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Opinião
02 de Setembro de 2016 às 10:43

A esquina do Rio

Parece que para o ano vão ser repostos os cortes nas pensões. Parece que vai haver maior investimento público na educação e na saúde.

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Diz-se que o poder corrompe, mas, de facto, é mais certeiro dizer-se que o poder atrai os que são corruptíveis; aqueles que o não são, geralmente, sentem-se atraídos por outras coisas que não o poder.
David Brin

Ilusão
Parece que para o ano vão ser repostos os cortes nas pensões. Parece que vai haver maior investimento público na educação e na saúde. Parece que o Estado vai aumentar a despesa, embora seja aparentemente por boas razões. Mas, se aumentar a despesa e não aumentar a receita, o défice sobe. É uma conta simples. Ora, aumentar a receita só pode querer dizer mais taxas, mais impostos. Sabe-se já que o Governo pretende implementar medidas que acabam com o sigilo bancário, com o justificativo da vigilância fiscal. Todos os dias, surge a notícia de mais uma ideia para sacar dinheiro aos contribuintes. Ao mesmo tempo constata-se que o fisco está cada vez mais relutante em devolver dinheiro cobrado a mais.
Na quarta-feira, terminou o prazo para o reembolso do IRS aos contribuintes, caso não existissem divergências, que têm efeito suspensivo. Seria interessante saber quantas dessas divergências existem e quantas existiam na mesma ocasião do ano passado. Sei de quem nas últimas semanas recebeu sucessivas notificações a anunciar divergências, que foram explicadas pelos próprios e aceites pela Autoridade Tributária, que enviava uma simpática mensagem referindo que a declaração rectificada "foi considerada certa após validação central". Era alegria de pouca dura porque, logo a seguir, surgia nova notificação, de nova divergência, que até os funcionários do fisco, quando interpelados, não conseguiam explicar com clareza a que se referia. Ou seja, tudo indica que a Autoridade Tributária enveredou pelo caminho de comunicar divergências sucessivas que foram prolongando o prazo e retendo devoluções. Quantos contribuintes estarão, neste momento, nesta situação? Aqui está uma forma de o Estado ter dinheiro nos cofres, dinheiro que não é seu e que serve para ir tapando as novas despesas. É sabido que mais algum imposto há-de estar ao virar da esquina para colmatar as novas despesas. E, se não estiver, o défice aumenta. E, se o défice aumenta, Costa bem pode citar vacas voadoras que a situação ficará complicada. Demasiado complicada para nós todos, excepto para os que persistem na ilusão.

Semanada
• O Governo anunciou querer triplicar a produção de pescado em aquacultura  o Governo vai reforçar uma proposta para alargar a plataforma continental para lá das 200 milhas náuticas  o Governo instou os senhorios a diminuírem os seus rendimentos, fazendo rendas sociais  até Setembro, todos os ex-ocupantes de cargos políticos vão ver repostas, com retroactivos, as subvenções vitalícias  a Polícia Marítima apreendeu e destruiu 210 bolas de Berlim a um vendedor na Costa da Caparica, numa acção, segundo o comunicado oficial, que envolveu uma viatura todo o terreno da respectiva força policial, assim como dois agentes  Catarina Martins anunciou que o Bloco de Esquerda recusa "passos atrás" e cedências a chantagens no Orçamento de 2017  um estudo divulgado esta semana indica que, em 2050, Portugal deverá ter menos 1,2 milhões de habitantes  além dos partidos e das confissões religiosas, há mais cerca de duas dezenas de entidades que não pagam IMI  o Bloco de Esquerda quer alterar a regra do IMI sobre os partidos políticos e o PCP é contra  o Estado injectou 417 milhões de euros na CP desde o início do ano  segundo o oráculo Marques Mendes, uma eventual candidata do PSD à Câmara de Lisboa pode ser Maria Luís Albuquerque  há mais de 28 mil professores sem colocação nas escolas  os pagamentos em atraso aumentaram na área da saúde: com 324 polícias que estão em licença sem vencimento, o Estado vai contratar 300 novos agentes  todos os dias, são presos 56 condutores com álcool em excesso.

Folhear
Numa conversa de final de tarde com um grupo de amigos, falava-se da atracção que é exercida por séries policiais e histórias sobre crimes e justiça. Para o caso, falava-se de "The Night Of…", uma soberba série que terminou esta semana. Havia quem dissesse que o retrato dos efeitos do sistema judicial e prisional nos inocentes davam que pensar. De uma forma geral, os presentes diziam que os livros e séries policiais eram bons exercícios de dedução, de estímulo ao raciocínio e até de enquadramento da evolução das sociedades. Estou plenamente de acordo e por isso mesmo é que me fascino com literatura policial. Este Verão tive o prazer de ler "Fechada Para o Inverno", de Jorn Lier Horst, um escritor norueguês. O livro relata uma investigação do detective William Wisting, que é personagem recorrente nos romances do autor. Trata-se de uma investigação que decorre em paralelo sobre um caso de tráfico de droga, de roubos a casas de férias (normalmente fechadas no inverno) e de assassínios. A história - ou melhor, as histórias que se cruzam - estão soberbamente construídas. E estão ligadas a uma descrição do aumento da criminalidade na Noruega após o alargamento da Europa a leste, com a livre circulação de cidadãos das ex-repúblicas soviéticas que, recorrentemente, surgem implicados em redes criminosas. Mais que um policial, o livro é um relato das inseguranças dos tempos que correm e uma reflexão sobre a forma como a Europa aumentou sem ter crescido. A edição portuguesa é da D. Quixote e tem boa tradução de João Reis.

Gosto
O livro "Regresso Ao Futuro - a Nova Emigração e a Sociedade Portuguesa", de um grupo de investigadores universitários, mostra a falsidade de algumas ideias feitas como, por exemplo, a de que a nova vaga migratória é composta apenas por pessoas qualificadas ou que, desde o início da crise, Portugal perdeu meio milhão de pessoas.

Não gosto
Da forma como a CP tem desleixado a linha do Douro, não aproveitando o potencial da região, deixando degradar e depois vendendo como sucata o equipamento que tinha especialmente vocacionado para uma utilização turística.

Ver
Gosto muito de ver edições de livros de fotografia. Na maior parte dos casos, é como visitar uma exposição, tendo tempo para contemplar cada imagem. Este ano fui brindado com uma oferta que adorei - o álbum "Abandoned - America's Vanishing Landscape", de Eric Holubow, um fotógrafo de Chicago que tem documentado o abandono e decadência de edifícios que foram, por uma razão ou por outra, arquitectónica ou industrialmente marcantes. De início, ele concentrou-se primordialmente naquilo que é conhecido como a Rust Belt, a antiga e em tempos vibrante zona industrial, predominantemente ligada à metalurgia, em volta dos Grandes Lagos. Aquilo que Holubow fotografa são edifícios semi-destruídos, fábricas abandonadas cheias de maquinaria, escolas à espera de demolição com o chão atapetado de livros, igrejas vazias e em ruínas, teatros esventrados, instalações desportivas arruinadas. O livro documenta os efeitos das crises, a degradação de partes importantes da História da América, as consequências de políticas urbanísticas mal pensadas. Trata-se de uma viagem a um mundo caótico, onde a destruição se sobrepõe ao progresso e onde a erosão da memória se torna quotidiano. Folhear este livro é descobrir o outro lado de um país. Por cá havia muito para fazer nesta matéria - e vale a pena dizer que João Paulo Feliciano tem andado a fazê-lo na zona oriental de Lisboa e tem exposto no Facebook. "Abandoned - America's Vaninshing Landscape" é um grande livro, editado pela Schiffer, disponível na Amazon. Se quiserem ver umas imagens, vão a esta notícia que o Washington Post publicou quando saiu, em Novembro do ano passado: www.washingtonpost.com /news/wonk/wp/2015/11/09/haunting-photos-show-forgotten-and-forbidden-buildings-in-america.

Arco da velha
Uma deputada norueguesa foi apanhada a caçar Pokémons no Parlamento do seu país enquanto decorria um debate sobre defesa nacional.

Ouvir
William Bell é uma das vozes mais clássicas da soul music e do histórico catálogo da editora discográfica Stax. Tornou-se conhecido em 1961 com o tema "You Don't Miss Your Water" e foi, com Booker T Jones, co-autor de "Born Under a Bad Sign", um êxito primeiro pela voz de Albert King e que os Cream (de Eric Clapton) e Jimi Hendrix, entre outros, também gravaram. A sua música tem claras raízes nos blues, mas os arranjos e a forma de cantar tornaram-se uma referência na soul music dos anos 60. Bell, agora com 77 anos, tem-se mantido activo e acabou de lançar novo disco, "This Is Where I Live". O produtor (e co-autor de nove das doze canções) é John Leventhal, que soube reconhecer e trabalhar o potencial e o estilo que a voz de Bell ainda mantém. Os arranjos, onde a guitarra eléctrica tem lugar de destaque, são também pontuados por presenças de metais e teclados, mas de forma contida e elegante. Gosto especialmente de "Poison In The Well", da faixa título "This Is Were I Live", assumidamente autobiográfica e que revela que Sam Cooke foi uma das suas principais influências e, finalmente, da versão despojada, mais lenta, de "Born Under A Bad Sign", que deixa ouvir tão bem a ideia central da canção: "If it wasn't for real bad luck, I would have no luck at all". As coisas simples são sempre as melhores. "This Is Where I Live", Stax, disponível no Spotify.

Dixit
A serenidade com que tudo foi feito mostra que no dia da reunião com o PS já havia a decisão tomada pela direcção do PCP
Ruben Carvalho, do Comité Central do PCP, sobre o processo que levou ao acordo de Governo.

Provar
Volta e meia, surgem boas surpresas. No Porto, na Rua do Passeio Alegre, com a Foz bem perto, frente ao mar, está a casa de Pasto da Palmeira. Tem uma pequena esplanada e uma sala interior mais ampla. Mas a vista da esplanada é uma tentação. Estava avisado de que o local era bom para petiscar, que não esperasse por um restaurante com pratos à séria. O aviso foi bem entendido e fiquei contente por ter seguido a sugestão. O serviço é muito simpático, as empregadas têm "t-shirts" da casa com "slogans" sugestivos e a carta está cheia de boas sugestões. Por exemplo, nunca tinha provado pipocas com paprika, acompanhadas de maionese com lima, e gostei; também nunca tinha provado éclairs de sapateira e gostei; uma falsa bruschetta feita à base de beringela e figos soube particularmente bem ao outro lado da mesa, e um pedaço de atum fresco fatiado e braseado (no ponto) com especiarias, com um acompanhamento de couscous, também foi bem recebido; uma meloa com gelado de citronela rematou o repasto. Ficou-me na memória a possibilidade de uma melancia grelhada e registei os queques de alheira que me sorriam da mesa ao lado. A lista de vinhos é adequada, o serviço a copo é correcto, a relação preço-qualidade é honesta. Da próxima vez que for ao Porto voltarei a ver se as coisas estão na mesma. Casa de Pasto da Palmeira, Rua do Passeio Alegre 450, telefone 226 168 244. Está no Facebook.

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