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23 de Março de 2007 às 13:59

All Pinho and Sir Espada

Manuel Pinho, extraordinário ministro, revelou a extraordinária ideia que se lhe emergiu, e declarou que, para "efeitos de promoção turística", o Algarve vai passar a ser conhecido por All Garve. O alvoroço dos algarvios, que, em tradução literal, ficaria

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Estes, os mais sábios e os mais graves, removeram as maneiras aprazíveis com as quais se apoiam para afirmar coisas importantes, e comentaram: "Este homem não sabe o que diz".

Sabe. Porém, não se dá muito por isso. E, quando por isso se dá, já o andamento vai acelerado. All Garve não é, apenas, uma latejante tolice: é um balúrdio que vai custar. E porquê esse conúbio mal resolvido entre o inglês All e a amputação portuguesa Garve? Despenhado sobre a nossa perturbação, Pinho asseverou que "o inglês é a língua de todos". Apoiou-se, certamente, na confusa lista de reclames, anúncios, apelos, sugestões, ofertas e vendas, garatujada por toda a faixa sul, num portuglês infame, porém patusco.

Manuel Pinho foi o rosto que apareceu a defender a ideia com galhardia. Com galhardia e vitoriosos sorrisos. Em primeira e última análise é ele o homem fatal. Todavia, quem foi o "criativo" que, esforçado, extraiu o mavioso estribilho, escabichando na meninge a originalidade do "conceito" e o epílogo no "pack shot"?

É uma ideia para o século em que vivemos. O futuro contra as destoantes normas do passado. Eis os comentários defensivos, a que a Imprensa deu algum eco. Manuel Pinho nasceu no século XX, mas é homem do XXI. Modestamente, e com perdão da palavra, sugiro ao querido ministro que, reclamando-se das mesmas exigências e com o mesmo talante, altere os nomes, por alheios e cediços às coisas do futuro, e passe a chamar de All Gés, All Cântara, All Fama, All Jezur, rejeitando, veemente, as denominações com mais de mil anos. E, já agora, altere a História, passe uma esponja desdenhosa sobre os três ou quatro episódios que ainda nos são familiares, com a mesma ardorosa simplicidade utilizada para conferir à tolice a majestade das decisões superiores.

No mesmo dia em que eram conhecidas as extraordinárias afirmações do extraordinário ministro, o austero "Expresso" inseria, nas suas respeitáveis colunas, um artigo, sob o estupendo título "Em Defesa da Câmara dos Lordes", assinado por João Carlos Espada. Num texto sincopado, levemente sentimental e um tanto nostálgico, o articulista lamentava-se do facto de a Câmara dos Lordes passar a ser "totalmente eleita", o que não acontecia até agora. Espada, triste, escreve que o funesto acontecimento "é muito decepcionante para os admiradores da tradição inglesa da liberdade". Percebe-se um soluço a embargar a voz do comentador. Não se percebe muito bem qual o conceito de democracia e de liberdade defendido pelo Espada.

Espada, que tem por salutar hábito frequentar a Câmara, onde não é tratado por "My Lord", incidente pesaroso, considera, aliás, "um ligeiro detalhe", de significado medíocre, a inexistência de eleições. É "uma das excêntricas peculiaridades que distinguem a liberdade inglesa", adverte. Combatendo, fero e audaz, essa inusitada disposição democrática, Espada ilumina a nossa desconsolada ignorância, comunicando que os pobres lordes não recebem salário, mas "têm modestas senhas de presença e um modestíssimo subsídio de transporte". Admite-se, assim, que vão democraticamente almoçar à cantina e que viajam em colectivos e democráticos transportes públicos, embora tenham à disposição "um belo bar com vista para o Tamisa", esclarece muito feliz.

Tudo leva a crer que o articulista Espada frequentou, algumas vezes, o amável recinto, bebericando xerez com beatitude e escutando com transporte e unção o verbo eloquente de Sir Karl Popper, amado mestre e amigo. Entretanto, lamenta-se do despropósito: "Uma nova Câmara dos Lordes, integralmente eleita, vai trazer vários problemas. Antes de mais, será caríssima, pois vão ter de pagar salários aos novos lordes. Depois, sendo eleita, vai ter de ter novos poderes. Isso será uma complicação adicional na já complicada Constituição britânica  -  tão complicada que nunca alguém conseguiu escrevê-la".

O pranto estende-se pelo artigo, deixando o leitor desamparado e seriamente aflito com o trágico destino dos "setecentos e tal" lordes, que "já foram mil e duzentos". Os comovidos frequentadores habituais dos artigos de Espada interrogaram-se: "E agora, que será da Inglaterra?" O drama atingia proporções nunca vistas nem sequer adivinhadas. Telefonemas, SMS, telegramas, circularam de um para outro lado: "Que se passa? Que se passa?" Ninguém sabia responder a estas dilemáticas interrogações. Porém, o suspense foi atenuado. Espada, sempre no segredo dos deuses, sempre a beber do fino, atenuou a pesada carga que depusera nos ombros dos seus milhões de leitores. Soltando fundos suspiros de alívio, pressuroso e regozijante, o inadiável Espada escreveu: "Correcção final: ainda a tempo, recebo secreta informação de Londres. A votação na Câmara dos Comuns foi a melhor forma de manter a Câmara dos Lordes tal como está (?) Ainda há esperança".

Há? Para quem? Para o Espada?

APOSTILA -  A barafunda no CDS começou quando ao nome fundador do partido se juntou o acrónimo PP, subrepticiamente designando Paulo Portas, seu animoso padrinho. Portas é o Portas: um azougue, um arrogante, uma indigestão de sobranceria, um egocêntrico, um megalómano. Portas parece uma bomba desfolhante: pulveriza Monteiro, Freitas, Castro, Maria José, apaga Adriano, Lucas, Amaro. Portas é um estalinista de direita. Portas suprime retratos, extingue a História, elimina o seu Trotski, o seu Bukarine, o seu Kameneve. Portas não tem amigos, apenas dispõe de instantes de amizade. Ninguém o ama nem ele ama ninguém. Ninguém o quer nem ele quer a ninguém. Usa e é usado. Não lega ao futuro um traço fundo: deixa no presente uma baba de caracol. As pessoas a sério não o tomam a sério. É o gozo de um jornalismo vácuo. É a triste figura de um triste tempo. Haverá hesitações de análise sobre a personalidade intelectual, moral, ideológica e política de Maria José Nogueira Pinto e a sombra fugidia de um homem que já foi quase tudo e, rigorosamente, quase nada é?

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