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30 de Outubro de 2020 às 10:34

Mau tempo no canal

No fim-de-semana passado, o anticiclone dos Açores extravasou da meteorologia e entrou na política.

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Não temam ter opiniões exageradas, porque tudo o que agora é aceite como opinião já em tempos foi considerado exagero.
Bertrand Russell

Mau tempo no canal
No fim-de-semana passado, o anticiclone dos Açores extravasou da meteorologia e entrou na política. Após décadas de domínio do PS, surgiu nos votos uma maioria que teoricamente pode fazer uma geringonça à direita. Se isso vai ou não acontecer é outra história. Mas, para memória futura, convém registar que, coerente como é hábito, o autor da geringonça em exercício, António Costa, veio logo dizer que o mais votado no arquipélago foi o PS, cabendo-lhe portanto o governo regional, num extraordinário exercício de amnésia sobre a forma como chegou ao poder, apesar de ter perdido em votos para Passos Coelho em 2015.

Em abono da verdade, deve dizer-se que, em 1998, essa incontornável figura do golpe palaciano que foi o Presidente Jorge Sampaio também recusou ao líder do PSD dos Açores de então, Carlos Costa Neves, a possibilidade de avançar para um governo suportado numa maioria do parlamento regional que não incluía o PS, que tinha sido o partido mais votado, mas não tinha a maioria absoluta dos deputados. Como se sabe, apesar das reticências na época, Cavaco não seguiu o exemplo de Sampaio, e permitiu que o PS, com o Bloco, PCP e anexos, fosse governo.

Escrevo estas linhas para que a memória não fique desvanecida na espuma dos dias, agora que o perfume da crise política percorre de novo os corredores do Parlamento, graças à disputa entre PS e Bloco de Esquerda. O que se passou nos Açores é um sinal de que há espaço para a mudança. E que o mau tempo pode chegar dos Açores ao continente.

Semanada

Segundo o estudo da Marktest sobre a utilização da internet, não há diferenças entre os dois géneros no perfil dos utilizadores de redes sociais portugueses, em que dois em cada três utilizadores têm menos de 45 anos e a maioria (54%) pertence às classes sociais mais altas, enquanto 36% residem nas regiões da Grande Lisboa e do Grande Porto em 2020, já foram identificados 6.492 condutores com cartas de condução caducadas uma sondagem divulgada esta semana indica que 85% dos portugueses são a favor do uso obrigatório de máscara na rua António Costa acusou o Bloco de ter desertado da esquerda, mas manifestou esperança no seu regresso em Lisboa, regista-se um aumento de furtos, nomeadamente nas zonas de Belém e Areeiro as próximas eleições presidenciais terão um custo para o Estado de 3,5 milhões de euros e as autárquicas deverão ultrapassar os 39 milhões o grupo de peritos nomeados pelo Governo diz ser urgente uma revisão completa dos programas em todos os ciclos de escolaridade 80% dos imóveis públicos vendidos nos últimos 11 anos foram alienados pelos governos de Sócrates na proposta de Orçamento do Estado para 2021, entre a entrega da proposta e a votação, o Governo voltou a negociar com os partidos, mostrando abertura para medidas na especialidade, que deverão custar pelo menos mais 300 milhões de euros dos 740 aeroportos comerciais europeus, perto de 200 estarão à beira da insolvência se o tráfego aéreo continuar reduzido, ameaçando mais de 250 mil postos de trabalho. 

Dixit
Todo o governante que sugerir o despedimento de um comentador deve ser imediatamente despedido.
João Miguel Tavares

Ensaio fotográfico
Uma das áreas mais afectadas nos media nos últimos anos foi a imprensa. Perderam-se receitas de venda e de publicidade e, em consequência, as reportagens extensas quase desapareceram e, com elas, os ensaios fotográficos. O fotojornalismo perdeu terreno, paradoxalmente numa época em que a imagem é cada vez mais usada noutros meios. Felizmente surgiram publicações que procuram retomar a importância da reportagem, da abordagem de temas de forma mais profunda e com recurso a imagem, sob a forma impressa. É nessas publicações que o ensaio fotográfico tem ressurgido. Se a imagem do momento e do acontecimento continua a ser importante, a forma como a fotografia consegue abordar e mostrar um tema de forma abrangente é igualmente importante. "Point.51" é uma publicação de periodicidade anual que, desde o Outono de 2018, percorre esse caminho. Os primeiros dois números foram dedicados aos fluxos migratórios e à situação criada no Reino Unido com o Brexit. A edição deste ano tem por tema a resiliência, "histórias de coragem em tempos difíceis", e espelha o que se tem passado ao longo destes últimos meses. Na edição de Outubro deste ano, há um dossiê fotográfico, "Cuidador", um trabalho espantoso e perturbante de Teresa Nunes fotojornalista do Porto, que documenta a realidade dos cuidadores informais a partir de um exemplo familiar. Com formação em Direito e em Fotografia, escreve também o texto que acompanha as imagens, que se estendem por 12 páginas da publicação. Teresa Nunes decidiu dedicar-se à fotografia, abandonou a carreira de advocacia, e tem fotografado para a imprensa local, e também para publicações nacionais como o Expresso e o Observador. Podem segui-la no Instagram @teresanunesphotography ou no site www.teresanunesphotography.pt. Este terceiro número da Point.51 tem histórias de coragem e de resistência de toda a Europa, desde os países nórdicos à Albânia, passando por Espanha, Rússia ou Alemanha. A Point.51 pode ser comprada online, por exemplo, através da página de Facebook da publicação.

Oásis ribeirinho
No MAAT pode ver, a partir desta semana e até 18 de Fevereiro, a exposição "Um Oásis Ao Entardecer", que assinala o 20.º aniversário dos prémios Fundação EDP, mostrando o trabalho de 20 artistas, com 70 obras. Lourdes Castro foi a primeira premiada em 2000.

Seguiram-se Mário Cesariny, Álvaro Lapa, Eduardo Batarda, Jorge Molder, Ana Jotta, Artur Barrio, Joana Vasconcelos, Leonor Antunes, Vasco Araújo, Carlos Bunga, João Maria Gusmão + Pedro Paiva, João Leonardo, André Romão, Gabriel Abrantes, Priscilla Fernandes, Ana Santos, Mariana Silva, Claire de Santa Coloma e Diana Policarpo, em 2019. João Pinharanda, que esteve na génese da iniciativa, sublinha que "os prémios são uma sala de espelhos, na qual podemos ver multiplicadas algumas das possibilidades de entendimento da arte portuguesa ou feita em Portugal por artistas portugueses no mundo". Inês Grosso e Rosa Lleó, curadoras da exposição, afirmam que "Um Oásis Ao Entardecer" lança "um olhar para o futuro, apontando para os desafios que nos esperam num mundo que sabemos transformado para sempre". A exposição recorre a obras existentes na colecção da instituição e também a novas encomendas feitas pela Fundação EDP e junta os vencedores do Prémio Novos Artistas e do Grande Prémio Fundação EDP Arte.

Outro destaque: no Atelier-Museu Júlio Pomar, abriu há dias a exposição "Os retratos", patente até 28 de Fevereiro de 2021. É uma mostra da exploração de Pomar do género do retrato ao longo de 70 anos (de 1940 até 2018, ano da sua morte). A exposição percorre as diversas fases da carreira do pintor, do neorrealismo a representações mais modernistas, além de retratos de diversas personalidades nacionais e estrangeiras, e também diversos auto-retratos do pintor ao longo da vida. Entre os retratados nacionais, estão nomes como Fernando Pessoa, Camões, Almada Negreiros e, nos internacionais, Baudelaire, Dante ou Samuel Beckett, entre outros.

Arco da velha
A proposta de Orçamento do Estado para 2021 contempla dez mil milhões de euros em "despesas excepcionais" não indicadas, gastos camuflados que representam cerca de 10% da despesa pública anual prevista, um aumento de 50% face a 2020.

Uma carta musical
No dia 23 de Setembro, Bruce Springsteen fez 71 anos. Lançou o seu novo disco, "Letter To You", com três temas inéditos, mas antigos, num total de 12 canções gravadas com a E Street Band em Novembro de 2019. Não é por acaso que Springsteen lança um disco que é uma espécie de regresso aos seus manifestos do tempo de "Darkness On The Edge Of Town", a pouco tempo das eleições presidenciais dos Estados Unidos. Nem é por acaso que autorizou canções suas em anúncios de televisão anti-Trump. O disco é uma viagem ao passado com evocações do presente, parte dele a lembrar a sua banda de adolescente, Castile, e um dos seus companheiros da altura, que morreu recentemente, George Theiss - "The Last Man Standing". Este era o disco que o guitarrista Steven Van Zandt andava há anos a insistir junto de Bruce para ser feito. É um registo cru - dois dos temas antigos ("If I Was the Priest" e "Janey Needs a Shooter") são dos mais poderosos. Na canção-título, é deixado o recado: "In my letter to you/ I took all my fears and doubts/ In my letter to you All the hard things I found out/ In my letter to you/All that I’ve found true." Este álbum, uma hora e pouco de música, é uma conversa com a E Street Band, que se desenvolve há mais de quatro décadas, e foi feito e gravado no estúdio da casa de Springsteen, em meia dúzia de dias, com canções em que coexistem os comboios, os rios, os subúrbios e os amores e desamores - que são a base do cancioneiro de Springsteen. Disponível no Spotify.

Comida rápida
Para a série "comidas do confinamento", tenho uma nova sugestão. Os bolos do caco, de inspiração açoriana, são a melhor versão portuguesa para suporte de sanduíches robustas. O meu conselho é que barre cada metade com uma mistura de maionese e mostarda, polvilhada de cebolinho e temperada com açafrão. Por cima de cada uma das metades, coloque fatias finas de pepino cru, queijo da ilha de São Miguel, com um toque de compota de pimenta da terra, antes de pôr fatias de presunto cortado finíssimo, com agrião a separar as duas metades. O essencial é que tudo seja cortado muito fino, e bem espalhado em várias camadas. O segredo de uma boa sanduíche, não é demais repeti-lo, reside na base escolhida para barrar o pão, no corte fino e na abundância dos ingredientes escolhidos. Assim, todos os sabores são realçados. A ideia de que uma fatia transparente de fiambre de má qualidade e uma fatia irregular de queijo plástico são a base de uma sanduíche é um dos pecados nacionais. Deixo ao vosso gosto se querem aquecer um pouco o pão na torradeira, antes de iniciarem o processo. Pessoalmente, prescindo. A coisa é bem acompanhada por uma cerveja preta robusta, a Sagres, que é, na minha opinião, de entre as industriais, a melhor. Garanto que isto vale por uma refeição completa, saborosa e reconfortante.


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