Opinião
A reforma que nunca existiu
Depois das mais recentes decisões do Tribunal Constitucional, a reforma do Estado fica definitivamente na gaveta, de onde, aliás, parece nunca ter saído.
Pedro Passos Coelho anunciou que até ao final da legislatura não irá propor mais nenhuma reforma da Segurança Social, uma vez conhecida a decisão do TC que se opõe ao corte das pensões. Diga-se que o Governo ainda não entendeu que "reformar" não é cortar pensões nem vencimentos. "Reformar" é repensar funções e definir modelos de governação da "coisa pública". Enquanto este governo "liberal" não perceber o óbvio, continuamos alegremente a diminuir a eficiência pública, a desmotivar os funcionários e a "atrofiar" a economia em nome do financiamento do Estado, porque não há coragem onde existem interesses pessoais e apropriação privada das estruturas públicas, na "partidocracia" em que vivemos, que se habituaram a alimentar do sistema.
Existem soluções governativas, "constitucionalmente admissíveis" que permitem reduzir o peso do Estado na economia, nas áreas da Saúde, da Educação e da Segurança Social que passam por menos intervenção e mais regulação e necessariamente por menos necessidades de financiamento, que passam por sistemas de seguros e de responsabilização e regulação séria dos prestadores, porque o serviço público nunca foi nem deve ser monopolizado pelo Estado. Nada disto põe em causa o Estado Social, antes pelo contrário. O Estado Social está condenado se não for reformado o seu funcionamento e todo o sistema de gestão e administração pública.
Mais do que grandes ideólogos ou utópicos, fazem actualmente falta, em Portugal e na Europa, grandes estadistas mas com visão da sociedade e capacidade de projecção, com grande sentido prático e simplificador. As ideologias que conhecemos são produto do século passado e de contextos próprios e não se adaptam ao mundo global e às novas formas de organização social contemporâneas. A generalidade das instituições não se adaptaram às novas realidades sociais e económicas, ao nível da família, da demografia, da tecnologia, das empresas, no desenho de novos sistemas sociais e redefinição de funções. Insiste-se num modelo decrépito para regular um sistema novo. Não funciona. Os entraves e as dificuldades num país tão corporativista são inúmeras, mas se um governo "pseudo" liberal não o fez, quem o fará?
Mesmo limitando o recurso ao crédito (de que o Estado é o pior exemplo) é urgente que as famílias e empresas tenham mais rendimento disponível para estimular o emprego, o investimento e a produção. Sem procura interna nunca haverá crescimento. As exportações são importantes, mas são apenas uma ajuda para o crescimento. Até pela sua dimensão, Portugal nunca terá uma economia baseada na exportação.
O Orçamento de Estado para 2015 não trará novidades reformistas será apenas um orçamento de gestão do sistema. Continuando com a estratégia "botton-up" (apesar das orientações definidas pela DGO), o prazo para os organismos públicos enviarem as suas previsões de receitas e despesas, para efeitos de elaboração do Orçamento do Estado de 2015, terminou esta semana, com vários institutos a reclamarem mais verbas e a queixarem-se do subfinanciamento, sucessivo, apesar dos novos cortes salariais do setor público poderem entrar em vigor em a partir setembro. A reforma do Estado continua e continuará por fazer se a mesma for entendida e justificada com corte nas dotações para cumprimento da redução do défice público e rigor orçamental. Reforme-se extinguindo serviços e passando para o sector privado grande parte da saúde e da educação. A gestão privada é obrigada a ser mais eficiente do que a gestão pública, porque não se financia coercivamente como o Estado e não faz ideia o que é gerar valor financeiro. Apenas se preocupa (e nem sempre) com prestar serviço ao melhor custo. Caso contrário, continuamos a tentar curar cancros com aspirinas. Existiriam eventualmente custos sociais no curto prazo mas na certeza de recuperação rápida a médio prazo. Mas sobretudo haveria um critério estratégico. Uma visão para lá da mera gestão corrente do sistema moribundo e condenado à ineficiência por desajustamento da realidade.
Certo é que a dívida pública não para de crescer e está a ser sustentada pelos únicos agentes que geram valor e cada vez com mais dificuldade – famílias e empresas. O mesmo será dizer que continuamos alegremente a acelerar em direcção ao precipício, mas em vez de 200 km/hora vamos só a 100 km/hora. É esta a gestão do Governo. Infelizmente o destino e o caminho são os mesmos. Muda apenas a velocidade e o tempo em que lá chegaremos, adiando por uns "instantes" o embate.
Director do ISG - Business& Economics School
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