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31 de Janeiro de 2014 às 00:01

Apreciar Brueghel para gerir melhor

Para desfrutar, aprender, corrigir e aperfeiçoar, é preciso fazer comparações ricas. O poder da riqueza, neste sentido, é o de tornar as coisas mais interessantes. Mesmo, ou sobretudo, as pequenas coisas, tão importantes e tão pouco valorizadas nesta era de pressa e de olhares fugazes.

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O maior de todos os heróis intelectuais deste colunista do Negócios é Karl E. Weick, professor "emeritus" da Universidade de Michigan. Weick é um autor denso, nem sempre fácil de ler, por vezes difícil, mas sempre compensador. Os textos de Weick ajudam a pensar e sobretudo a mudar a forma de pensar. Entre os seus livros conta-se "The Social Psychology of Organizing", cuja segunda edição, datada de 1979, continua a ser amplamente citada. Para Weick as organizações são processos imperfeitos e impermanentes, em constante evolução. Por isso, mais do que falar em "organizations" (organizações), Weick escreve sobre os processos de organização ("organizing").  

 

Uma das sugestões de Weick é pouco ortodoxa, mas talvez valha a pena tentá-la. Como Weick tem repetido, uma maneira de ver é uma maneira de não ver. Na vida e nas organizações habituamo-nos rapidamente a certas maneiras de ver - chamemos-lhes rotinas, hábitos, paradigmas. Uma vez adquiridas, essas rotinas instalam-se. Tornadas habituais, deixam de ser questionadas: as coisas são assim porque sempre foram assim. E, no entanto, lá fora o mundo vai sendo reorganizado. As rotinas podem tornar-se fontes de rigidez e de complacência.

 

O que fazer? Procurar - o que não é fácil - manter um olhar fresco sobre a realidade. Cultivar a curiosidade. Como? Por exemplo, re-treinando o olhar para a diferença. Weick dá uma sugestão: da próxima vez que for a um museu, antes de ver a exposição propriamente dita vá à loja. Compre uns postais com reproduções de obras que se prepara para ver. Compare depois o postal e a obra. O postal com as suas imperfeições ajudá-lo-á a dar mais valor ao original. A reprodução não respeita a cor do original. O contraste não é tão convincente. E assim sucessivamente. A imperfeição do postal ajudará a realçar o génio do pintor. Uma coisa é mais rica por comparação com outra.

 

Pode já pôr a ideia em prática na exposição do Museu Nacional de Arte Antiga. Poder fazer o exercício com os Brueghel é um extraordinário privilégio. Exercite o olhar. Descobrirá nestas pinturas uma inesgotável riqueza de detalhes. Cada vez que olha verá uma coisa diferente. E depois repita o exercício noutras situações. Como é que os "postais" que vejo na minha organização comparam com os de outras organizações? Como é que os quadros dos "artistas" da nossa organização comparam com os dos mestres? E os da loja A com os da B? Quando olha para a sua organização o que lhe diz aquilo que vê: é sempre igual ou as melhorias acontecem?     

 

O nosso olhar destreina-se e desfoca-se facilmente. Vemos muita coisa a correr. Para desfrutar, aprender, corrigir e aperfeiçoar, é preciso fazer comparações ricas. O poder da riqueza, neste sentido, é o de tornar as coisas mais interessantes. Mesmo, ou sobretudo, as pequenas coisas, tão importantes e tão pouco valorizadas nesta era de pressa e de olhares fugazes.

 

Para continuar o exercício: Rubens, Brueghel, Lorrain: A paisagem nórdica do Museu do Prado, Museu Nacional de Arte Antiga, Lisboa, até 30 de Março.        

 

Professor na Nova School of Business and Economics

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