelo que a diminuição da mão-de-obra provocará um declínio na produção - e deixar-nos-á numa situação menos próspera. Este problema atingirá até a própria China. Por isso, precisamos de começar a conversar sobre as opções – elevar a idade da reforma, aumentar a imigração proveniente dos países em desenvolvimento e reformar os mercados laborais.
Quando nos preocupamos excessivamente com algumas coisas, esquecemos outras, possivelmente muito mais importantes. No Ocidente, preocupamo-nos com a utilização de pesticidas nas colheitas. Esta questão tornou-se, de certa forma, um tema comum para os ambientalistas.
No entanto, a poluição do ar interior coloca um problema ambiental muito maior. Os gases libertados da lenha utilizada para cozinhar dentro de casa e do estrume vão matar mais de 1,5 milhões de pessoas este ano. Muitas delas serão crianças. Poderíamos combater o problema de forma relativamente pouco dispendiosa e eficiente se providenciássemos aparelhos de cozinhar (tais como fogões com chaminé) e combustível limpo aos que deles precisam, e se incentivássemos a secagem de combustível, as operações de manutenção dos fornos e das chaminés e o uso de embalagens para conservar o calor. Poderíamos, também, manter as vulneráveis crianças longe dos gases.
A maior preocupação em relação ao nosso planeta prende-se, evidentemente, com as mudanças climáticas. Trata-se de um problema sério, que requer uma resposta séria. Contudo, o nosso foco, limitado à redução das emissões de dióxido de carbono, levou-nos a olhar para o lugar errado na procura de respostas a outros desafios. Os prejuízos decorrentes dos desastres com o clima estão a aumentar, mas a razão não se prende com as alterações climáticas - como muitos assumem - mas sim com a demografia.
Há cada vez mais pessoas, com mais pertences, que vivem mais perto de locais de perigo. O pior é que muitos governos pouco têm feito para se prepararem para furacões, sismos ou inundações. Eles não fazem o suficiente para tentar convencer as pessoas a não viverem em locais de risco. Além disso, os planos de resposta são, regra geral, fracos.
A estreita focalização do debate climático nas reduções de emissões poluentes diminuiu a focalização na redução da vulnerabilidade. A Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas recusou-se financiar os esforços de preparação para desastres naturais, a menos que os Estados demonstrem exactamente de que forma é que os desastres que receiam estão associados às mudanças climáticas. Segundo um recente estudo da RAND, o financiamento dos EUA para a investigação com vista à diminuição de prejuízos decorrentes de desastres naturais ascendeu em 2003 a cerca de 127 milhões de dólares - o que correspondeu a apenas 7% da quantia investida na investigação sobre alterações climáticas nesse ano.
As políticas relativas às alterações climáticas não são a melhor forma de reduzir os efeitos dos desastres climatéricos. Na temporada dos furacões de 2004, a República Dominicana, que investiu em abrigos contra furacões e em redes de evacuação de emergência, registou menos de dez mortes. No seu vizinho Haiti, que não estava preparado, perderam-se duas mil vidas. Por que razão é que a vulnerabilidade ao desastre está classificada num nível tão baixo na lista das prioridades de desenvolvimento global?
Conforme sucede com todos nós, os governos tendem a focalizar a sua atenção num pequeno número de problemas planetários. Cada dólar que gastam em investigação sobre mudanças climáticas, por exemplo, é dinheiro que não está a ser canalizado para a investigação relativa à diminuição de prejuízos decorrentes de desastres naturais.
É essa a questão que abordo no meu novo livro, intitulado “Solutions for the World’s Problems”, no qual 23 conceituados investigadores se debruçam sobre 23 desafios globais. O livro permite, também, que os leitores definam as suas próprias prioridades: economistas de renome esboçam soluções e fornecem relações de custo-benefício para que as diferentes opções políticas possam ser comparadas em pé de igualdade, com o intuito de se identificarem as melhores, transformando-as em prioridades.
Apesar de tudo, se bem que não haja falta de ideias para solucionar as grandes questões, a verdade é que os governos e as organizações internacionais têm orçamentos limitados. Seria errado alegar que podemos resolver tudo de uma vez.
Não há problema que nos preocupemos com o planeta. Mas devemos ter a certeza que estamos a ter tudo em conta, para sabermos com o que é que devemos preocupar-nos primeiro.