Opinião
Carrilho e Carmona
Que sim, que o debate foi mau, muito mau.
Que Carrilho e Carmona discutiram como adeptos de futebol. Que ficou de fora a gestão da cidade, os transportes, a qualidade de vida. Que os candidatos à maior câmara do país se preocuparam em atacar e se esqueceram de defender. Defender o seu projecto, defender a cidade. Que ambos caíram na cilada que prepararam para o adversário, de irritar para capitalizar (teria sido fácil para qualquer dos dois ter «ganho» o debate, tal era a insânia do outro).
A disputa entre Carrilho e Carmona já não é pela cidade ou sequer pelo partido, tornou-se uma questão pessoal. Não houve um nem dois vencedores do debate na Sic Notícias. Houve três: Nogueira Pinto, Ruben de Carvalho e Sá Fernandes. Foi tão mau e indigente que os dois já pediram um novo »round», agora com grande audiência na TVI, porque as redacções da Capital já postularam que o âmbito se tornou nacional. Portugal é Lisboa.
Mas é uma farsa discutir projectos para Lisboa sem olhar para situação financeira pré-calamitosa da sua câmara. E disso, no debate, quase nada. Não é possível discutir projectos e reformas, emendas e adendas, sem dinheiro. Faltam números sobre as contas da edilidade mas não se desmente a dívida galopante, o défice crescente, dificuldades de tesouraria. Os investimentos não geram as receitas previstas, a câmara está a propôr a residentes de Lisboa para finaciarem eles mesmos arruamentos e jardins, como se não pagassem impostos para isso.
Não: a atrofia financeira das câmaras não é uma invenção do poder central. E sim, a situação é generalizada. Gasta-se mais do que se tem e mais do que se pode, há desorçamentações, parcerias público-privadas no seu pior e repetem-se erros que o poder central inaugurou e de que todos conhecemos – e pagamos – os erros.
É insultuoso ver as Autárquicas serem discutidas ignorando os buracos financeiros que povoam o país. Quem não tem dinheiro não tem vícios. Ou, pior ainda, tem vícios. E paga-os de outra forma: promessas incumpridas ou cumpridas à custa de mais receitas, de mais endividamento, de mais impostos ou por, use-se o eufemismo, cedências a interesses duvidosos.
Vida privada, apertos de mão ou retretes imaginárias não são argumentos. São manobras de diversão. Ou provas de falta de vocação democrática.