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03 de Julho de 2012 às 23:30

A Estrada de Chernobyl

Só na Bielorrússia, cerca de 8 mil quilómetros quadrados de terras, uma área quase do mesmo tamanho de todos os terrenos agrícolas da Suíça, foram inutilizados pela radiação durante vários anos.

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Como uma Pompeia dos tempos modernos, as estradas e os edifícios de Prypyat ficaram congelados por um desastre. Mas, ao contrário da erupção do vulcão Vesúvio há quase dois mil anos, Prypyat foi destruída por uma catástrofe artificial – e, por isso, evitável.

Ervas daninhas e uma desolação cinzenta é tudo o que prospera nesta comunidade outrora agitada, que abrigava os trabalhadores da condenada central nuclear de Chernobyl, cujo colapso devastador, há 26 anos, ainda provoca danos físicos e socio-económicos em muitas pessoas na Ucrânia e nos países vizinhos. Naquela altura, o mundo ficou, por um instante, chocado com a loucura da tecnologia nuclear. Mas, tal como em Hiroshima, Three Mile Island, ou Fukushima, no ano passado, o desânimo global foi muito fugaz.

Esta miopia é um sintoma do constante crescimento populacional, a que se junta as economias orientadas pelo consumo e a procura crescente por energia barata. Mas os riscos superam claramente os supostos benefícios. Embora os defensores da energia nuclear afirmem muitas vezes que apenas existiram duas grandes calamidades, um quadro muito diferente surge se considerarmos outros "acidentes" que causaram a perda de vidas humanas ou danos materiais significativos.

Entre 1952 e 2009, registaram-se, pelo menos, 99 acidentes nucleares, com um custo de mais de 20,5 mil milhões de dólares, ou mais de um incidente e 330 milhões de dólares em danos causados, em cada ano. Esta taxa de recorrência demonstra que muitos riscos não estão a ser bem geridos ou regulados, o que é preocupante, para dizer o mínimo, especialmente tendo em conta os danos que um único acidente grave pode causar. O colapso de um reactor de 500 mega watts, localizado a 50 quilómetros (31 milhas) de uma cidade causaria a morte imediata de cerca de 45 mil pessoas, ferimentos graves a outras 70 mil, e prejuízos materiais na ordem dos 17 mil milhões de dólares.

Durante uma visita a Chernobyl, em Abril, fiquei a saber de um novo projecto que será construído até 2015, uma espécie de "abrigo" para bloquear a radiação que ainda emana do reactor. O preço está estimado em 1,5 mil milhões de euros (1,9 mil milhões de dólares). Mas este sarcófago não é mais do que um penso rápido exageradamente caro, que será arrancado de uma ferida ainda purulenta em 100 anos, altura em que se espera que uma solução definitiva já tenha sido encontrada.

Chernobyl continua cercada por uma zona de exclusão de 30 quilómetros, deixando terras outrora férteis incapazes de serem cultivadas pelos agricultores locais. Só na Bielorrússia, cerca de 8 mil quilómetros quadrados de terras, uma área quase do mesmo tamanho de todos os terrenos agrícolas da Suíça, foram inutilizados pela radiação durante vários anos.

Depois, há a questão de quem paga para construir isso. Em princípio, o capital privado não flui para actividades sem fins lucrativos. Na verdade, ele está a fluir para fontes de energia renováveis, não atómicas. De acordo com um relatório de 2012, da "Pew Charitable Trusts", os Estados Unidos, por exemplo, investiram mais de 48 mil milhões de dólares em energias renováveis, em 2011, acima dos 34 mil milhões investidos em 2010, recuperando o primeiro lugar nos rankings mundiais de investimento em energia limpa.

São os governos – e, portanto, os contribuintes e os obrigacionistas – que financiam as centrais nucleares. Além disso, as alegadas "reduções de custos" da energia nuclear nunca incluem o preço dos subsídios governamentais directos e indirectos, do desmantelamento de instalações, e da limpeza e reparação das comunidades afectadas quando ocorrem desastres – de novo, às custas dos contribuintes.

Em Fukushima, por exemplo, a conta final vai incluir os custos dos esforços heróicos de centenas de trabalhadores para resfriar os reactores da central; a perda prolongada da produção económica na zona de exclusão de 20 quilómetros (estimada em 128,5 mil milhões de dólares pela "Roubini Global Economics"); custos de desmantelamento e limpeza; e os custos de substituição de 4,7 giga watts de capacidade geradora. A acrescentar a tudo isto, existe a possibilidade de custos adicionais de saúde decorrentes da exposição à radioactividade.

Todos estes custos ocultos podem tornar o preço da energia nuclear maior do que o preço da mudança para as energias renováveis e o melhoramento da eficiência energética. Claro que, com 15 países a depender da energia nuclear para 25% ou mais da sua electricidade, não podemos abandoná-la do dia para a noite. Pelo contrário, as centrais nucleares estarão connosco por muitos anos.

Mas podem ser tomadas medidas. Por exemplo, estima-se que as medidas adequadas para o isolamento de edifícios ou para a concepção de novos sistemas de poupança de energia podem reduzir de 20 a 40% as facturas de energia eléctrica. Com cerca de 15% do fornecimento mundial de electricidade produzido por centrais nucleares, as medidas de poupança de energia podem percorrer um longo caminho para diminuir a dependência dessas mesmas centrais.

Países como o Brasil, com uma economia que está a crescer rapidamente e que depende da energia nuclear em 3% do total, estão a caminhar neste sentido. Responsáveis brasileiros anunciaram, em Maio, que o país não vai desenvolver o seu sector nuclear na próxima década, em parte por causa de Fukushima. O Brasil enviou assim uma clara mensagem a outras economias emergentes – como a Rússia, a Índia e a China – que o crescimento sustentável deve basear-se em fontes de energia renováveis e seguras.

Este passo do Brasil é também oportuno, chegando antes da Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável no Rio de Janeiro, ou Rio 20. Este encontro – apesar de algumas dúvidas – é crucial. Não temos alternativa se não abraçar a mudança, e eventos raros como o Rio 20 oferecem uma oportunidade para tirar a comunidade global do caminho do perigo.

Project Syndicate, 2012.
www.project-syndicate.org

Tradução: Rita Faria

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