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21 de Fevereiro de 2020 às 10:28

Mude-se a lei ao sabor do ministro

Portugal tem um ministro que pensa ser lícito e normal mudar a lei a seu bel-prazer para que os seus objectivos sejam cumpridos sem sobressaltos.

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"Se ensinares, ensina ao mesmo tempo a duvidar daquilo que estás a ensinar."
José Ortega Y Gasset

Mude-se a lei ao sabor do ministro
Portugal tem um ministro que pensa ser lícito e normal mudar a lei a seu bel-prazer para que os seus objectivos sejam cumpridos sem sobressaltos. Esta semana, numa Comissão Parlamentar, o ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, anunciou que o enquadramento legal da certificação do aeroporto do Montijo tem de ser revisto para impedir que a lei actual se cumpra. A lei actual dá direito de veto a autarquias que se sintam prejudicadas pela construção de qualquer estrutura aeroportuária e há, pelo menos, dois municípios da região que já anunciaram que iriam recorrer a essa lei. A construção do novo aeroporto do Montijo tem levantado polémicas ambientais e de segurança mas, apesar disso, o Governo quer cumprir o negócio, cada vez mais suspeito, que fez com a empresa concessionária dos aeroportos nacionais. Com as atenções focadas no debate sobre a eutanásia, as declarações de Pedro Nuno Santos passaram meio despercebidas. Mas são graves: mostram que um membro deste Governo pode ignorar a lei vigente e fazê-la à medida dos seus interesses. Talvez alguma alma caridosa possa explicar a este ambicioso político do PS que o expediente de mudar a lei para um Governo fazer o que quer é coisa típica de ditadores, é um acto de desrespeito para com a democracia e para com os cidadãos. Com ministros assim, não se pode dormir descansado. Pedro Nuno Santos, que tem feito um bom trabalho na ferrovia, esteve mal neste caso. Muito mal. Convinha que, dentro do PS, alguém lhe explicasse que convém respeitar a lei, em vez de a mudar porque dá jeito.

Semanada

Portugueses apostam por dia 9,5 milhões de euros em jogos online dez antigos gestores bancários, de Ricardo Salgado a Oliveira e Costa, passando por Tomás Correia, acumulam coimas de quase 17 milhões lançadas por supervisores como o Banco de Portugal ou a CMVM nos últimos seis anos, o Banco de Portugal lançou coimas de mais de 49 milhões e a CMVM quase 17 milhões, mas estas coimas tendem a arrastar-se em tribunal e acabam muitas vezes na prescrição a gestão de Tomás Correia no Montepio já levou o supervisor a aplicar coimas no valor de quase nove milhões de euros em 2019, os portugueses endividaram-se a um ritmo de 20,8 milhões de euros por dia em crédito pessoal, compra de automóvel, cartões de crédito e contas a descoberto num total anual de 7,6 mil milhões de euros, o que constitui um novo recorde as operações financeiras suspensas por suspeitas de branqueamento triplicaram em 2019 e congelaram, em Portugal, 2,5 mil milhões de euros o INEM forneceu máscaras danificadas para as equipas de emergência que atendem casos de suspeita de coronavírus o Tribunal da Relação de Lisboa proferiu uma sentença em que se aceita que possam ser proferidos insultos contra intervenientes num jogo de futebol um deputado do PS pediu imunidade parlamentar num processo em que é acusado de insultar um árbitro de uma prova de pesca.

Dixit
"Convém socializarmos um bocadinho menos, termos alguma distância social, não nos beijarmos tanto, não nos abraçarmos tanto."
Graça Freitas
Diretora-geral da Saúde.

O labirinto e as cidades no Museu Berardo
Desde a semana passada, a arquitectura das galerias do piso -1 do Museu Berardo transformou-se de forma radical. Joana Escoval optou por tratar o espaço como parte da obra em "Mutações, The Last Poet", a sua exposição que lá estará patente até 19 de Abril, com curadoria de Pedro Lapa. Estou a falar de uma instalação quase labiríntica que se desenvolve numa série de curvas orgânicas onde se vão fazendo descobertas. É como se o visitante percorresse o interior de um organismo vivo em que de repente surgem esculturas, vídeos, sons, sugestões de desenhos através de fios metálicos ou fotografias. Joana Escoval, 38 anos, expõe desde 2010, tendo feito residências artísticas em vários países. Aqui, numa surpreendente e inesperada exposição, explora o movimento constante de transformação das ideias e formas - daí as Mutações. Ao mesmo tempo, também no Museu Berardo, está patente uma exposição de fotografia de Andreas H. Bitesnich, "Deeper Shades, Lisboa e Outras Cidades", comissariada por João Miguel Barros. A exposição é o resultado da residência artística de Andreas H. Bitesnich em Lisboa, em 2019, e integra a série Deeper Shades: retratos de grandes cidades vistas pelo artista nas últimas três décadas (na imagem). Apesar de o núcleo principal estar centrado em Lisboa, incluem-se ainda imagens dos seus projetos anteriores (Nova Iorque, Tóquio, Paris, Viena e Berlim). Andreas H. Bitesnich combina a fotografia de rua com fotografia de estúdio, oscilando entre o imaginado e o construído. Sábado 22, pelas 16h00, há uma visita guiada à exposição com a participação do autor e do curador.

Country gregoriano
A norte-americana Mackenzie Scott fez três discos para a etiqueta 4AD e foi despedida. Entrou numa crise criativa e, depois de um interregno longo, saiu-se com um disco magnífico. Como é seu hábito, foi composto, tocado e cantado por ela - e, neste caso, a produção musical ficou também a seu cargo. Assina com o nome Torres, e o disco "Silver Tongues", lançado recentemente, está disponível no Spotify e é uma das minhas descobertas recentes. Musicalmente, Torres está algures entre o country contemporâneo e o rock independente, há influências de Anna Calvi ou PJ Harvey (o que não é de espantar, porque num dos discos anteriores Mackenzie trabalhou com o mesmo produtor) e, nas letras e conceito geral, há toques que vão de Ray Bradbury a Kurt Cobain. E, calcule-se, influências do canto gregoriano - daí a própria dizer que este é um disco "country-gregorian". O álbum anterior tinha sido editado em 2017 e a sua carreira discográfica, que começou em 2013, é caracterizada por uma sonoridade dura, com a sua guitarra e percussões frequentemente em primeiro plano. O tema do álbum é a estabilidade que Scott sente que o amor lhe proporciona - o disco tem um lado autobiográfico, respeitante à sua relação com a namorada, a artista Jenna Gribbon. No novo disco há menos tensão e dramatismo que nos anteriores. "Silver Tongues" é o seu trabalho mais intimista. Destaque para os temas "Good Scare", "Last Forest" "Dressing America" e o acústico e envolvente "Gracios Day".

Arco da velha
O secretário de Estado das comunicações, Alberto Souto de Miranda, escreveu um artigo em defesa do aeroporto do Montijo no qual, relativamente às dúvidas sobre a preservação da fauna animal no estuário do Tejo, afirma: "Os pássaros não são estúpidos e é provável que se adaptem."

Lições da indústria da música
Quando a Apple lançou o primeiro iPod, em 2001, começou a grande reviravolta da indústria discográfica e musical. Ao longo das últimas duas décadas, assistimos ao desenvolvimento de uma nova forma de possuir e ouvir música, que culminou com o surgimento do Spotify em 2008 e que, desde aí, se tem desenvolvido e alargado. A venda de CD caiu drasticamente, o modelo de negócio de artistas, produtores de espectáculos e editores discográficos mudou radicalmente. Alan B. Krueger foi um economista americano e esta é a sua derradeira obra, já que ele morreu no ano passado, pouco depois da sua edição. Foi economista-chefe do Departamento do Tesouro dos Estados Unidos entre 2009 e 2010 e presidiu ao Conselho Económico do Presidente Barack Obama entre 2011 e 2013. Era um apreciador esclarecido e reconhecido de música rock, que fazia parte do seu dia-a-dia. "Rockonomics" é o livro em que Krueger fala sobre o que a indústria da música nos pode ensinar sobre economia e sobre a vida. Para fazer a interpretação das alterações ocorridas, Krueger realizou entrevistas com músicos, executivos de editoras, agentes de artistas e promotores de concertos e recorreu a dados recentes sobre direitos de autor, receitas de streaming e vendas de merchandise, por exemplo. No livro estão as respostas do autor a questões como estas: Como é que uma canção se torna popular? Como pode um novo artista subsistir nesta nova economia e paisagem audiovisual? Como podem os músicos e demais trabalhadores ganhar a vida na economia digital? Nas páginas finais do livro, Krueger reconhece que a música teve um impacto profundo na sua vida e este livro é testemunho disso mesmo. Edição Temas & Debates, do Círculo de Leitores.

Petiscos moçambicanos
Uma das boas coisas de Lisboa é que tem cada vez mais restaurantes que representam vários países. Longe vão os tempos em que existiam apenas os chineses, italianos ou os indianos. Já houve algumas tentativas africanas bem conseguidas - e até duas ou três moçambicanas. Mas, agora, em plenas Avenidas Novas, surgiu o Chiveve, que neste momento deve ser o expoente da gastronomia de Moçambique em Lisboa. À sua frente está um casal. Edner Abreu a comandar as operações na sala e na cave dos vinhos, e a sua mulher, Sheila Abreu, na cozinha. Há um menu executivo ao almoço, ao competitivo preço de oito euros, com um prato de origem moçambicana e outro português. Mas é a lista do menu que tem as propostas mais interessantes. Começo por destacar as chamuças de carne, absolutamente impecáveis. Depois surpreendi-me com o caril de camarão com quiabos, tempero no ponto, a evitar abafar o sabor dos camarões, tudo acompanhado de um bom arroz basmati. Ficou para outro dia provar o caril de caranguejo desfiado ou o matapa de peito de caranguejo, com o bicho a ser importado de Moçambique - de onde vem também a cerveja que o pode acompanhar. O caril de peixe e gambas é uma receita tradicional, bem conseguida. Como bem conseguido - e elogiado por conhecedores - é o frango à zambeziana, receita clássica, com um piripíri caseiro e enérgico à disposição. Foi provado um bom branco alentejano, o Etc da Herdade do Álamo, feito pela mão de Filipe Sevinate Pinto com uvas das castas Roupeiro, Arinto e Antão Vaz. A sala é confortável, bom serviço, bom ambiente e um busto em bronze de Eusébio, a recordar o grande embaixador do futebol moçambicano. O nome do restaurante vem do rio que banha a cidade da Beira. E o Chiveve fica na Rua Filipe Folque 19,  telefone 218 036 347.

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